quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Entrevista com Jaci Régis - Blog Observador Espírita

Texto obtido no blog – Observador Espírita de Delmo Duque dos Santos autor do livro Nova História do Espiritismo. A ele Jaci deu uma entrevista por telefone em 2010, que aqui publicamos inteiramente.

“Para os novos simpatizantes e pesquisadores do Espiritismo, o psicólogo e escritor Jaci Régis realmente não dispensa apresentações. Ativista histórico, começou no movimento espírita liderando a mocidade Estudantes da Verdade, cuja primeira empreitada foi mudar o nome da casa que frequentavam: saiu o Centro Beneficente Evangélico e nasceu o Centro Espírita Allan Kardec, até hoje em funcionamento. Jornalista sindicalizado, editou durante muitos anos o periódico Espiritismo e Unificação, mudado nos anos 1980 para o provocativo nome “Abertura”. Criado na onda da redemocratização do País, o jornal continua ativo e sempre aberto aos novos articulistas. ... Sua trajetória jamais deixará de ser associada ao chamado Grupo de Santos, formado por pensadores de vários lugares do Brasil e da América Latina que enxergam o Espiritismo de uma forma bem diferente daquilo que é praticado pela maioria dos espíritas. É o espiritismo laico, não religioso, voltado para as questões sociais e cotidianas e não somente para os problemas espirituais. Só esses dois adjetivos são suficientes para avaliar as repercussões e o incômodo que ele causa entre os espíritas tradicionais.

Mas Jaci não é nada daquilo que pintam sobre ele, sobretudo o líder radical e intolerante desenhado pelos que se sentem inseguros e impotentes diante de suas idéias e da coragem de divergir da maioria. É uma pessoa fraterna, muito franca, bem-humorada, sensível, enfim, um típico espírita que convence mais pela forma como age do que propriamente pelo que pensa. Ele sua esposa Palmira , com a ajuda dos filhos e de alguns amigos, dirigem há muitos anos o Lar Veneranda e mais recentemente o Instituto Cultural Kardecista , dois espaços muito conhecidos em Santos. O Lar é uma típica obra social espírita, da qual Jaci sempre diz que é simples obrigação de cidadão: “Não me sinto nada caridoso fazendo isso”. Já o ICKS é trabalho de prazer e combate ideológico, espaço de cultura, de agitação e realização de eventos, principalmente o Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita.Também nos concedeu uma interessante entrevista sobre todas essas coisas a seu respeito e também sobre a sua última novidade. ”

OE - A religião continua sendo um equívoco dentro do movimento espírita? 

JR - Sem dúvida. Na medida e que o Espiritismo se torna uma religião, perde a flexibilidade evolutiva que lhe caracteriza a estrutura criada por Allan Kardec. A religião, por definição, apóia-se em verdades absolutas e por afirmações dogmáticas. 

OE- Por que os espíritas têm tanta dificuldade para romper com os laços religiosos e cultivar uma religiosidade mais natural? 

JR - Devemos ter em mente que as estruturas religiosas se sedimentaram em nossa mente através das reencarnações. Romper com elas é tarefa de reflexão, meditação, raciocínio e decisão. Isso acontece quando a pessoa consegue superar o medo de ficar desamparada pelo divino e compreende que o divino se manifesta diariamente na vida de todos. 

OE- Você acredita que Kardec estranharia o atual movimento espírita no Brasil? 

JR -Creio que sim, porque a forma como foi desenvolvido o Espiritismo no Brasil contraria a linha que ele adotou na criação da doutrina. 

OE- Queiram ou não queiram os antipáticos, o chamado Grupo de Santos formou escola e já entrou para a história do movimento espírita. Como você vê tudo isso? 

JR -O “grupo de Santos” do qual eu fui o principal articulador, teve a coragem, no seu tempo, de apresentar uma visão dinâmica da doutrina em contraposição ao esquema montado por pessoas e Espíritos ligados umbilicalmente ao sentido cristão da vida. 

OE- Você sempre foi muito crítico ao perfil doutrinário da FEB e de outras entidades federativas. Houve alguma mudança na sua opinião? 

JR -A FEB é uma instituição respeitável e lidera a maior parte do movimento espírita. A ela estão ligados os representantes dos centros e federações. Entretanto, desde sua fundação ela seguiu um caminho próprio, diferente do preconizado por Kardec. Esse caminho compreendeu um extremo sentido religioso, místico e até aceitando as teses de Roustaing. Ultimamente se tornou menos inflexível, mas prossegue na sua intenção de liderar o movimento espírita mundial, na feição de corrente evangélico-mediúnica. 

OE- A CEPA é realmente uma alternativa crescente no movimento espírita? 

JR- A CEPA pode se tornar uma alternativa positiva ao Espiritismo mundial, na media que se espalha não apenas na América, mas também na Europa. É numericamente pequena, mas reúne um grupo de espíritas que possui gabarito intelectual para disseminar uma forma de entender o Espiritismo adequado ao progresso e à realidade social. Para isso, contudo, é necessário definir claramente seus objetivos e trabalhar por eles. 

OE- E sobre as práticas espíritas, você considera o passe uma autêntica atividade espírita? 

JR - Hoje em dia se diz aplicação ou transmissão energética, por ser mais adequada ao processo de transmissão de energia humana e magnética. Não se trata de uma prática genuinamente espírita, mas oriunda do magnetismo. Penso que é útil e efetiva quando aplicada de forma consciente e fraterna, sem considerá-la uma panacéia. 

OE- Por que você passou a utilizara expressão “kardecista”, não bastava apenas “espírita”?
JR -Entre as muitas deturpações a que o Espiritismo tem sofrido, incluímos a apropriação de desvio do significado dos termos “espiritismo” e “espírita”. Correntes esotéricas e de base dos cultos africanos se auto denominaram espíritas e as ousadias de dirigentes de centros que se intitulam espíritas criando “doutrinas próprias”, tornou o ambiente confuso, de modo que a palavra “espírita” não significa necessariamente o que Allan Kardec criou. Por isso, acreditamos que a palavra “kardecista” oferece uma apropriada denominação ao esforço que temos feito de reescrever o pensamento de Allan Kardec, adequando-o ao processo evolutivo das idéias e da humanidade. Daí crermos que “kardecista” refere-se mais especificamente ao trabalho original de Allan Kardec, delimitando nosso espaço e definindo nossos propósitos. Certamente jamais a palavra “espírita” será substituída por ter sido criada por Kardec, mas “kardecista” está diretamente ligada ao criador da doutrina. 





OE- Ser kardecista hoje significa ser fiel, sectário e até fanático em algumas situações e agremiações espíritas. O que está acontecendo? 

JR - Ser kardecista é ter conseguido livrar-se dos condicionamentos sectários e ter um novo pensar, dinâmico e reflexivo sobre os problemas humanos, a partir dos enunciados iniciais de Allan Kardec.
OE- Finalmente, o que está desatualizado: Kardec ou o Espiritismo? Kardec é necessariamente sempre sinônimo de Espiritismo? 

JR - Kardec é o criador do Espiritismo. Daí ser a raiz do pensamento espírita agora e sempre. Mas ele deixou claro um caminho de evolução e aperfeiçoamento do corpo doutrinário. Sendo como foi um homem atual, moderno e um pensador sábio, ao constatar que o Espiritismo seria ultrapassado se fosse uma religião ou tentasse ter as respostas absolutas para os problemas da pessoa humana com os conhecimentos de sua época. Por isso, deixou claro que o Espiritismo evoluiria ou morreria. A “morte” do Espiritismo não se dará por desaparecer, mas por perder seu significado progressivo e progressista e quando não puder oferecer ao ser humano uma reflexão cabível e atual sobre si mesmo e seu futuro”.

NR1: Para conhecer o blog Observador Espírita digite: http://observadorespirita.blogspot.com.br/

NR2: Se você quiser conhecer quem foi Jaci Régis: http://icksantos.blogspot.com.br/2011/10/jaci-regis-bibliografia.html?_sm_au_=iMH10HsW67SnZngR 


segunda-feira, 10 de outubro de 2016

continuando....(https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=8190435979242028935#editor/target=post;postID=5706797199672327633;onPublishedMenu=editor;onClosedMenu=editor;postNum=2;src=postname)

Revisitando o Caderno Cultural Espírita - Outubro 2002

O Perispírito
Uma abordagem do século XX

Reinaldo Di Lucia

 A POSIÇãO DO ESPIRITISMO

                         
                         Todas essas crenças de um envoltório, um corpo para a alma de alguma forma influenciaram Kardec quando da elaboração do Livro dos Espíritos, Kardec é informado que o espírito "tem a envolvê-lo uma substância, que é vaporosa para ti, mas bastante grosseira para nós."
                         Sendo um homem de espírito científico, Kardec foi buscar na ciência o nome para tal envoltório, chamando-o de perispírito, à semelhança do perisperma que envolve as sementes dos frutos.
                         As principais idéias desenvolvidas por Kardec sobre o perispírito nada falam sobre a constituição da energia de que é composto, mas atenta  principalmente para suas funções e propriedades. Resume-se no seguinte:
                         O perispírito é o liame que, no homem, liga o Espírito ao corpo físico. Tem por função agir como intermediário entre eles:
                         "O liame ou perispírito que une o corpo e Espírito é uma espécie de invólucro semimaterial. A morte é a destruição do invólucro mais grosseiro, o Espírito conserva o segundo, que constitui para ele um corpo etéreo, invisível para nós no seu estado normal, mas que ele pode tornar acidentalmente visível, e mesmo tangível, como se verifica nos fenomenos de aparição."
                         Tal envoltório é tomado do fluido universal de cada globo, não sendo assim o mesmo em todos os mundos. Quando os Espíritos de mundos superiores vão aos inferiores, revestem-se da matéria própria deste último. Torna qualquer forma, ao arbítrio do Espírito.
                         Vem de Kardec a conceituação de perispírito como um elo intermediário entre
o corpo físico e o espírito, indispensável tanto para fazer o espírito agir sobre o corpo quanto para que aquele receba as impressões experimentadas por este. Esta idéia tomou tal força em todo o movimento espírita brasileiro que, pode-se dizer, é o único motivo que os espíritas acham para a existência do perispírito.


  
                         Mas em nenhum ponto de suas obras Kardec refere-se ao períspirito como algo diferente da matéria. Deve-se lembrar que, para a teoria espírita, o Universo compõe-se única e dualmente de dois princípios básicos: o espírito, inteligente e responsável por todos os fenômenos intelectivos, e a matéria, inerte do ponto de vista da consciência e sujeita
a ação do espírito, responsável pelos fatos orgânicos, inclusive a vida:
                         Dentro deste esquema, o perispírito aparece diretamente ligado a matéria, como um produto da matéria básica, ou, no dizer de Kardec, uma modificação do fluído universal.
                         "Posto que invisível para nós em estado normal, o perispírito não deixa de ser matéria etérea."
                         "Jamais o espiritismo confundiu a alma com o perispírito, que não passa de um invólucro, como o corpo é um outro. Tivesse ela dez envoltórios, isto nada tiraria de sua essência imaterial. "
                         Ainda que matéria, o perispírito é, para Kardec, absolutamente penetrável, isto é, nenhuma matéria lhe oferece obstáculo; ele as atravessa todas, como a luz atravessa os corpos transparentes.
                         Uma segunda função primordial do perispírito, segundo Kardec, é de servir como evidência da manutenção da individualidade para o Espírito desencarnado:
                         "P - Como a alma constata a sua individualidade, se já não tem mais corpo material?
                         R - Tem um fluido que lhe é próprio, que tira da atmosfera do seu planeta e que representa a aparência de sua última encarnação: seu perispírito."
                         Assim é que o espírito, mesmo não possuindo mais o corpo físico, e mesmo estando acostumado a ver-se como uma forma determinada, pode perceber-se existindo, a partir da evidência formal que lhe fornece seu perispírito.
                         Finalmente, uma última função básica do perispírito, conforme Kardec, é a de servir como meio`as manifestações mediúnicas, notadamente àquelas de ordem física, como as materializações, as aparições e os fenômenos de transporte. Isto se deve à propriedade que possui o perispírito de tornar-se tangível, no dizer dos espíritos por "condensação" , e também de somar-se aos fluídos (energias) caracteristicos dos encarnados, possibilitando a movimentação de objetos materiais inertes.
                         Depois de Kardec, muitos pensadores espíritas, desde seus continuadores mais diretos até alguns escritores do final do século XX (encarnados e desencarnados) acrescentaram mais algumas propriedades ao perispírito. Dentre esses, destacam-se, naquilo que interessa a esse estudo: Gabriel Delanne, Hermani Guimarães Andrade e André Luiz.



                         Dentre todos os continuadores do pensamento de Allan Kardec, Delanne é o que maior importância atribui ao perispírito. Provavelmente, isto se dá na medida em que é de grande dificuldade para qualquer pessoa adepta ao positivismo, aceitar que o Espírito, este ser imaterial e, para muitos, puramente abstrato, possa ser o princípio de todas as manifestações intelectivas do homem.
                         Assim, ele vai atribuir ao perispírito uma gama significativa de funções relativas à organização ou mesmo às capacidades inteligentes do ser humano. As principais funções cujas bases são por ele atribuídas ao perispírito são sumariamente descritas abaixo.
                         Primeiramente, temos a formação do corpo físico. Delanne depara-se com o problema de explicar como o corpo físico pode ser formado com tantos detalhes e reconstruído, com a mesma semelhança, sempre que certas partes são destruídas. Lança mão então da explicação perispiritual:
                         "A força vital por si só não bastaria para explicar a forma característica de todos os indivíduos, e tampouco justificaria a hierarquia sistematizada de todos os orgãos, sua sinergia em função de um esforço comum, visto serem eles, simultaneamente, autônomos e solidários. Neste ponto é que incide o ascendente da intervenção do perispírito, ou seja, de um órgão que possua as leis organogenéticas, mantenedoras da fixidez do organismo, através de constantes mutações moleculares. "
                         O perispírito é então, em sua opinião, o modelo fluídico, o molde que servirá para construir o corpo físico. Como veremos, esta também é a opinião de Hermani Guimarães, atualizando o raciocínio a partir de recentes descobertas científicas.

Gabriel Delanne



                         A grande preocupação desse pensador, para atribuir ao perispírito o papel  de molde do corpo está na explicação da forma. Enquanto que ele podia perfeitamente admitir uma força vital primária idêntica para todos os seres vivos, desde a planta até o homem, pressupunha que deveria existir uma outra força que diferenciasse as muitas espécies no que tange `a sua forma. Essa força seria o perispírito.
                         Em segundo lugar, Delanne dá ao perispírito um papel psicológico fundamental. Para ele, o perispírito é a base da memória do homem, a qual, por sua vez, é fundamental para a asseguração contínua de sua identidade.
                         Ele baseia esta opinião sobre a idéia que, mais que qualquer outra célula do corpo humano, as do cérebro são substituídas rapidamente, o que impossibilitaria a manutenção, neste órgão, da memória.
                         "O cérebro, porém, muda perpetuamente, as células dos seus tecidos são incessantemente agitadas, modificadas, destruídas por sensacoes vindas do interior e exterior. Mais do que as outras, essas células submetem-se a uma desagregação rápida e, num periodo assaz curto, sao integralmente substituidas."
                         Partindo do principio acima descrito, o eminente pensador espírita debita ao perispírito a função da memória, ja que esta nao poderia ser unicamente do corpo. Em sua tese, qualquer fato guardado pela memória é registrado no perispírito. Quando uma célula cerebral morre, é substituída por outra formada pelo mesmo perispírito, que lhe imprimirá, qual disco gravado por uma matriz, as mesmas impressões que ele próprio guarda. Fica assim resguardada a memoria.
                         Idéias semelhantes a essas são igualmente defendidas por Leon Denis e Gustave Geley, em vários dos seus livros, o que nos dá a impressão que eram bastante difundidas no meio espirita à época - apesar de nao terem sido defendidas por Kardec em sua obra.
                         A principal tese de Hermani Guimarães sobre o perispírito aproxima-se bastante de algumas daquelas defendidas pelos autores anteriormente citados - a de que este é uma espécie de molde do corpo físico. Entretanto, a base de sua teoria repousa (diferentemente de Delanne) não no problema da reconstrução do organismo, mas na aparente violação do Segundo Princípio da Termodinâmica pela origem e evolução da vida. 
                         O Segundo Princípio da Termodinâmica (ou Lei de Carnot-Clausius) prevê que num sistema termodinamicamente isolado, a quantidade de entropia (ou o grau de desordem do sistema) aumenta continuamente. Ou seja, nestes sistemas, se não houver nenhum tipo de ação organizadora, haverá uma homogeneização cada vez maior dos seus elementos, misturando-se e aumentando a desordem do sistema.
                         Ora, o processo de evolução da vida a partir de elementos nao vivos, aparentemente, é um processo neguentrópico, isto é, em que há diminuição da desordem - o sistema vai se organizando cada vez melhor, desde elementos mais simples (p.e. seres unicelulares) até organismos altamente complexos, como o homem.
                         A conclusão de Hermani Guimarães é que, para que a vida pudesse ter acontecido e continuasse a manter-se e evoluir, é necessária a presença de um elemento organizador. Hermani chama este elemento de MOB (Modelo Organizador Biologico) e postula que este papel seria do perispírito.
                         Assim, para este autor, o perispírito possui um papel de informador, i.e., é o elemento que prove o corpo da informação necessária para sua constituição e desenvolvimento. Assim é que, além de MOB, Hermani chama-o também de domínio informacional histórico, onde a informação provida é acumulada ao longo do tempo - entre muitas encarnações.
                         Pouco acrescentam os espíritos desencarnados sobre o tema. Tanto André Luiz quanto Emmanuel, os mais lidos dentre eles, admitem para o perispírito as mesmas funções de Kardec e Delanne. Emmanuel chega a afirmar que:
                         "O corpo espiritual não retém somente prerrogativa de constituir a fonte da misteriosa força plástica da vida, a qual opera a oxidação orgânica; é também ele a sede das faculdades, dos sentimentos, da inteligência e, sobretudo, o santuário da memória, em que o ser encontra os elementos comprobatórios de sua identidade, através de todas as mutações e transformações da matéria."
                         André Luiz foca a importância do perispírito na origem do corpo físico, bem como na manutenção de sua saúde ou no desenvolvimento de algumas doenças. Para ele, o perispírito, ou corpo espiritual, ou ainda psicossoma, possui células e órgãos que darão origem ao corpo físico:
                         "Todos os órgãos do corpo espiritual, e, consequentemente, do corpo fisico, foram, portanto, construídos com lentidão, atendendo-se à necessidade do campo mental em seu condicionamento e exteriorização no meio terrestre."
                         "Com o transcurso dos evos, surpreendemos as células como princípios inteligentes de feição rudimentar, a serviço do princípio inteligente em estágios mais nobre nos animais superiores e nas criaturas humanas, renovando-se continuamente no corpo fisico e no corpo espiritual, em modulações vibratórias diversas, conforme a situação da inteligência que as senhoreia, depois do berço ou depois do túmulo."
                         Em resumo, as principais ideias sobre o perispírito expostas por estes eminentes pensadores, e ainda hoje bastante difundidas no movimento espírita sao:
  • O perispírito é um envoltório do espírito, que o acompanha desde sua criação, e, portanto, preexistente ao nascimento e sobrevive a morte do corpo fisico.
  • É composto de matéria, porém, em nível diferente daquela a que os encarnados estão acostumados. Kardec afirma ser uma matéria quintessenciada, obtida por modificação, direta do fluido cósmico (que é a matéria primordial), contendo ainda elementos do princípio vital e mesmo de componentes fisicos e electromagneticos.
  • Sua composição energética e tanto mais densa, ou menos sutil, quanto menos evoluído (do ponto de vista intelectual e moral) for o espirito. Com a evolução deste, vai-se tornando mais sutil, ainda que não se saiba ao certo o que isto significa fisicamente, mas sempre acompanha o espírito.
  • É totalmente sujeito `a vontade do espírito, que pode plasmá-lo a seu gosto e dar-lhe a forma que desejar.
  • Serve como elemento de ligação entre o espírito e o corpo fisico, uma vez que um e outro não podem interagir diretamente devido `a diferença estrutural entre ambos.
  • É o elemento que possibilita a manutenção de uma forma para o espírito desencarnado e, assim permite que este possa identificar-se como uma individualidade.
  • É o princípio fundamental das manifestações mediúnicas, em especial daquelas caracterizadas como efeitos físicos.
  • É o molde do corpo fisico, uma forma que conteria os elementos informacionais que permitiriam sua formação e manutenção. Esta função também é a única forma de adequar o surgimento da vida à Segunda Lei da Termodinâmica.
  • É a sede dos sentimentos e das faculdades, notadamente da memória. Por vezes, é apontado como sede da inteligência.
  • Possui órgãos e células, como o corpo físico. Este, aliás, é uma cópia daquele.


     
       


domingo, 9 de outubro de 2016

Força Estranha, paródia espírita - por Alexandre Cardia Machado

Outro dia conversando com um amigo e assinante de nosso jornal, ele me comentava “nossa, como o Abertura ficou político, depois que você assumiu a redação do jornal!” bem, rebati que esta sempre havia sido a conduta do Abertura e que Jaci Régis não deixava passar questões de política que afetassem a todos os brasileiros. Ele sempre buscava dar um enfoque espírita aos fatos, o que normalmente recaía na questão moral.

Meu interlocutor não se deu por satisfeito e reafirmou, “Não. Está mais acalorado!” no que lhe respondi, é que a discussão política está mesmo mais acalorada, em todos os círculos de relacionamento, mas que nosso jornal abre espaço para todos que tratem do assunto, sob a ótica espírita, está no DNA do jornal que, como já afirmamos antes, nasceu na onda da “abertura política” no período final da ditadura militar.

Resolvi, pesquisar e tomei como base as últimas 12 edições do jornal e comparei com as últimas 12 publicações feitas por Régis. O placar foi 18 x 10, ou seja, realmente estamos dando mais importância às questões políticas seis anos depois, contra fatos não há argumentos. Mas qual o porquê disto é que importa? 

Creio que a resposta passa pela mudança que o país sofreu nestes 5 a 6 anos, saímos da “marolinha” e entramos num “tsunami”  econômico, evidentemente que num ambiente deste questões econômicas, políticas e eleitorais ficaram mais acirradas. Nestes seis anos passamos pelo julgamento do mensalão e mais recentemente atingiu a todos a Lava Jato, como exemplo de uma série de operações em andamento pela Polícia Federal. Culminou com a conclusão do Impeachment da Presidente Dilma Rousseff às 13:35 horas do dia 31 de agosto.

Esta é a função de um jornal, interagir com a sociedade, mantendo-se afastado do partidarismo, como deve ser um jornal independente, buscamos ter credibilidade naquilo que é editoriado no jornal, claro que um redator tem pensamento próprio, mas tem o dever de moderá-lo abrindo o espaço ao diálogo, como deve ser a característica do “Homem de Bem” como bem nos ensinaram Kardec e os espíritos que lhe responderam para a elaboração do Livro dos Espíritos.

Kardec, ao tratar das perfeições morais acrescenta uma importante contribuição que cabe bem ao momento, que de certa forma explica a luta pelo quê cada um acredita, e que muitas vezes não paramos para pensar no que realmente nos motiva:

 “ O homem deseja ser feliz e natural é o sentimento que dá orígem a esse desejo. Por isso é que trabalha incessantemente para melhorar a sua posição na Terra, que pesquisa as causas de seus males, para remediá-los. Quando compreender bem que no egoísmo reside uma dessas causas, a que gera o orgulho, a ambição, a cupidez, a inveja, o ódio, o ciúme, que cada momento o magoam, a que perturba todas as relações socias, provoca dissensões, aniqulia a confiança, a que o obriga a se manter constantemente na defensiva contra o seu vizinho, enfim a que do amigo faz inimigo, ele compreenderá também que esse vício é incompatível com a sua felicidadee, podemos mesmo acrescentar, com a sua própria segurança.”

No período mais calmo que vivíamos há 6 anos, contávamos com a presença física de Jaci Régis que produzía combativos editoriais contra os desvios do movimento espírita religioso. Nosso grupo de articulistas não tem buscado esta confrontação, pois se foca mais no rumo que tomamos enquanto sociedade e como espíritas livre-pensadores. É nossa função discutir aspectos da vida social que a tantos afeta.

Por isso uma força nos leva a escrever, por isso uma força nos leva a tratar mais de política, por isso uma força estranha nos mobiliza, por isso é que escrevemos, mas é também por isso que, mesmo tratando disso, deste tereno árido, buscamos manter a harmonia, pois todos nós pensamos de maneira diferente,  como articulistas temos posições distintas. Por isso é que mostramos várias abordagens.
Por isso que completo este artigo publicando a letra da música de Caetano Veloso, que certamente não tem a mesma visão de mundo que eu, mas que busca pelo caminho da poesia atingir o coração de todos nós, por isso é que todos nós buscamos o Sol sobre a estrada.

  • ·         Eu vi um menino correndo /Eu vi o tempo brincando ao redor /Do caminho daquele menino /
  • ·         Eu pus os meus pés no riacho /E acho que nunca os tirei /O sol ainda brilha na estrada e eu nunca passei
  • ·         Eu vi a mulher preparando outra pessoa / O tempo parou pra eu olhar para aquela barriga / A vida é amiga da arte / É a parte que o sol me ensinou /O sol que atravessa essa estrada que nunca passou
  • ·         Por isso uma força me leva a cantar /Por isso essa força estranha /Por isso é que eu canto, não posso parar /Por isso essa voz tamanha
  • ·         Eu vi muitos cabelos brancos na fronte do artista / O tempo não para e no entanto ele nunca envelhece /Aquele que conhece o jogo, do fogo das coisas que são / É o sol, é a estrada, é o tempo, é o pé e é o chão
  • ·         Eu vi muitos homens brigando, ouvi seus gritos / Estive no fundo de cada vontade encoberta /E a coisa mais certa de todas as coisas /Não vale um caminho sob o sol / E o sol sobre a estrada, é o sol sobre a estrada, é o sol


É isso, e por isso que escrevemos.

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Boa Onda - Espiritismo Livre-Pensador - por Alexandre Cardia Machado

Vivemos um ótimo momento no Espiritismo laico e livre pensador brasileiro e internacional. A presidência da CEPA depois de 8 anos retorna ao Brasil, agora sob a égide de Jacira Jacinto da Silva. Já é possível perceber que uma nova equipe de divulgação muito animada começa a por em prática grandes planos de fazer com que as ideias de nosso grupo passem a ser conhecidas pela sociedade. Este grupo se reune desde o Congresso em Rosário, físicamente e virtualmente buscando ferramentas mais modernas de divulgação. Publicaremos os avanços conforme vão se desenvolvendo.



A CEPABrasil e o CPDoc estão divulgando o  lançamento do livro - Perspectivas Contemporâneas da Reencarnação - uma coleção de textos apresentados no XXI Congresso Espírita Pan-Americano de Santos, promovido pela CEPA em 2012, selecionados e coordenados por Ademar Arthur Chioro dos Reis e Ricardo de Morais Nunes e com projeto gráfico de Eugenio Lara. Livro este que fez o seu pré lançamento no XXII Congresso Espírita Pan-Americano de Rosário na Argentina e que agora está sendo lançado em vários eventos no Brasil, o próximo será em Santos, como pode ser visto em detalhes nesta edição do Abertura. Devemos comemorar cada nova iniciativa editorial, pois permite a divulgação e a penetração das raízes espíritas na sociedade.

 Em 2014 tivemos a publicação em espanhol do livro de Jaci Régis - Uma Nova Visão do Homem e do Mundo. Publicado e traduzido em Porto Rico  por José Arroyo, fazendo com que mais ideias brasileiras kardecistas e livre-pensadoras penetrem na América Latina e Espanha.
Neste mês de setembro, estará sendo realizado em Madrid, Espanha o II Congresso Espírita Internacional, organizado pela AIPE – instituição espanhola que está em processo de adesão  à CEPA, estarão participando vários brasileiros e parte da direção da CEPA estará presente. A globalização da CEPA segue a passos largos.  Cabe mensionar o fato de que o XXIII Congresso Espírita-Panamericano deverá ser realizado também na Espanha em 2020.

Ao mesmo tenpo a consistência do grupo de Santos se torna cada vez mais efetiva, nosso grupo já organizou , 14 Simpósios Brasileiros do Pensamento Espírita e  11 Fóruns Espíritas do Livre-Pensar da Baixada Santista. Sendo um núcleo de suporte importante para todo este movimento de expansão de penetração de ideias.

 Ademar Chioro, ex-Ministro da Saúde tem se tornado um importante porta-voz, conseguindo espaços importantes na mídia para a divulgação do Espiritismo. Como, ocorreu, no dia 25 de agosto ao ser entrevistado, pelo surpreendentemente empolgado pelo tema Amaury Jr, na emissora Rede TV.
 A CepaBrasil, além de seu já tradicional blog:  http://cepabrasil.blogspot.com.br/  lançou uma página na internet:  http://www.cepabrasil.org.br/portal/ administrada por  seu Vice Presidente Neventon Vargas com uma gama maior de material disponível, onde destacamos a loja virtual, projeto em desenvolvimento, mas que já conta, neste momento com 24 livros expostos para venda.

Como dizem os nossos “hermanos” – “Una buena onda!” ( Uma boa onda!)

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Revisitando o Caderno Cultural Espírita - Outubro 2002

O PERISPIRITO

UMA ABORDAGEM DO SECULO XX

Reinaldo Di Lucia

                       
                         O propósito deste trabalho é, a partir de um histórico sobre as idéias que levaram ao desenvolvimento do conceito perispírito e da avaliação da evolução do pensamento científico desde  o início do século XX, analisar criticamente os postulados de diversos autores espíritas sobre o tema (encarnados ou desencarnados)e propor um novo modelo teórico, a título de hipótese, para a natureza, formação, propriedades e funções do perispírito.
                         A intenção mais ampla é que uma melhor compreensão sobre este assunto possa clarear alguns outros temas polemicos da doutrina espírita, tais como as emissões energéticas, as curas espirituais e paranormais, as relações entre espíritos encarnados e desencarnados, o problema da obsessão e os diversos generos de comunicações mediúnicas. Propõe-se que inicie-se um debate em todos os setores da comunidadeespírita sobre o tema, visando o fortalecimento dos novos conceitos.
                         O conceito de perispírito foi introduzido por Allan Kardec ao formular a filosofia espírita a partir da observação experimental (fenomenos físicos tais como a materialização) e da afirmação dos espíritos que possuíam um corpo, que lhe permitia identificarem-se como seres individuais que sobreviveram à morte do corpo físico.
                         Essa idéia foi rapidamente assimilada pelos pensadores da época, principalmente por aqueles que assumiram a doutrina espírita, uma vez que respondiam a inúmeras questões que a própria ciência ainda deixava em aberto. Em função disso, muitas funções que deveriam ser atribuídas ao espírito, por serem referentes à inteligencia do ser, o foram ao perispírito.
                         Isto acabou criando um movimento espírita um conjunto de idéias a respeito do tema que, com o avanço do conhecimento científico em campos como os da física, da biologia e da genética, apresentam-se hoje ultrapassados. Ao mesmo tempo, tal conjunto de idéias é usado como suporte para a manutenção de conceitos errôneos sobre as bases filosóficas do espiritismo.

Novos Conceitos da física 

                         É de fundamental importancia que conceitos do campo da física, alguns deles trazidos à luz pela chamada física moderna (desenvolvida após a morte de Kardec) sejam, ainda que superficialmente, compreendidos. Isto porque, de acordo com a teoria que se pretende apresentar neste trabalho, algumas das idéias de Kardec sobre o perispírito podem sofrer sensíveis modificações a partir do desenvolvimento destes conceitos.
                         O primeiro deles é o de energia. No século XX, tornou-se muito difícil prover uma única definição de energia, que seja abrangente e independa do campo de estudo. A definição tradicional, de energia como a capacidade de realizar trabalho, é restrita à parte da física conhecida como Mecânica. Como diz o prof. Alberto Ricardo Präss, "usando apenas a experiência do nosso cotidiano, poderíamos conceituar energia como algo que é capaz de originar mudanças no mundo".
                         Esse conceito é de importância capital para este estudo do perispírito. É importante frisar que, desde que Einstein popularizou a célebre fórmula da inter-relação entre matéria e energia (E = m.c2), o termo energia tornou-se cada vez mais conhecido e empregado, muitas vezes sem a devida atenção à idéia que é expressa por essa palavra.
                         No movimento espírita, o termo energia muitas vezes é empregado para designar uma quantidade qualquer de força que pode, de algum modo, atuar sobre o corpo, o perispírito ou o espírito, para a cura de doenças e outros fenômenos semelhantes.
                         É bastante comum o uso da expressão energias espirituais, que deve ser acompanhado de um grande cuidado: lembrar-se que energia é matéria. Se com essa expressão se quiser denominar um grupo de energias distintas daquelas que são características da matéria mais densa (como, p.ex., o corpo físico), seu uso é possível. Mas, apesar destas energias serem acionadas pela vontade do espírito, que as pode manipular a seu critério, elas não são parte do espírito, não participam de sua essência; enfim, são partes constituintes do princípio material.
                         Para efeito deste trabalho, adotar-se-à a definição descrita acima: energia é alguma coisa capaz de provocar transformações no mundo, seja este o mundo corpóreo ou incorpóreo.
                         Outro conceito físico importante é o de campo. Campo pode ser definido como uma área ao redor do objeto, na qual uma interação eletromagnética ou gravitacional é exercida sobre outros objetos; é o que se poderia chamar de um lugar geométrico. Apesar de o conceito de campo ter sido usado pela primeira vez por Isaac Newton em sua teoria da Gravitação Universal, e já ser empregado por Faraday em meados do século XIX para explicar forças eletromagnéticas, foi com Maxwell, um físico escocês do mesmo século, que o conceito de campo tornou-se fundamental na teoria eletromagnética (com o lançamento do Tratado sobre a eletricidade e o magnetismo, em 1873), tendo sido empregado de modo amplo na física moderna do século XX.
                         A força de um campo, ou seja, a quantidade física medida no espaço ao redor do objeto que lhe dá origem depende fundamentalmente de dois parametros: o valor da quantidade física do objeto e a sua distancia do ponto de medição. No caso de um campo eletromagnético, p.ex., o objeto que origina o campo é uma carga eletromagnética pontual, e a força é tanto maior quanto maior for o valor da carga e tanto menor quanto maior for a distancia dela.



                        Com a comprovação experimental da teoria dos campos, a física percebeu que o termo força, até então usado para definir a ação exercida por um corpo sobre outro era inadequada, uma vez que dá a idéia de um objeto agente (ou seja, aquele que efetivamente exerce a ação, ativo) e um que, inerte, limitar-se-ia a receber esta influencia. O que ocorre na verdade é uma ação recíproca de um corpo sobre o outro. O termo mais empregado hodiernamente é interação, que exprime melhor o conceito físico.
                         Importantes, também, são os conceitos ligados à mecânica ondulatória Um dos modelos pelos quais a energia e a informação são transmitidas de um dado ponto a outro no Universo são as ondas, as quais podem ser representadas no quadro Figura A.


     Figura A


                         O ponto mais alto de uma onda chamada-se crista, e o mais baixo, vale. A distância entre duas cristas consecutivas é chamada de comprimento de onda (Figura 1), e é uma das caracteristicas fundamentais a ondulatória.

                         Juntamente com a frequência, ou seja, o número de cristas por unidade de tempo, e a amplitude, a distância entre uma crista e um vale consecutivos, caracterizam qualquer onda.
                         Matematicamente, a relação entre a frequencia e o comprimento de onda é inversamente proporcional.



                         Os conceitos de frequencia, comprimento de onda e amplitude, aliados aos de energia e campo, serão fundamentais para o entendimento do perispírito em bases científicas atuais.

Histórico de um envoltório da alma

   
                         A crença em uma alma imortal é tão antiga quanto as civilizações humanas. Talvez porque o homem via seus mortos em sonhos, ou porque aparições destes mesmos mortos, mesmo em vigília, acontecessem. O fato é que as idéias absolutamente materialistas da morte como fim de toda a individualidade são bastante recentes, tendo-se firmado apenas na Idade Contemporânea.
                          Este fato é corroborado pelas pesquisas arqueológicas que mostram que, desde o período megalítico (a chamada Idade da Pedra Polida), o homem tinha o costume de sepultar seus mortos com armas e pertences. Posteriormente, as civilizações que deixaram algo escrito confirmam, todas elas, esta conclusão.
                         Tão antiga quanto a crença na alma imortal é a crença na alma imortal é a crença de que esta possui um envoltório, um tipo de "segundo corpo" que, de alguma forma, acompanha-a em sua permanência no além. Em muitas civilizações antigas esta idéia permanece. Entretanto, em algumas delas, este conceito difere frontalmente daquilo que entendemos hoje, por um mero envoltório.
                         Na India, p.ex., o bramanismo fala de um "corpo sutil" chamado suksmasarira. Este corpo, porém, não é um mero envoltório, como se fosse uma "roupa" que seria usada por uma alma. Nesta filosofia, o verdadeiro Eu, que constitui a individualidade, a essência de tudo o que somos ou sabemos, chama-se  atman ou brahma. Este Eu fica envolto pelo corpo sutil (suksmasarira) que é composto pelos elementos pertencentes à esfera mutável da psique,ou seja, os pensamentos, emoções, sentimentos e percepções. Finalmente, há o corpo denso - "nervos e órgãos tangíveis que são os receptáculos e veículos do processo vital manifestado".
                         Como se pode perceber, o conceito de corpo sutil do bramanismo difere essencialmente daquele de perispírito adotado tradicionalmente pela doutrina espírita. Tais conceitos orientais são, via de regra, de muito difícil compreensão pelas mentes ocidentais, razão pela qual, são normalmente deturpados.
                         Também no Egito há registros desse envoltório: O corpo, dizia o egipcio, era habitado por um duplo de nome Ka, e também por uma alma que pousava no corpo como um passarinho na árvore. Todos três - corpo, Ka e alma - sobreviviam à morte, enquanto o cadáver não desaparecesse na dissolução".
                         Segundo Dellane, tais crenças num envoltório da alma permeiam todo o mundo antigo. Na China antiga, Confúcio dizia que "(...) a essência dos Koûci-Chin (espíritos diversos) não pode deixar de manifestar-se sob uma forma qualquer". O Zoroastrismo persa fala dos ferúers que sem serem propriamente um envoltório, posto que possuíam uma certa inteligência independente, estavam, cada um, destinados a um ser humano. A cabala judaica chama de Nephesh o corpo fluídico do princípio pensante. 
                         Na Grécia também disseminava-se a idíea de um envoltório da alma: "O claro gênio dos gregos percebeu a necessidade de um intermediário entre a alma e o corpo. Para explicar a união da alma imaterial com do corpo terrestre, os filósofos da Hélade reconheceram a existencia de uma substância mista, denominada Ochema, que lhe servia de envoltório e que os orácuos denominavam o veículo leve, o corpo luminoso, o carro sutil. Falando daquilo que move a matéria, diz Hipócrates que o movimento é devido a uma força imortal, ignis, a que dá o nome de enormon, ou corpo fluídico".
                         Na mais conhecida Tradição do misticismo que se disseminou no Ocidente, a Teosofia, o homem possui sete corpos: o físico, o astral, o mental, o búdico, o nirvanico, o paranirvânico, e a mahaparanirvânico, cada um com suas atribuições específicas. Alguns ainda descrevem um corpo etérico, que seria o campo vital associado ao corpo físico, e que poderia ser visto pelos clarividentes como uma espécie de aura.
continua.......


                         

sábado, 3 de setembro de 2016

MACHISMO e ESPIRITISMO - por Marissol Castello Branco

MACHISMO
Marissol Castello Branco
“Atitude ou comportamento de quem crê que o homem é socialmente superior à mulher” Os machistas mais radicais, definidos no dicionário são aqueles assumidos publicamente que encontramos estampados pelas feministas. Tivemos várias demonstrações francas de machismo em alguns políticos durante depoimentos polêmicos e preconceituosos.

Kardec era machista, mas de uma forma “branda”, apropriando-me de um termo usado por Noam Chomsky, como muitos homens e mulheres o são ainda hoje. Esse comentário de Kardec deixa bem claro a sua visão sobre a mulher:

“... as mulheres têm direitos incontestáveis, a natureza tem os seus que não são os seus. Deixai-as, pois, reconhecer pela experiência sua insuficiência nas coisas às quais a Providência não as chamou” (AK, RE, jun1867, p.169)

Esse foi um comentário relativo a um artigo sobre um manifesto de mulheres norte-americanas que protestavam pela emancipação feminina. Nessa citação Kardec entende que como homens e mulheres possuem gêneros diferentes também diferentes são as suas funções na Sociedade. Ele era um intelectual, filho de um juiz, com educação exemplar e casado com uma mulher “recatada e do lar”. Não teve filhos, portanto, não vivenciou o papel de ser pai, nem pôde observar sua esposa no papel de ser mãe. A única referência que possuía era de seus pais, mesmo assim uma convivência breve, pois logo foi afastado do lar para estudar em um colégio interno. Não conviveu com mulheres que precisaram trabalhar para conseguir seu próprio sustento. As médiuns mulheres com a qual conviveu e foram intermediárias dos espíritos que o auxiliaram na confecção das obras que fundaram o Espiritismo eram jovens e submissas aos seus pais. Apesar de receberem para o exercício (a mediunidade na França era uma profissão) os proventos ficavam com a família, melhor dizendo com o progenitor. (Eugenio Lara, Os Desertores de Kardec)

Foi no século de Kardec com a difusão das idéias de Rousseau é que o perfil de mãe começou a ser construído. O papel de pai chega bem mais tarde no finalzinho do século XX e até hoje vem sendo construído. Kardec não imaginava que seria uma mulher que o ajudaria a difundir o Espiritismo livre pensador na Espanha e América Latina de fala espanhola. Amália Domingo Soler teve uma vida celibatária e dedicada exclusivamente ao Espiritismo a partir dos 37 anos. Isso a deixou aquém das funções intrínsecas relegadas à mulher pela sociedade. Mesmo assim, ela foi cobrada pelo espírito comunicante, Padre Germano, por sua abdicação em casar-se e formar uma família:

Quanto a ti, boêmio envolto em vestes femininas, poeta de outros tempos, cantor aventureiro que fugiu do lar doméstico, alheio aos direitos e deveres dos grandes sacerdotes do progresso – mendiga hoje um olhar carinhoso, olha em torno de si como nascem as gerações, ao passo que você, planta daninha, não pode beijar uma fronte infantil, murmurando: ― Meu filho! Trabalhe, aprofunde-se em sua solidão, busque na contemplação da Natureza o complemento da sua vida miserável, já que não lhe é dado contemplar um ente querido.” (Memórias de Padre Germano, Amalia Domingo Soler, FEB, p.344)

Amália apenas transcrevia o que dizia o médium psicofônico inconsciente, Eudaldo Pagés. Durante a transcrição ela poderia ter suprimido essa parte em referência às suas vidas, mas era muito fiel ao que ouvia e optou por manter o texto.

Voltando ao machismo brando, infelizmente constato a existência de homens e mulheres nesta categoria em pleno século XXI. Numa rede social uma mulher considerou educar os filhos homens para “proteger” as mulheres. Então eu a contestei: “Devemos educá-los para respeitá-las”. A expressão “proteger” sugere a dependência da mulher em relação ao homem e consequente submissão. Homens e mulheres possuem uma diferenciação genética que se reflete em sua maneira de ver o mundo e comportamentos. Esse X a mais que a mulher tem faz dela um ser humano que age e resolve problemas de uma maneira diversa da do homem. Isso não significa estabelecer funções determinadas para cada um dos gêneros.


Marissol Castello Branco, 48 anos, casada, mãe de 2 filhos, arquiteta e professora. Autora de livro publicado pelo CPDoc: Igualdade de direitos e diferença de funções entre o homem e a mulher. 1997
Os artigos desta coluna baseiam-se em estudos e pesquisas desenvolvidos pelo CPDoc.

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

AMANHÃ VAI SER OUTRO DIA por Ricardo Nunes


Em plena ditadura militar brasileira Chico Buarque corajosamente cantava: “Amanhã vai ser outro dia. Hoje você é quem manda falou tá falado não tem discussão. A minha gente hoje anda falando de lado e olhando pro chão. Você que inventou a tristeza agora tenha a fineza de “desinventar”. Você vai pagar e é dobrado cada lágrima rolada neste meu penar. Apesar de você amanhã há de ser outro dia. Ainda pago pra ver o jardim florescer qual você não queria...”

Bela canção que exprimia o estado de espírito daqueles que desejavam um Brasil melhor com democracia, participação popular, voto direto, direitos sociais, soberania, enfim, todo um conjunto de medidas civilizatórias para um país que desejava ser grande e bom para os seus filhos.

No início da década de 80 tivemos a famosa emenda Dante de Oliveira e a inesquecível, para quem acompanhou, campanha pelas diretas já. Enfim, chegamos a festejada “Nova República” que vinha com gosto de esperança em dias melhores para os brasileiros. Finalmente, entrávamos em um regime democrático. Os anos de chumbo passaram, presidentes e governos se sucederam, e hoje, infelizmente, na contramão da história, o Brasil vive uma tremenda crise política, econômica, social e moral.

A crise política se dá porque vivemos em um momento no qual uma presidenta da República legitimamente eleita por 54 milhões de pessoas, pela maioria dos brasileiros, foi afastada do poder, sob argumentos no mínimo questionáveis.

Crise econômica e social que se espalha com o desemprego, com a inflação, insegurança pública, proliferação de favelas e com o desmantelamento de políticas sociais de amparo aos mais fracos da sociedade.

A crise moral, por sua vez, se estende como uma onda de ódio e sectarismo atingindo os brasileiros. Onda de ódio que faz com que uma prestigiada atriz como Letícia Sabatella, seja ofendida em sua dignidade em plena rua por pessoas furiosas, apenas porque manifestou sua posição política. Crise moral que se expressa em um individualismo feroz, no qual se esquece a dimensão comunitária e social do homem.

Esta crise moral se espalha, ainda, como   um câncer em metástase, por grande parte do Estado brasileiro, em suas diversas instâncias de poder, atinge partidos políticos de variada coloração, bem como, nunca esqueçamos, esta crise atinge também importantes empresas privadas brasileiras, as quais, junto com setores do poder público,  possuem  responsabilidade comum nos acontecimentos de corrupção descarada que atualmente vivemos.

A crise atinge, inclusive, alguns importantes veículos de comunicação, os quais tomaram a feição de partidos políticos, ideologicamente tendenciosos, ao invés de cumprirem seu papel de órgãos de imprensa, na busca de um jornalismo correto na divulgação imparcial dos fatos. Nunca ficou tão evidenciado na história do Brasil moderno o quão complexo e quase “metafísico” é o conceito de “liberdade de imprensa” no cotidiano das redações e grandes grupos de comunicação.

Nos encontramos de fato em um momento de falta de esperança, de não acreditarmos mais em um Brasil que possa efetivamente ser um país democrático, soberano, justo socialmente e garantidor das liberdades.

Acabamos de reler “A Gênese” de Allan Kardec. Nesta obra se observa em seu capítulo final, uma ideia de esperança em relação ao futuro da humanidade, levando em conta os momentos de crise: “Sim, decerto, a humanidade se transforma, como já se transformou noutras épocas, e cada transformação se assinala por uma crise que é, para o gênero humano, o que são, para os indivíduos, as crises de crescimento. Aquelas se tornam, muitas vezes, penosas, dolorosas, e arrebatam consigo as gerações e as instituições, mas, são sempre seguidas de uma fase de progresso material e moral”
É certo que o progresso não é fatal. Ele depende da iniciativa humana. E também há sempre a possibilidade de retrocesso. Não devemos cometer o erro de certos pensadores marxistas, por causa da influência hegeliana, que acreditavam que atingiríamos na história humana uma era final e definitiva de progresso e felicidade. Este “paraíso” terreno não existe e as conquistas do homem e da sociedade devem ser permanentemente e cuidadosamente defendidas para não sucumbirem.

Porém, o progresso do homem e da sociedade é possível, diz ainda um trecho da referida obra de Kardec sobre as limitações ao desenvolvimento da humanidade: “o progresso intelectual realizado até o presente, nas mais largas proporções, constitui um grande passo e marca uma primeira fase no avanço geral da humanidade; impotente, porém, ele é para regenerá-la. Enquanto o orgulho e o egoísmo o dominarem, o homem se servirá da sua inteligência e dos seus conhecimentos para satisfazer às suas paixões e aos seus interesses pessoais, razão por que os aplica em aperfeiçoar os meios de prejudicar os seus semelhantes e de os destruir.”

O raciocínio acima exposto é uma verdade cristalina, pois há muita gente inteligente que usa a sua inteligência para o mal, para o egoísmo, para a discriminação do outro, para a opressão, para a exclusão da alteridade, e como diz muito bem o texto, até para “destruir” o semelhante. A condição moral individual influencia poderosamente nas atividades de caráter coletivo, na vida do homem em sociedade, independentemente das diversas tendências partidárias, ideológicas, religiosas etc.

Ante tudo isso pensamos na música de Chico Buarque e em nossa convicção espírita. De fato, devemos acreditar sempre que um mundo melhor ainda está por vir. Que estamos a caminho, apesar de todos os tropeços. Devemos crer com todas as forças de nossa alma que um outro mundo é possível. O espiritismo fala em melhoria da humanidade. É de fato de um otimismo incrível. Se podemos atingir uma humanidade melhor, de certo podemos conquistar um país melhor.

Deste modo convidamos a todos a cantar, neste complicado momento histórico de nosso país, mesmo que em voz baixa em sussurros para si mesmo, como uma prece, a canção do grande Chico Buarque.  Ela vai nos ajudar a lidar com a tristeza e o desencanto de um país que vem patinando há tanto tempo sem encontrar um caminho justo e adequado à felicidade de todos os brasileiros.

Um país que passou por séculos de escravidão, de subordinação a uma potência colonial estrangeira, episódios históricos que marcaram profundamente a cultura, a mentalidade e as condições sócio-econômicas do povo brasileiro. Um país em que ainda se encontra enraizada a discriminação em relação a mulher, ao homossexual, ao negro, ao nordestino, ao pobre. Um país no qual ainda não existe uma democracia plena, incentivadora da participação dos amplos setores da sociedade nas decisões do governo, pois o direito ao voto é apenas o mínimo fundamental que deve ser conquistado, respeitado e defendido em uma democracia.

 Um país que ainda não alcançou nem mesmo as conquistas ideológicas da velha revolução francesa, tamanha a cultura elitista que ainda existe entre nós, que faz com que os cidadãos brasileiros se dividam, na mente de alguns poderosos, entre aquela minoria privilegiada e merecedora de todas as benesses, e aquela grande maioria que deve ser reprimida e excluída dos bens fundamentais da vida. Existe ainda quem pense em nosso país com a mentalidade segregacionista da casa grande e da senzala. Infelizmente, ainda estamos bem distantes do conceito de cidadania tão difundido na revolução da pátria de Kardec. Revolução que pleiteava a liberdade, a igualdade e a fraternidade.
 Grande Chico Buarque! Que possamos cantar de novo a tua canção para alimentar nossa alma de esperança e fé em dias melhores para os brasileiros.

  Amanhã vai ser outro dia...

P.S.: O clima político no Brasil anda tão ruim que é necessário fazer alguns esclarecimentos. Não sou defensor e nem filiado a partido algum. Sou apenas um cidadão brasileiro, espírita, livre-pensador, que reivindica para si o direito de pensar livremente e expor sua opinião, sempre com respeito a opinião diversa. Por outro lado, acredito que um jornal espírita importante como Abertura não pode e não deve passar ao largo dos problemas políticos e sociais que vivemos em nosso país. A bem da verdade, devemos reconhecer que o Jornal Abertura tem cumprido o seu papel de respeito à pluralidade de opiniões de seus articulistas, mesmo em questões controversas. E também não tem se omitido frente as discussões de caráter político e social. Isto enriquece sobremaneira a imprensa espírita.


Ricardo Nunes – Licenciado em Direito – Reside em Santos -SP

NR:Artigo publicado no jornal Abertura em Agosto de 2016