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quarta-feira, 20 de setembro de 2023

A GRANDE VIOLÊNCIA EXISTENTE NO BRASIL - por Roberto Rufo

A GRANDE VIOLÊNCIA EXISTENTE NO BRASIL - por Roberto Rufo 

    Na teoria espírita, mais específicamente no Livro dos Espíritos, quando se toca no assunto violência, aparece uma solução para esse mal – a educação, não apenas a educação das escolas, mas a educação moral, que cria caracteres saudáveis. 

    O Espiritismo fala no homem novo que substitui o homem velho existente em nós. Qual a consequência dessa transformação? – É óbvio, uma sociedade mais justa e solidária. 

    No Livro dos Espíritos, questão 756 Allan Kardec pergunta aos espíritos se a sociedade de bem se verá algum dia expurgada dos seres malfazejos? – Os espíritos respondem que a humanidade progride. Esses homens, em quem o instinto do mal domina e que se acham deslocados entre pessoas de bem, desaparecerão gradualmente. 

    Coloquei todo esse preâmbulo da teoria espírita para analisarmos se de fato estamos alterando os caracteres entre a população brasileira e criando uma sociedade mais justa. O primeiro parágrafo, como pura teoria é irretocável, no entanto quanto ao segundo parágrafo a previsão dos espíritos não aconteceu, pelo menos no Brasil. 

    Os números da violência no país são impressionantes. Temos 3% da população mundial, e respondemos por 13% dos assassinatos do mundo, o que desmente a tão falada cordialidade do brasileiro, bem como o paradigma de que somos um povo pacífico. A taxa de homicídios por 100 mil habitantes chega a ser 13.100% maior que na Inglaterra e 609,3% maior que na vizinha Argentina. São dados do Atlas da Violência divulgada pelo IPEA em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (09/6/2017). 

    A grande pergunta é: como chegamos a essa situação (obra de governos dos últimos 20 anos pelo  menos) e o que pode ser feito para mudar esse quadro repulsivo? Em primeiro lugar é como cidadãos cobrar o porquê da ausência e ineficiência do Estado, principalmente na falta de políticas e ações eficazes de proteção e defesa da população. O crime organizado deita e rola. E em segundo lugar, atentar que sem uma melhoria substancial na educação, fica difícil controlar a violência. 

    Quando não se tem nem uma coisa nem outra, só resta investir na construção de presídios como se fosse solucionar o problema. Ainda mais que as nossas penitenciárias são simplesmente lamentáveis. 

    Mas como vivemos desde a segunda metade do século XX, do ponto de vista espiritual, na filosofia do nada, a questão da agressividade humana é tratada cientificamente. “Bem aventurados os mansos e pacíficos porque herdarão a terra” e “Vós sois todos irmãos”, palavras de Jesus de Nazaré não entram no cômputo da solução do problema. Trata-se de religião. 

    Ouso dizer, como falei num dos dias da nossa reunião no ICKS, que se algum presidente brasileiro no dia de Natal citar Jesus de Nazaré na sua mensagem de final de ano, no dia seguinte será atacado em nome do estado laico, que se transformou na verdade num estado ateu. 

Este artigo foi publicado em março de 2018 no Jornal Abertura: baixe aqui!

https://cepainternacional.org/site/pt/cepa-downloads/category/37-jornal-abertura-2018?download=259:jornal-abertura-marco-de-2018


    Enquanto isso nossos governantes, geralmente corruptos, assistem (às vezes num home theater instalado na prisão) esse quadro melancólico sem nenhum gesto no sentido de estarem arrependidos com a sua ganância e egoísmo. Falta-lhes espiritualidade.

quinta-feira, 4 de maio de 2023

ALLAN KARDEC: TEXTO E CONTEXTO - A PROPÓSITO DAS EDIÇÕES “ANTIRRACISTAS” DE SUAS OBRAS - por JON AIZPÚRUA

 

EDITORIAL - Revista Evolucion de Caracas -CIMA



ALLAN KARDEC: TEXTO E CONTEXTO - A PROPÓSITO DAS EDIÇÕES “ANTIRRACISTAS” DE SUAS OBRAS 


Jon Aizpúrua


I – O TEMPO DE KARDEC E OS AVANÇOS CIENTÍFICOS E SOCIAIS

Ao longo dos séculos, a humanidade passou por muitas e intensas revoluções de conhecimento que vão oferecendo novas perspectivas para a compreensão e interpretação daquilo que constitui o que se concebe como realidade. É o que se denomina, segundo Kuhn, de mudanças de paradigmas, quer dizer, a substituição de antigas abordagens por outras que se mostram mais eficientes para explicar contradições, esclarecer enigmas e apresentar hipóteses que parecem ter maior plausabilidade e que ao serem verificadas são incorporadas ao acervo científico e cultural. O dinamismo e a interação desses processos constituem a própria essência do progresso.

O surgimento  de novos paradigmas ou esquemas interpretativos sobre o universo, a vida, o ser humano, bem como os princípios e valores que imperam no âmbito cultural de ordem ética, moral ou jurídica, ocorrem em um determinado contexto social, histórico, econômico, político ou espiritual, de tal forma que nenhum sistema de pensamento escapa aos condicionamentos inerente à época em que aparece e se desenvolve, os quais  se manifestam na aceitação das crenças dominantes e na linguagem empregada  para expressá-las.

Evidentemente, o espiritismo não é uma exceção a essa lei geral que indica o processo gradual de avanços no campo do conhecimento. Surgido em meados do século XIX, graças ao minucioso trabalho teórico e experimental realizado por Allan Kardec contando com a assessoria de espíritos desencarnados de elevada condição intelectual e moral, não poderia deixar de receber as influências do contexto geral de sua época. , representado pelas ideias filosóficas, científicas, religiosas, sociais ou morais que imperavam na sociedade francesa e europeia, o que é de todos bem representadas em seus livros, discursos e outras publicações.

A doutrina fundada por Kardec constituiu uma autêntica revolução epistemológica que veio sacudir o ambiente que já assinalavam as correntes materialistas, as crenças religiosas tradicionais e o modelo espírita em geral. À luz de seus novos conceitos, já não era mais necessário nos resignarmos à desesperança causada por visões niilistas e ateístas; nem havia que depender de uma fé baseada em dogmas antigos ou na pretensa autoridade divina de um livro sagrado para admitir a existência e onipresença de Deus, a continuidade e transcendência espiritual após a morte, nem foi preciso sucumbir aos medos provocados pelas doutrinas de punições eternas ou castigos infernais. Uma nova concepção, racional e otimista, abria-se caminho para mostrar a sobrevivência do espírito e sua continuidade evolutiva em existências sucessivas, bem como a interação permanente entre desencarnados e encarnados facilitada pelos médiuns com o concurso de uma ampla gama de faculdades psíquicas.

A objetividade e honestidade com que Kardec se entregou aos estudos dos chamados "mesas girantes" ou "mesas falantes" sem se deixar levar por preconceitos sobre sua origem e natureza, permitiu-lhe abrir um canal de comunicação com espíritos de uma singular categoria e a partir das informações obtidas e de sua própria investigação e reflexão, formular um sistema coerente em torno da complexa realidade material e espiritual. Foi assim que avançou do fenômeno ao método e, pela validação dele, sistematizou e codificou a doutrina espírita.

Consciente de que o espiritismo estava em sua fase inicial, Kardec nunca pretendeu que com seus escritos, já estivesse terminado de maneira definitiva ou acabada. Em inúmeras ocasiões referiu-se à progressividade dos conhecimentos espíritas, os quais estariam abertos a retificações de acordo com o progresso da ciência e da cultura. Ele nunca reivindicou um papel messiânico, tão pouco aceitou que os espíritos que o orientavam fossem "reveladores predestinados" ou que seus ensinamentos fossem absolutos ou infalíveis. Se dentro do movimento espírita tem proliferado a crença de que todas as ideias contidas em suas obras têm o caráter de verdades absolutas, tal suposição não encontra respaldo, nem na letra nem no espírito, nos textos kardequianos.

É que não há pensador ou autor, independentemente da magnitude e importância da tarefa realizada, que esteja completamente afastado da influência e dos condicionamentos de seu tempo, e por ele que se faz fundamental levar em conta esse contexto quando se quer estudar suas abordagens, compreendê-las adequadamente e também criticá-las. No nosso caso, no que se refere ao espiritismo, admiravelmente definido por Kardec como "ciência observacional e doutrina filosófica das consequências morais", há espaço e relevância para o exercício de um esforço intelectual e crítico em torno do conjunto de suas ideias com vistas para uma atualização conveniente e inevitável.

Se tal revisão não for feita dentro do Espiritismo, outros a farão de fora e, de fato, isso já vem acontecendo nos campos da medicina, da psicologia, da parapsicologia e outras disciplinas, embora tal empreendimento nem sempre tenha sido verificado com devido rigor e sem preconceitos filosóficos, teológicos ou acadêmicos. Os espíritas podem e devem empreender sem medo uma tarefa que exige estudo, disposição e mente aberta. Os princípios básicos que sustentam o espiritismo (Deus, espírito, sobrevivência, reencarnação, mediunidade, pluralidade de mundos habitados) estão aí, válidos e muito sólidos como pilares que sustentam uma grande cosmovisão. No entanto, inúmeras opiniões que aparecem nos textos fundadores do espiritismo e giram em torno daqueles princípios, respondem às ideias científicas do século XIX e aos padrões culturais, sociais e morais que prevaleciam naquelas sociedades, e não mais correspondem à ciência. a cultura do nosso tempo.

De meados do século XIX até os dias atuais, o mundo mudou mais rápido e mais intensamente do que nunca. Toda uma série de processos complexos ocorre em campos tão diversos como a física, a biologia, a neurologia, a medicina, a engenharia genética, a aeronáutica, a psicologia, a economia, a política, a sociologia e a antropologia, a ecologia, as lutas sociais, a arte, a religião, a indústria bélica ou tecnologias de comunicação, incluindo a digitalização e os desafios perturbadores da inteligência artificial. Esses processos, em constante mudança e expansão, surpreendem, desconcertam e nos obrigam a uma revisão de crenças e a uma atualização imprescindível. Os que não se incorporem às transformações somente restará desviar o olhar e se refugiar no conforto da fé.

II – AS DENOMINADAS EDIÇÕES “ANTIRRACISTAS”

Dito isto, é hora de se posicionar a respeito de um acontecimento que hoje está agitando o movimento espírita e tem dado origem a inúmeras discussões e até acirradas polêmicas. Sucede que um grupo ou coletivo espírita brasileiro chamado “Espíritas à Esquerda” começou a publicar algumas obras de Allan Kardec colocando na capa, em letras e cores bem destacadas, o rótulo: “EDIÇÃO ANTIRACISTA”. Até o momento surgiram dois livros: O Evangelho Segundo o Espiritismo e O Livro dos Espíritos.

No prefácio que colocam no início de cada uma destas obras, dão a conhecer as razões que motivaram a sua iniciativa. Desde logo, eles se apoiam na decisão do Ministério Público Federal do estado da Bahia em 2007, segundo a qual existem "trechos da obra literária de Allan Kardec, tidos como supostamente discriminatórios e preconceituosos em relação aos negros e outras etnias". grupos”, pelo que as editoras de tais livros devem colocar notas de rodapé relativamente àqueles “textos que possam suscitar dúvidas pelo seu carácter discriminatório ou preconceituoso”. Nove editoras espíritas firmaram termo de compromisso com o Ministério baiano para o cumprimento dessa disposição legal.

Argumentam os responsáveis ​​pelo coletivo EàE  que o pensamento de Kardec estava impregnado das ideias predominantes na Europa do século XIX sobre diversos assuntos humanos e sociais, como era o caso da frenologia, teoria que considerava cada região do cérebro responsável por determinada função, e a fisionomia, cuja tese central afirmava que o caráter e outros elementos da psicologia das pessoas poderiam ser interpretados por meio de suas características exteriores. Essa influência, somada à que recebeu de outras disciplinas científicas e humanísticas de seu tempo marcadas pelo racismo estrutural, se refletiria na linguagem que utilizou para se referir às raças antigas e contemporâneas, distinguindo as etnias brancas como populações “civilizadas” enquanto as etnias negra e indígena foram classificadas como populações “selvagens”.

Por esta tendência eurocêntrica e etnocêntrica que se percebe em alguns textos de Kardec, os representantes ​​de EàE denunciam em diversos comentários  “ o racismo científico contido nas obras kardecistas” e sustentam que a leitura de algumas perguntas formuladas por Kardec e das respostas dos espíritos deixam evidente os preconceitos socias que animavam aqueles que exerceram a prática da escravidão até épocas recentes da humanidade.

Afirmam também que esses elementos racistas têm se revelado na composição e no funcionamento do próprio movimento espírita e, nesse caso, fazem referência específica ao brasileiro, que é, de longe, o maior movimento espírita do mundo. Segundo dizem, "os negros e negras estão acostumados, na maioria das instituições espíritas, a participar apenas como subordinados, coadjuvantes, no apoio às atividades operacionais e principalmente como beneficiários de projetos assistencialistas, sendo raro vê-los ocupando cargos de direção nessas instituições".

Eles então justificam seus esforços para dar lugar a “edições antirracistas” a partir de um sentimento de reparação pelo que consideram uma dramática injustiça cometida contra populações historicamente discriminadas, agredidas e marginalizadas; como alerta de que tal comportamento tem permeado o movimento espírita, causando sofrimento a negros e negras que participam de casas, sociedades ou federações.

 

III – ENCONTROS E DESENCONTROS.

Partidários, como somos, de um espiritismo nitidamente kardecista, e, portanto, laico, livre-pensador, humanista, progressivo e progressista, aberto à discussão e à crítica, não podemos olhar com indiferença para uma iniciativa deste calibre. Nem podemos descartá-lo com argumentos simplistas, muito menos com desqualificações. Acreditamos nas virtudes do diálogo e do debate respeitoso e construtivo, sem que isso implique renúncia a convicções baseadas em princípios e valores. Um diálogo fecundo e alteritário que facilita a compreensão das perspectivas dos outros, precisamente dos que pensam diferente, e que substitua a prática negativa de um monólogo empobrecedor.

Ressaltamos de saída que não questionamos as boas intenções que animam os integrantes do coletivo EàE nem sua condição de espíritas. Sentimos sua iniciativa como a expressão de uma reivindicação angustiante sobre a possibilidade de os textos kardecistas servirem de suporte direto ou indireto a ideologias racistas ou discriminatórias de qualquer signo ou natureza.

Por outro lado, não podemos deixar de apontar nossa coincidência com algumas considerações feitas nos parágrafos que servem para apresentar a "edição antirracista" de O Evangelho Segundo o Espiritismo e O Livro dos Espíritos, pois, de fato, eles constituem elementos básicos de nossas próprias reflexões, as quais divulgamos há décadas em livros, artigos e conferências. Situados em perspectivas diferentes e distantes da mentalidade religiosa e messiânica que caracteriza um segmento altamente significativo de espíritas no Brasil e no mundo, assumimos que nenhum ser humano, e no caso específico do espiritismo, nenhum autor ou médium, encarnado ou desencarnado, goza de infalibilidade, pois suas ideias, resguardando suas valiosas contribuições, são passíveis de serem avaliadas, revisadas, criticadas e até mesmo superadas. Obviamente, um processo analítico dessas proporções requer muito estudo, serenidade de espírito, rigor científico e a aplicação de alguns critérios metodológicos indicados por Kardec como o "controle universal dos ensinamentos dos espíritos" e a "concordância entre as informações ".

E, precisamente, para manter um espírito aberto e crítico, é fundamental assumir que nenhuma ideia e nenhum representante dela escapam à influência do meio social, do momento histórico e também espiritual em que surgem. Visto que não há texto sem contexto, não seria adequado examinar o aparecimento do espiritismo em meados do século XIX com O Livro dos Espíritos e demais obras do corpo Kardequiano, sem levar em conta as inúmeras variáveis ​​concomitantes que intervieram na aqueles tempos, em que os valores da tradição judaico-cristã e o peso institucional da Igreja Católica prevaleceram de forma determinante em todas as esferas da sociedade. Considere-se, por exemplo, os antecedentes representados pelas obras anteriores de Swedenborg, Mesmer, Kerner ou Cahagnet até o surgimento dos diversos episódios mediúnicos que se cristalizariam no “espiritualismo moderno”, que alguns, com pouco rigor, rotulam como “espiritismo anglo-saxão”. Kardec foi informado de suas experiências e de suas teorias, delas aproveitou no que julgou útil, e desenhou a doutrina espírita com perfil autônomo.

No que diz respeito ao celeiro das teorias científicas, filosóficas, políticas, sociológicas, antropológicas, demográficas ou econômicas que agitavam o ambiente europeu, tampouco se poderia entender o surgimento do espiritismo com a monumental obra de Kardec sem reconhecer a poderosa influência que em seu pensamento, em sua paixão por estudar e entender, em sua frieza e ceticismo aplicados ao diálogo com entidades espirituais, em sua mentalidade racionalista e livre de pensamento, exerceram correntes como o Iluminismo, o positivismo, as utopias sociais e o evolucionismo.

Em sua reflexão sobre o contexto sociopolítico, cultural e científico que envolveu Kardec, os integrantes da EàE chegaram à conclusão de que Kardec era racista, por ter assimilado teorias da frenologia, da fisionomia e da visão social dominante à época. embora tenham reconhecido que os princípios do espiritismo expostos em seus livros, quando devidamente compreendidos e praticados, destruirão os "estúpidos preconceitos da cor".

Nossa análise, entretanto, não nos leva a tal conclusão. De forma alguma podemos concordar com a tese de que o fundador e codificador do espiritismo era racista. Parece-nos um erro redondo contemplar a árvore e parar de olhar para a floresta. Não se pode negar ou ignorar que existem opiniões de Kardec e também dos assessores desencarnados que intervieram na elaboração da doutrina espírita, que refletiam as crenças dominantes no século XIX acerca da diferenciação entre "raças superiores ou civilizadas" e "raças inferiores ou selvagens", mas são expressões secundárias e tangenciais a todo o edifício doutrinário. Para além de algumas frases e termos que hoje parecem inadequados e ultrapassados, o que é realmente essencial e cerne dos ensinamentos kardecistas é o reconhecimento de que todos os espíritos são livres e iguais em dignidade e direitos, e que a lei evolutiva da reencarnação nos leva inexoravelmente à superação e erradicar todas as formas de discriminação com base na cor da pele, nacionalidade, orientação sexual, crenças, títulos acadêmicos ou condições socioeconômicas. E é isso que aprendemos a partir do momento em que estudamos e internalizamos os princípios e valores cardeais que sustentam e enriquecem a doutrina espírita.

Pensamos que as preocupações dos membros do coletivo EàE poderiam ter sido canalizadas de maneiras diferentes. Por exemplo, editar os livros em questão e colocar suas anotações no rodapé da página, informando que são de sua autoria. Este é um procedimento legítimo e que pode abrir espaços para discussões muito sérias. Ou, e talvez isso seja o mais relevante, escrever e publicar artigos, ensaios, panfletos ou livros nos quais apresentem suas análises, seus conceitos e suas críticas sobre esses temas. Consequentemente, permitimo-nos convidá-los a realizar um maior esforço intelectual, com absoluta autonomia, e a publicar e divulgar amplamente os textos resultantes do seu trabalho. Tarefas que apontavam nessa direção já foram realizadas por diversos pensadores espíritas como Quintín López Gómez, Manuel Porteiro, David Grossvater ou Jaci Regis, entre outros. A esse respeito, parece muito oportuno e esclarecedor transcrever aqui dois parágrafos extraídos do Espiritismo dialético, obra monumental de Porteiro:

"A doutrina de Kardec e seus colaboradores, embora verdadeira em seus princípios fundamentais, não pode ultrapassar os limites de seu tempo ou romper totalmente com os moldes religiosos aos quais se ajustou...". “Hoje, as exigências do espírito científico e filosófico, que abarcam horizontes mais amplos, não se satisfazem com os expedientes religiosos e morais de São Luís, de Santo Agostinho ou de qualquer outro santo filósofo ou teólogo, nem com versos, preceitos ou parábolas extraídas da Bíblia”.

A inserção de qualquer texto acrescentado na capa dos livros de Kardec parece totalmente equivocada e improcedente, ainda mais se for um slogan carregado de tamanha agressividade como o de "edição antirracista". Talvez não seja ilegal, nos termos estabelecidos pelas normas do direito intelectual, nem constitua adulteração, stricto sensu, já que nenhuma palavra ou parágrafo foi alterado ou excluído, embora alguns textos tenham sido inseridos, pelo que podem considerar atos lesivos de acordo com os princípios da lei moral. É que ninguém está autorizado a agir dessa forma, independentemente da impressão que se tenha de um livro ou de seu autor. Há muitos espíritas que se indignam com o que consideram uma afronta à memória do fundador do espiritismo, e com razão. É fácil inferir que se são edições “antirracistas” então as edições anteriores foram “racistas”, o que francamente é inaceitável.

Se aprofundando nesse assunto, verá que tudo surge de um vício de anacronismo, ou seja, de julgar conceitos expostos em épocas e contextos anteriores de acordo com os ditames que derivam da aplicação de certos valores e de giros semânticos  que respondem aos cânones do presente. Se essa forma de agir fosse aplicada aos milhões de livros que constituem o patrimônio intelectual, cultural e espiritual da humanidade, nenhum passaria no exame ou permaneceria intacto. Desde os textos básicos que informam as diferentes tradições religiosas, até os admiráveis ​​monumentos filosóficos que surgiram no quadro do esplendor cultural helênico, e continuando com as inúmeras criações do intelecto humano em todos os tempos, nenhuma obra estaria exonerada de ser publicada com algum slogan que esteja de acordo com as exigências do que hoje é considerado "politicamente correto".

Nos perguntamos. Quantos slogans poderiam ser colocados na capa das novas edições da Bíblia se nos ativermos à enorme carga de racismo, homofobia, violência e discriminação que é fácil encontrar em inúmeros versos entre a variedade de livros que a compõem? Também valeria a pena conjeturar se as obras de Platão, Aristóteles ou outros clássicos gregos deveriam ser publicadas com o aviso "edição antiescravagista" por razões bem conhecidas.

Continuando com os trabalhos de Kardec, quem pretender fazer uma nova edição de O Livro dos Espíritos e aceitar como bom o procedimento seguido pelo coletivo EàE, poderá inserir na capa uma expressão altissonante que, a seu critério, ajudaria a esclarecer os leitores. Por exemplo, que tal uma "edição antissexista" ou uma "edição feminista" já que existem conceitos naquela obra que refletem os valores culturais predominantes do século XIX e que são inaceitáveis ​​dados os avanços que foram feitos em a favor do reconhecimento da igualdade entre mulheres e homens. E, continuando na mesma ideia, poderia surgir uma "edição laicista" de O Evangelho segundo o Espiritismo, para propor novas redações sobre aqueles pontos que se prestam a confusão em questões como as descrições antropomórficas de Deus ou o uso repetido de expressões tão inoportunas quanto as punições ou pecados. Imaginemos o tratamento que seria dado a “A Gênesis”, obra em que Kardec se propunha a examinar as teorias científicas de seu tempo em matérias tão sensíveis e mutáveis ​​quanto as que correspondem às investigações da biologia, geologia, astronomia e outras disciplinas, contribuindo com elementos derivados da análise espírita. É mais do que evidente, para qualquer pessoa estudiosa e bem-informada, que várias das teorias que ele considerava corretas foram completamente corrigidas e superadas. A Gênesis seria publicado com um slogan na capa anunciando que é uma “edição científica, corrigida e atualizada”?

E o que dizer da obra O mundo invisível e a guerra, em cujas páginas o admirado pensador Léon Denis conclama o povo francês a se mobilizar para se juntar à defesa militar da pátria contra a invasão dos exércitos alemães e invoca a ajuda de Juana d’ Arc e outros espíritos protetores da Gália para derrotar os "bárbaros alemães". Se fosse publicado atualmente, seria necessário colocar na capa o aviso de que se trata de uma "edição antibelicista" e os textos seriam intercalados com novas redações ou seria mais adequado inserir notas de rodapé nas questões correspondentes esclarecendo que Denis estava escrevendo em 1919 no contexto da primeira guerra mundial?

Paremos de contar. Com o que foi dito basta para deixar claro nosso contundente desacordo com a decisão do coletivo EàE, sem deixar de reconhecer que houve uma compreensível preocupação com os efeitos negativos que poderiam derivar de uma posição crédula e acrítica em relação ao fundador as obras do espiritismo em todas aquelas questões que os avanços científicos e tecnológicos, a terminologia utilizada, bem como os resultados positivos das lutas sociais, aconselham que sejam levados em conta para retificar o que seja necessário e continuar avançando, tal qual  recomendou Kardec.

Já o dissemos e agora reiteramos: a nossa opinião, o espiritismo começou com Kardec, mas não termina com ele, embora, até agora, o estudo de suas obras seja essencial para conhecer e interpretar corretamente os postulados teóricos e experimentais do doutrina que fundou. Não há verdadeiro espiritismo sem Kardec, embora nem todo espiritismo esteja contido em seus livros, nem  tudo o que ele escreveu está vigente. Além disso, a contribuição oferecida por autores encarnados e desencarnados para o enriquecimento do patrimônio cultural do espiritismo não pode ser subestimada. A espiral do progresso marca o rumo seguido pela evolução da humanidade e o espiritismo não deve ficar de fora, mas, ao contrário, deve-se insistir que ele tem muito a contribuir nos campos da filosofia, da ciência, da reflexão ética e suas aplicações morais, com seu enfoque espiritualista e humanista em questões transcendentais como a existência de Deus, a sobrevivência espiritual, a evolução geral do universo, a comunicação permanente entre as humanidades encarnadas e desencarnadas, o progresso eterno através de vidas sucessivas e a cosmovisão de mundo que coloca a vida em na Terra em um contexto universal.

IV – UNIDADE NA DIVERSIDADE

Nós concluímos. É legítimo que haja discrepâncias entre os espíritas na interpretação de diversos assuntos. Afinal, é natural que isso ocorra em torno de uma doutrina que não se sustenta sobre dogmas e no seio de um movimento que não deveria se constituir como uma religião institucionalizada. As divergências podem ser processadas por meio de um diálogo respeitoso e fraterno, com "ouvidos para ouvir", priorizando o substantivo e deixando de lado os adjetivos ou desqualificações.

O certo é que para além das diferentes opiniões que cada um mantenha, prevalecem os valores morais em que todos concordamos. Valores que se resumem em lições de indiscutível vigência e transcendência como as ensinadas por Jesus de Nazaré, “o homem incomparável” como dizia Renan: ame o próximo como a si mesmo; não faças ao outro o que não queres  que façam para ti; que atire a primeira pedra quem está livre de culpa, e só a verdade te libertará. Orientações que nos convocam a  esforçarmos em nosso processo íntimo de superação moral e ao mesmo tempo trabalhar, aqui e  agora, pela construção de um mundo melhor, mais livre, igualitário, equitativo, solidário, fraterno e amoroso; uma sociedade sem racismo ou discriminação sob qualquer pretexto. Conectados em torno dessa aspiração superior, todos nós, espíritas e partidários de qualquer ideologia, podemos dar as mãos e seguir em frente.

 

JON AIZPÚRUA

Tradução para o português – Alexandre Cardia Machado    

     

 

       

 

 

 

 

 

 

 





quinta-feira, 2 de março de 2023

Onde buscar a vontade de superação? por Roberto Rufo

 

 Onde buscar a vontade de superação? 

 

"Estou esperando o tempo passar rapidamente. Quem sabe assim chegam logo os dias melhores que tanto falam ``.(Pensador Desconhecido).

 

"Uma Igreja que se casa com o espírito de sua época, corre o risco dessa época passar e a Igreja tornar-se viúva dessa época" (Frase de Bento XVI ao Cardeal Bergoglio no filme Dois Papas).

 


 

 Em seu fantástico livro "Comportamento Espírita" , Editora Dicesp, 1981 (possuo um exemplar assinado pelo autor), capítulo 3 - O Espírita e o Mundo" o autor Jaci Regis aponta que "a visão global do espiritismo, abrangendo desde as causas primárias à harmonia do Universo, oferece elementos capazes de levar o homem a situar-se na vida". Essas palavras ditas a 41 anos atrás apostavam que a Doutrina Espírita seria condição necessária e suficiente para sabermos o que somos, o que estamos fazendo no mundo e qual o nosso destino. Infelizmente as coisas não caminharam dessa forma. O espiritismo passou a ser visto pela nova intelectualidade surgida na época como pouco aliado à realidade. Era preciso que novas teorias fossem acrescidas ao ideário espírita. Não falo das descobertas das ciências  que nos trazem aperfeiçoamentos na maneira de pensar. Falo da introdução de conceitos que mais não querem do que substituir a essência do conhecimento espírita por teorias sociais que prometem mudanças radicais no mundo. Especialmente contra as desigualdades sociais.

 Situação semelhante é relatada pelo escritor cristão, o americano  Ross Douthat ao alertar que os cristãos devem se tornar minoria nos EUA até 2040. Ele diz que 'heresias' como a teologia da prosperidade, a religião da autoajuda e o nacionalismo cristão chauvinista se mantêm fortes. A porcentagem de cristãos na população americana, que girava em torno de 90% nas décadas de 1970 e 1980, ficou abaixo de 50% para o próximo meio século. Surgiu na América uma igreja de amor-próprio, com profetas como Oprah Winfrey pregando um evangelho do eu divino, uma espiritualidade do "Deus Interior" que arrisca transformar o egoísmo em virtude, O reverendo Joel Osteen, em cerimônia de distribuição de alimentos em Nova York insiste que Deus não deseja mais para seus eleitores do que a prosperidade americana, o sucesso do capitalismo.

 A ascensão de Donald Trump foi um testemunho da força das principais heresias dentro da direita religiosa. Ele frequentava a igreja do pastor Norman Peale, o autor do livro O Poder do Pensamento Positivo. Do lado da esquerda alerta Ross Douthat surgem teorias identitárias que a pretexto de concessões às minorias ( Vidas Negras Importam, #Me Too ), a chamada era da diversidade-equidade-inclusão, na verdade como alerta o ex-deputado Aldo Rebelo, nada mais é do que uma concessão do sistema capitalista às minorias, desde que o próprio sistema não seja alterado. Tudo isso, segundo Ross Douthat, aumenta a distância das pessoas à influência do cristianismo. Principalmente da figura de Jesus Cristo , no caso do cristianismo. Na situação espírita, laica e kardecista,  é cada vez mais difícil ler-se algum artigo onde apareça a figura de Jesus de Nazaré.

Me parece haver uma certa vergonha intelectual nas citações sobre aquele que é considerado pela teoria espírita como o maior exemplo de moral a ser seguido.

Volto-me mais uma vez a Jaci Régis no livro e capítulo citado acima ao nos ensinar que " o espírita vê a sociedade composta de espíritos a exprimirem estados evolutivos próprios, nos atos do dia a dia, nas esquematizações sociais e percebe a ânsia desses mesmos espíritos em buscar, mesmo que no plano teórico, comportamentos mais satisfatórios individual e coletivamente. Por isso, o espírita nega os valores do mundo, enquanto permaneçam no nível do imediatismo e no desconhecimento dos valores espirituais da vida". Vi com muita tristeza nesses anos de turbulência ideológica um vídeo de espíritas bolsonaristas, com o hino nacional num arranjo de piano ao fundo, e de repente surge  a imagem de uma coroa de espinhos e a epígrafe: foi por amor, complementada por Brasil acima de tudo, Deus acima de todos. Um grupo de quinze pessoas vestidas de branco dão mensagens de apoio à manifestação golpista convocada por Bolsonaro para o 07 de |setembro. E terminam cada um com a fala: eu sou espírita e apoio você , meu presidente. Eu te autorizo a fazer o que for necessário.

Assim como a Teologia da Libertação na década de 1960 trouxe a política partidária para dentro da Igreja Católica, o espiritismo também está trazendo a política partidária para dentro das suas hostes. O movimento Espíritas da Esquerda é um claro exemplo disso. Esquecem que a política é um dos campos onde as decisões e os caminhos sempre serão tomados com base nos desejos carnais. Vou além, e afirmo que hoje mais do que nunca os interesses econômicos ou de grupos de interesses é o que rege a política. O espiritismo corre esse risco se trouxer a política partidária para dentro dos seus domínios. 

Na verdade, não há novidade no que está acontecendo no mundo. Como afirma a Doutrina Espírita, o avanço moral não acompanha o progresso intelectual. Estamos bem atrasados moralmente. É inevitável que episódios de violência e transformações de todo tipo se apresentem como parte do processo de evolução dos espíritos. A Doutrina Espírita é uma luz na escuridão. Mas os espíritas são parte da humanidade, portanto sujeitos ao processo. O espiritismo foi sequestrado no Brasil pela FEB que o transformou numa religião desprezada pela sociedade. Essas novidades como esquerda ou direita dentro do movimento espírita fazem parte dessa inquietação que pretende levar o espiritismo para o que consideram a verdade a ser implantada. Mas tudo isso é inútil. O espiritismo não tem dono. Um ótimo 2023 a todos.

Artigo publicado no jornal ABERTURA de janeiro - fevereiro de 2023

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                                                                                                                Roberto Rufo.

                                                               

 

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Admirável Mundo Novo! por Alexandre Cardia Machado


Admirável Mundo Novo!

As vezes precisamos olhar para trás e ver o quanto a humanidade mudou, no livro Homo Deus – Uma Breve História do Amanhã  -Yuval Noah Harari - inicia o livro fazendo uma reflexão quanto os problemas que nosso planeta enfrentou nos últimos 20 mil anos, poderíamos reduzí-los a três aspectos: fome, pestes e guerras.

Como morte por fome é bem mais difícil de documentar, vou me concentrar nestes dois aspectos: guerra e pestes, não precisaremos recorrer à idade média e a peste bubônica, fiquemos apenas com o que ocorreu no século  20 e 21.

Século 20 - Guerras:
1ª Guerra Mundial – 9 milhões de mortes;
Revolução Russa  – estima-se em 40 milhões de mortes;
2ª Guerra Mundial – 26 milhões de mortes;
Genocídio Nazista -  20 milhões de mortes;
Revolução Chinesa – estima-se em 65 milhões de mortes;
Guerra da Coreia – cerca de 2 milhões de pessoas mortas;
Guerra do Vietnan – cerca de 1,2 milhões de mortos;
Guerra Irã – Iraque – cerca de 1 milhão de pessoas mortas;
Guerra dos Balcãs – cerca de 600 mil mortos entre combatentes e extermínios racias.

Século 21 – Guerras
Principalmente a chamada Primavera Árabe – estima-se algo entre 100 e  200 mil mortos nos diversos países onde ocorreram.
No século 20 – 50 milhões de pessoas morreram de Gripe Espanhol, ao redor do mundo logo após a 1ª Guerra Mundial. Os mesmos navios que levavam comida e munição a Europa voltavam trazendo, para todos os portos a gripe.

O século 21 está no começo e a humanidade tem a capacidade de se auto-destruir graças as centenas de armas nucleares que criamos, mas nada indica que isto venha a ocorrer. Apesar de seguirmos atirando uns nos outros, morrem mais pessoas de “acidentes” de trânsito ou de sobrepeso, do que por bala ou por fome, ainda que em pontos isolados do planeta possamos ter situações fora da curva média. Os surtos de gripe asiática, Ébola e outros foram rapidamente controlados. A diferença entre hoje e 100 anos atrás é a existência de tecnologia e investimentos em investigação e uma rede de sustentação mundial, capaz de deter qualquer ameaça.

O que mudou tudo isso? No meu entender o avanço do conhecimento, da telecomunicação, dos organizações internacionais, a ONU, a globalização. Com isto, apesar dos problemas que causamos no meio ambiente, formamos uma rede de interdependência que nos une e torna mais difícil o aparecimento de conflitos entre nações, temos uma grande rede de amortecimento.

Vejam o caso da Venezuela, há 30 anos atrás já estaríamos todos em guerra. Hoje cada cidadão no mundo tem uma câmera fotográfica na mão, que pode enviar imagens imediatamente para o mundo todo. Isso existe há pouco mais de 10 anos e está mudando a nossa maneira de viver. Tecnologia que sempre terá um lado bom, tem também um lado mal, que veremos a seguir é a capacidade de proporcionar um excesso de controle.

Hoje se há um crime, no mundo todo as polícias vão atrás de imagens e programas de identificação de face  ajudam a resolver casos, claro não estamos no mundo ideal, pois o ideal seria não haver crimes. Ou que todos os crimes fossem resolvidos. Mas hoje está muito difícil esconder uma mentira. Tem gente que não se deu conta ainda, ok, vai parar atrás das grades, mais cedo ou mais tarde.
Pela primeira vez, existe uma matriz de informação nas nuvens, nos algorítmos e isto causará mudanças a velocidades impressionantes. Allan Kardec nos falava da aristocracia Intelecto-moral, e que eleas levariam o mundo a um estágio melhor, não me parece que isto ocorrerá por imposição dela, mas em consequência da maneira que nos portamos. Hoje não somos apenas uma pessoa com RG e CPF, somos pessoas com RG, CPF e perfil. Sim, perfil, os bancos, as lojas os algorítmos sabem do que gostamos, onde vamos e com quem nos relacionamos. E damos todas estas informações de graça.

Gostamos da facilidade da tecnologia, mas como já dizia Ulisses Guimarães, não existe jantar de graça, quando uso o waze, que é muito bom, pois não me deixa ficar perdido, no mesmo momento que me diz onde estou, alimenta o algorítmo, eu forneço uma séria de informações para o aplicativo, que serão transformadas em dinheiro. Poderemos explicar em mais detalhes como eles ganham dinheiro em outro artigo.
Voltando à questão da aristocracia intelecto-moral, ouso dizer que teremos a aristocracia tecnologica-moral, andaremos fazendo o certo porque senão o “big brother” vai nos pegar! É mais ou menos como a velha propaganda de biscoitos Tostines– por que eles são sempre crocantes? Porque são sempre novinhos. Por que são sempre novinhos? Porque alguém está sempre comprando e assim por diante.

Acredito portanto que em mais alguns anos estaremos todos vivendo numa grande Singapura, onde hoje ninguém deixa cair um papel no chão, pois há câmaras em todos os lados, reconhecimento facial e multa via internet, assim, logo todos ficam bons cidadãos.
Pode demorar uns 10 ou 15 anos mais esta onda vem. Aristocracia tecnologica-moral, seremos todos mais parecidos, auto controlados e controlados pelo sistema.

Pense nisso.

Editorial Jornal Abertura - Maio 2019

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segunda-feira, 15 de abril de 2019

BREVE REFLEXÃO SOBRE ESPIRITISMO, POLÍTICA E SOCIEDADE NO ÂMBITO DA CEPA - por Ricardo de Morais Nunes


BREVE REFLEXÃO SOBRE ESPIRITISMO, POLÍTICA E SOCIEDADE NO ÂMBITO DA CEPA.

Em tempos de polêmicas políticas e sociais, tanto na esfera nacional quanto internacional, vale a pena pensarmos sobre o papel dos espíritas laicos e da CEPA (Associação Espírita Internacional) em relação a estes temas. Trata-se de uma reflexão de grande importância no que diz respeito as diretrizes fundamentais do movimento espírita laico e livre pensador, que precisa delinear, com precisão de princípios, o que poderíamos chamar de um pensamento social espírita, com vistas a compreensão e enfrentamento dos temas sociais e políticos do mundo contemporâneo.

  O intelectual espírita deve ter uma abrangência global em seu olhar para a realidade. Deve ser alguém capaz de pensar desde as questões metafísicas até as estruturas sociais. O intelectual espírita, portanto, deve refletir sobre o além, sobre as condições existenciais na esfera extrafísica; sobre o homem terreno, enquanto indivíduo encarnado; e sobre o mundo, em seu aspecto de organização social.  Devemos ser capazes de abrigar no âmbito da CEPA e da CEPABrasil (Associação Brasileira dos delegados e amigos da CEPA) espíritas que pensem e falem sobre todos os temas da filosofia espírita.

Neste sentido, temos que ser capazes de discutir sobre o períspirito, mas também devemos refletir sobre as exclusões econômicas e sociais proporcionadas pelo sistema capitalista de produção. Devemos ter a capacidade de refletir sobre os efeitos benéficos do magnetismo, mas também sobre as restrições à liberdade individual geradas pelas chamadas ditaduras do proletariado. Devemos ser livres para discutir sobre “Nosso lar”, a colônia espiritual revelada pelo espírito André Luiz, mas também devemos refletir sobre a importância da defesa do laicismo ante a influência das religiões no Estado. Por fim, devemos filosofar sobre a ideia de Deus, mas também devemos nos dedicar a pensar nos processos de corrupção pública e privada que abalam os orçamentos das nações e desviam recursos fundamentais que deveriam ser aplicados no bem comum.

 Devemos discutir todos estes temas e outros de natureza política e social, à luz da filosofia espírita e das ciências sociais, abertamente, dialeticamente, sem sectarismo, e com pleno respeito a opinião do outro, em uma tentativa honesta, verdadeira, de compreensão profunda de fenômenos políticos, sociais e econômicos complexos, que não se prestam a simplificações através de frases feitas ou sentenças definitivas.

No campo das ideias políticas e sociais, há alguns companheiros que defendem que a CEPA e a CEPABrasil devem ser uma espécie de guarda-chuva, com vistas a abrigar tanto os espíritas de direita, quanto os de esquerda, e os que não tem posição política. Apesar de concordarmos com a necessidade de abrigar a todos, em um espírito de alteridade e fraternidade, pensamos que a CEPA e a CEPABrasil, enquanto instituições, não devem ser neutras no que diz respeito a estes temas.

 Em conformidade com os princípios sociais humanistas da filosofia espírita, a CEPA e a CEPABrasil devem se colocar expressamente, inequivocamente, a favor das liberdades democráticas, da justiça social, do laicismo, dos direitos humanos, da ética na condução dos negócios públicos e privados, e da preservação ecológica do planeta.  Na ordem internacional, os espíritas laicos e livre pensadores devem ser defensores do pacifismo, ou seja, da resolução não violenta dos conflitos entre as nações, e devem ser contrários a quaisquer tipos de imperialismos ou neocolonialismos, em pleno e absoluto respeito à soberania dos povos para decidir seus destinos.

 Em especial, estas instituições do movimento espírita laico e livre pensador devem se colocar decisivamente a favor dos mais fracos economicamente na sociedade.  Quanto a preocupação com os mais carentes que alguns no Brasil de hoje em dia lamentavelmente chamam de partidária ou esquerdista, e que preferimos chamar de humanista, vale lembrar uma frase de O Livro dos Espíritos que sintetiza esta preocupação na obra espírita: “Numa sociedade organizada segundo a lei do cristo, ninguém deve morrer de fome” (reposta a questão 930 LE). Esta frase deveria ser um antídoto contra qualquer tendência a uma pretensa neutralidade dos espíritas nestes temas.  Aliás, quanto a acusação de que pensar nas estruturas injustas da sociedade e nos mais carentes é coisa apenas de comunista, lembramos de uma célebre frase do cristão Dom Hélder Câmara: “Quando alimentei os pobres chamaram-me santo, mas quando perguntei por que há gente pobre chamaram-me comunista”.

Os espíritas têm sido muito eficazes ao longo da história do movimento espírita na criação de instituições de caridade, em cuidar dos efeitos das sociedades desiguais, o que é muito bom e sempre deverá ser incentivado. No entanto, o pensador espírita deve ir além com vistas a pensar nas causas profundas das desigualdades sociais, a fim de construir um pensamento social espírita maduro sobre tais temas.

A CEPA e a CEPABrasil não podem cair no erro de pensar apenas no indivíduo, na reforma moral ou intima, ignorando as estruturas econômicas, sociais e, principalmente, as ideológicas, uma vez que estas últimas condicionam e atravessam o indivíduo, constituindo lhe a subjetividade e sua maneira de ser e estar no mundo. A ideologia vigente, de índole materialista, estimulada pelos interesses do capital, baseada na mercantilização da vida, fundamentada na preferência do ter sobre o ser, na ideia de concorrência de todos contra todos, na acumulação financeira, e na exaltação do supérfluo sobre o necessário, concorre na deformação ética do indivíduo, daí a necessidade do pensamento crítico com vistas ao aperfeiçoamento moral do homem.

A ideia de um homem e de um mundo melhor, mais fraterno e justo, está presente na filosofia espírita. Esta ideia perpassa desde a mudança do indivíduo até a mudança das instituições. Portanto, cabe ao espírita intelectualmente maduro pensar globalmente sobre todas as questões, sobre todos os assuntos, a partir de todas as perspectivas do conhecimento filosófico. O espiritismo deve permanentemente dialogar com todas as ciências desde as ciências físicas, psicológicas, biológicas, parapsicológicas, humanas, astronômicas, etc. Os espíritas e o espiritismo têm muito a contribuir com estes ramos do conhecimento, mas também tem muito a aprender e assimilar em um contexto de progressividade do pensamento espírita.

 Entendemos que o adjetivo “progressista” que adotamos na CEPA e CEPABrasil não deve ser compreendido pela metade, apenas no que diz respeito a liberdade no campo dos costumes, mas também no que diz respeito ao avanço dos processos sociais no sentido do progresso, em direção a mais vida, mais igualdade, mais liberdade, para todos que se encontram neste planeta, independentemente dos governos de plantão.

 Alguns dirão que existem as verdades eternas com as quais devemos particularmente nos preocupar. E que não devemos nos preocupar com as questões terrenas e transitórias. Certamente que não precisamos nos envolver com a pequena política partidária dos interesses egoístas, bem como com as mesquinhas disputas pelo poder. Certamente que não devemos fazer campanha política dentro do centro espírita, e muitos menos querer formar uma bancada espírita no congresso.  Não precisamos formar o partido espírita. No entanto, podemos discutir nos centros, federações e eventos espíritas, princípios filosóficos de caráter social e político, podemos elaborar debates, produzir palestras, artigos, trabalhos e livros, em absoluto clima de livre pensar, com vistas a estabelecermos uma concepção espírita humanista, democrática, equitativa e ecológica de mundo e sociedade. E podemos até mesmo realizar ações, enquanto membros da sociedade civil, com vistas a contribuir de alguma forma para a melhoria da vida social.

   Temos condições de estabelecer no âmbito do movimento espírita laico e livre pensador um pensamento social espírita crítico, isento de preconceitos filosóficos, que se proponha a estudar e refletir desde o liberalismo até ao marxismo, o que fará com que nos habilitemos a dialogar com o mundo contemporâneo no que diz respeito aos temas políticos e sociais. Podemos compreender esta necessidade de formação intelectual séria dos espíritas ante as inúmeras mensagens e declarações pueris e alienadas que são enviadas por alguns espíritas pela internet e redes sociais, as quais muitas delas passam a imagem que os espíritas como um todo vivem em um mundo abstrato, de colorido fantasioso, e de expectativas messiânicas e mágicas.

É preciso lembrar que o espiritismo considera a presença do homem no mundo, encarnado, como um fator de evolução intelecto- moral, não apenas do indivíduo, mas também das sociedades. Além do mais, os problemas estruturais de nossa sociedade produzem extremo sofrimento em grande parte da população, e conhecer as causas do sofrimento humano, para atenua-lo, certamente é um dos interesses do espiritismo.

Outros dirão que o ambiente político e social brasileiro e internacional está polarizado, e que tais reflexões perturbariam nosso ambiente e não seriam fator de agregação e harmonia. Porém, é justamente nos momentos de crise que temos a oportunidade de dizer ao mundo a que viemos. É nos momentos de crise que revelamos integralmente quem somos. É nestes momentos que devemos oferecer àqueles que se aproximam dos espíritas laicos e livre pensadores uma reflexão séria do mundo e da sociedade, a partir de todo o arcabouço filosófico produzido pelos pensadores espíritas de todos os tempos no campo político e social, e também levando em consideração toda a produção das ciências humanas produzidas até este momento histórico.

 Existirão aqueles que, ante as reflexões acima, dirão que o que importa mesmo é o melhoramento intelecto-moral do indivíduo, e que o progresso social virá por consequência. Porém, a filosofia espírita nos convida a um pensamento mais amplo, não restritivo, no que diz respeito aos problemas do mundo. Vivemos em sociedades extremamente individualistas, desiguais, ainda extremamente injustas para a grande maioria das pessoas. Se não nos preocuparmos com isso estaremos nos alienando. Por fim, a filosofia espírita nos convida a pensar e a crer   em um outro mundo terreno possível, mais justo, solidário, livre, e amoroso, quando nos fala da lei de progresso. Se ignorarmos este aspecto do espiritismo, estaremos compreendendo o espiritismo de forma incompleta.


RICARDO DE MORAIS NUNES: É presidente do CPDoc (Centro de Pesquisa e documentação Espírita- Instituição filiada a CEPA – Associação Espírita internacional)

Nota : Este artigo será publicado no Jornal Abertura nas edições de abril e maio de 2019








quarta-feira, 10 de abril de 2019

O Espiritismo que queremos? por Alexandre Cardia Machado



Allan Kardec certamente queria algumas coisas como: antepor-se ao materialismo que começava a tomar conta do pensamento moderno; queria demonstrar que a vida no Universo tinha dois componentes o físico e o espiritual; queria demonstrar que existia uma lógica moral regendo este Universo, determinada por Deus; queria que compreendêssemos e espíritismo de uma maneira mais uniforme possível. Para isso manteve o monopólio do que era ou não espiritismo sob sua batuta até o sua desencarnação.

No livro Obras Póstumas, no capítulo Constituição do Espiritismo, os passos para a sua atualização estão ali escritos, vale salientar que este livro, feito sobre manuscritos do Professor Rivail, não foi publicado por ele, caso o fosse o nome do mesmo não seria este, foi publicada somente em 1890, 21 anos após a desencarnação de Kardec.

Mas o que queremos mesmo do espiritismo hoje, passados 150 anos da desencarnação do professor Hipollyte Léon Denizard Rivail que se completará este mês, no dia 31 de março?
Como somos livres-pensadores, unanimidade não é o nosso forte, não conseguimos, ainda que tenhamos tentado, criar mecanismos de atualização, não gostamos de comitês e acreditamos que grupos de especialistas tendem mais a afastar ideias novoas do que aceitá-las. Mas existiram iniciativas de consolidação do pensamento livre-pensador da CEPA, dois livros publicados e os congressos que periodicamente revisitam temas importantes.

Desta forma, e através dos jornais como o nosso Abertura e o Opinião do CCEPA, grupos como o CPDOc e editoras como as do ICKS, do CCEPA que com seus livros fomos consolidando um novo vocabulário, mas atual, ainda que longe de representar um pensamento organizado. No entanto trás o convívio de ideias novas aos velhor livros da codificação. Nos ajudaram a nos livrar das amarras do entendimento errado das reencarnações punitivas e permitiu um transitat num frescor de um novo pensar espírita.

Este caminhar nos afastou do movimento religioso e se formos bastante críticos, dos próprios textos básicos espíritas, não que não reconheçamos seu valor, são importantíssimos como caminho necessário ao conhecimento, mas estão muito ultrapassados em forma e conteúdo, especialmente em pontos que se aproximam da ciência, ou de algumas questões humanas como racismo, papel da mulher entre outros.

Relatando aqui uma experiência do ICKS de sete anos seguidos, ministrando um curso chamado – Estudo Dirigido do Livro dos Espíritos – enfocado a pessoas comuns, por onde mais de 200 pessoas, espíritas ou não, passaram por nós. Nos vimos na situação de selecionarmos as questões que iríamos apresentar, pois cerca de 30% das respostas de questões do Livro dos Espíritos estão obsoletas, ou então não apresentam Deus como Inteligência Suprema e sim como o deus de Abraão, raivoso e punitivo, algo que pode ter passado despecebido por Kardec, talvez  por que ao seu tempo este questionamento não estivesse maduro suficiente ainda.

Somos, verdadeiramente um grupo pós Kardec e quanto mais rápido aceitarmos isso, melhor será para nosso grupo. Não entendam o pós-Kardec como anti Kardec, pois isso não somos. Mas buscamos ver além de Kardec do século XIX tentando nos colacar na posição dele hoje, pensando como pensaria Kardec se hoje estivesse encarnado.

Talvez não haja consenso no que escrevo aqui, mas acredito que vale o exercício, aberto naturalmente à crítica construtiva.

O que queremos do espiritismo:

- um espiritismo livre, atual, capaz de enfrentar as questões do nosso tempo, de nosso cotidiano;

- que tenha uma linguagem moderna, capaz de atrair a juventude;

- que entenda e que ensine a imortalidade dinâmica, como instrumento de aperfeiçoamento do espírito;

- que seja uma ciência da alma, pois nosso objeto muda do espírito desencarnado, para o espírito imortal, com enfase na sua atuação enquanto encarnado, pois é sobre ele que o espiritismo pode fazer a diferença como um instrumento de entendimento do mundo;

- que seja tolerante, fraterno e humanista;

- que incorpore a Declaração Universal dos Direitos do Homem como um de seus fundamentos;
- que seja legitimamente democrática;

- que não seja oportunista, nem tudo que vem dos espíritos pela mediunidade é espiritismo;

- que as casas espíritas incentivem o estudo, o diálogo e a produção de trabalhos espíritas;

- que as relações entre seus membros sejam ditadas pelo respeito;

- que possa ser político, mas não partidário.

Poderíamos seguir listando ideias, mas mais importante do que escrever é fazer, esta sempre foi a característica de um espírita a ação que corresponde às palavras.

Gostou, quer ler o jornal abertura de março de 2019 onde foi publicado?





sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Declaração Universal dos Direitos Humanos - uma visão espírita por Delma Crotti


Declaração Universal dos Direitos Humanos

Há 70 anos, no dia 10 de dezembro de 1948 foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos Humanos pela ONU (Organização das Nações Unidas). Já nasceu com o objetivo primordial de ser respeitada e acatada por todas as nações do mundo.

Cláudia Régis Machado e Delma Crotti - no Congresso da CEPA em Rosário - Argentina

Direitos humanos são os direitos e liberdades básicas de todos os seres humanos.

Seu conceito também está ligado com a ideia de liberdade de pensamento, de expressão e de igualdade perante a lei.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas afirma que "Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade."
São normas fundamentadas no valor Liberdade e abrangem os direitos econômicos, sociais e culturais.

A ideia de "direitos humanos" tem origem no conceito filosófico de direitos naturais que seriam atribuídos por Deus.

Em 18/abril/1857, por ocasião do lançamento de O Livro dos Espíritos, portanto aproximadamente   91 anos antes da DUDH, no capítulo IX da parte terceira de OLE, Kardec faz o seguinte comentário sobre a Igualdade Natural, questão 803: “Todos os homens estão submetidos às mesmas leis da Natureza. Todos nascem igualmente fracos, acham-se sujeitos às mesmas dores e o corpo do rico se destrói como o do pobre. Deus a nenhum homem concedeu superioridade natural, nem pelo nascimento, nem pela morte: todos, aos seus olhos, são iguais.”

Então, notamos que, na novel doutrina Espiritismo, já havia a conscientização dos direitos de igualdade do homem, em seus aspectos físicos, morais e sociais, que pudessem garantir a dignidade da existência humana.

Jon Aizpúrua em seu livro Os Fundamentos do Espiritismo diz: “A rigor, através do ponto de vista histórico, o Espiritismo surge com um formidável trabalho teórico e experimental que realizou em meados do século XIX o pedagogo francês HIPPOLYTE LEON DENIZARD RIVAIL, amplamente conhecido como ALLAN KARDEC, que elaborou suas definições, precisou sua constituição doutrinária e determinou suas consequências.”

O acima citado está em plena conformidade com Kardec: “O Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Como ciência prática consiste nas relações que podem estabelecer-se com os espíritos, como doutrina filosófica compreende todas as consequências morais que se depreendem de semelhantes relações.” (O que é o Espiritismo).

Todavia, passados 161 anos da fundação do Espiritismo e 70 da proclamação da DUDH, estamos vivendo etapas sombrias na área política e social, não só no Brasil mas em várias outras nações da Terra.

São tempos de ameaça aos direitos essenciais do cidadão, principalmente em sua liberdade de ser e de se expressar, bem como aos direitos trabalhistas, de segurança e de igualdade.
Muitos chegam a dizer que perderam a fé numa sociedade justa e igualitária, de respeito e ética frente à diversidade étnica, cultural, social e religiosa. Há uma exacerbação à intolerância e ao ódio pelo diferente. Em muitos países o recrudescimento das ameaças terroristas nos fazem tremer nas bases.
Jaci Regis afirma em seu livro Do Homem e do Mundo: “O que temos visto no desdobramento social no planeta Terra é a sucessão de indivíduos, sistemas e instituições de fundamentos religiosos que, em determinadas épocas do processo, passam a representar Deus, a falar em seu nome e a decidir relativamente ao aspecto moral da vida... líderes que acreditaram que possuíam não apenas o conhecimento da lei divina, como um canal exclusivo de comunicação com o Criador. Com esses instrumentos, ditaram normas, códigos de conduta. Com o tempo, a semente lançada se multiplica e nem sempre muito nobremente. Institucionalizadas, as crenças cuidam de mitificar seus reveladores, deslocando-os para o olimpo celeste... Quando se tornam maioria, impõem as regras morais, discriminando o certo e o errado, o bem e o mal.”
E fica então a dúvida: chegaremos algum dia à perfeição (relativa) preconizada pelos espíritos? Pelo visto, vai demorar muito...
Enfim, sabemos que o progresso é lento e que não é simultâneo, cada um avança a seu tempo. Sabemos, também, que o progresso moral nem sempre acompanha o progresso intelectual.
Só nos resta, então, ficar alertas para suplantarmos as dificuldades atuais e não nos deixarmos influenciar pelas ondas de ódio, revolta, receio e desânimo que nos rodeiam, atinando com o que nos diz Eugenio Lara, em seu livro Breve Ensaio sobre o Humanismo Espírita: “O Humanismo Espírita ou Kardecista se concretiza na evolução intelecto-moral dos seres e das coisas, no incessante desenvolvimento do ser humano. É por isso que o pensamento espírita não se coaduna com sistemas que visem a desvalorização do elemento humano, sejam eles religiosos, políticos ou econômicos. O ser humano deve sempre emergir e ser o protagonista de qualquer projeto que objetive a transformação social. As ideias e os ideais não estão acima das pessoas. A ideia, seja ela qual for, existe para o ser humano e não o inverso.”
                                                                                          Delma Crotti é aposentada, reside em Santos.