domingo, 12 de fevereiro de 2017

Pau que nasce torto as vezes se endireita - por Alexandre Cardia Machado

Pau  que nasce torto as vezes se endireita

Gostaríamos de falar de uma iniciatva que já conta com 10 anos, trata-se do Prêmio Trip Transformadores – realizado pela Revista Trip, neste ano padrocinada pelo Grupo Boticário junto com outros onze co-patrocinadores. A ideia do prêmio veio de Paulo Lima, Editor – Presidente da revista.

Este Prêmio tem por objetivo identificar, brasileiros capazes de recriar a noção de desenvolvimento humano, transformando a realidade. Isto tem tudo a ver com o Jornal Abertura, onde sempre que possível buscamos chamar a atenção para aqueles que fazem algo de bom pela sociedade, aqules que demonstram o Caráter do Homem (ou Mulher) de Bem.

A revista, em edição especial, impressa em papel reciclado, em seu editorial escreve o que buscamos destacar aqui: “Você acredita no Brasil? Deveria. Por alguns minutos desapegue-se das imagens mal construídas do país que você vive. Esqueça a corrupção de colarinho branco que parece minimizar a honestidade de um povo. Acredite que há mesmo quem tira dinheiro do bolso para ajudar os outros. Conteste com veemência a máxima de que pau que nasce torto nunca se endireita. Quem contou isso para você mentiu.”

Li a revista, num voô entre Porto Alegre e São Paulo, leitura fácil, as pessoas que lá foram reconhecidas são muito diferentes umas das outras, o que elas tem em comum é o fazer acontecer as mudanças, no campo social, na cultura ou na transformação para melhor do mundo ao seu redor.
Escolhi um caso que bem representa o que no Espiritismo chamamos do progresso que o Espírito experimenta em sua encarnação, nunca é tarde para mudar. Ainda que mais raro, é possível sim mudar alguém que está em um presídio, ou que caminhou no mau, por muito tempo, não há uma solução única, mas se oferecermos alternativas, alguns conseguirão melhorar. Jacira Jacinto da Silva, Presidente da CEPA, em seu livro Criminalidade: Educar ou Punir, assim se refere à situações semelhantes a que busco mostrar aqui: “ As lições do espiritismo nos ensinam a enxergar que todas as pessoas, incluíndo as que nasceram e cresceram sem oportunidade, e até mesmo as que cometeram infrações graves à ordem social, têm perspectiva de sucesso, pois fomos criados para aprender e crescer indefinidamente”.

Escreveremos sobre Luiz Alberto Mendes, escritor e colunista da revista Trip, autor de 6 livros, esteve preso por 31 anos no presídio do Carandirú, na cidade de São Paulo, tendo o peso sobre si de pelo menos dois assassinatos. Saiu de casa aos 12 anos, para fugir de um pai alcólatra que batia na esposa e nos filhos, vivendo nas ruas até os 19 anos quando foi preso. Não se importava com nada, não via perspectiva na vida. Assim passou um bom tempo na cadeia, até que veio a epidemia de AIDS, nos anos 80 do século passado, que infestou os presídios.

Luiz relata que não havia profissionais de saúde em número suficiente no Carandirú e por um impulso ele resolveu se importar com aquilo e fazer algo no presídio, foi ajudar no cuidado aos pacientes. Foi quando uma conheceu uma enfermeira travesti que gostava muito de ler. Ali surgiu uma amizade.Ela foi a primeira a lhe mostrar a importância da leitura. 

A transformação foi imediata, do não fazer nada o dia inteiro, passou a ser um leitor voraz, passou a ler 10 horas por dia. Em meio a dor e a agonia do presídio conheceu a obra de Jean Paul Sarte, a quem admira, mas a quem se propõe  discordar, Sarte disse “ O inferno são os outros” ele contesta “ O inferno é a ausência dos outros”. Esta reflexão demonstra que ele foi capaz de perceber que a importância da relação com o outro, perceber a importância da outra pessoa nos humaniza.

O conhecimento melhora a vida, desde que não seja ornamental, ou seja apenas para distração. A leitura tem o potencial de ser um transformador de estrutura mental e por consequência fazer com que passemos da ideia à ação.

Pesquisando um pouco mais encontramos uma entrevista de Luiz Mendes, onde ele explica um pouco melhor como iniciou o interesse pela leitura e a explicação para a frase colocada acima.

O contato começa com uma mulher que trocava conversa comigo por cartas. Essa história tem início bem antes, pois quando fui preso eu não sabia escrever carta direito e um amigo me ensinou a escrevê-la, com rascunho e eu passava a limpo para enviar à minha mãe. Então chegou um momento em que comecei a modificar a carta, porque eram relatos íntimos com minha mãe, até que num ponto comecei a escrever sozinho. Fui escrevendo para outras pessoas também até chegar nessa professora, que morava no Rio de Janeiro, estava se formando em Letras, gostava de literatura e me mandava os livros importantes para eu ler. Os primeiros livros que eu me apaixonei foram os de Érico Veríssimo.”
Este relato, lembra um pouco o que descrevem os romances espíritas, onde as palavras de amor, e de esclarecimento, abrem um espaço na mente do espírito, por onde o amor penetra. Não foi bem assim com Luiz, demorou um bom tempo, em suas próprias palavras, já bem mais maduro afirma, “não foram os livros que me salvaram, mas as pessoas que me enviram os livros”. Esta frase denota toda uma perspectiva filosófica e não mítica de Luiz. 

Em algum momento a ação transformadora da leitura, transformou Luiz em um ser moral que se preocupa com o bem estar e os direitos dos outros.

Luiz Mendes hoje dá palestras, ajuda com seus livros outras pessoas a sair da marginalidade, ele não é espírita, o texto não tem nenhuma referência a religião, pela proximidade com Sarte, tudo leva a crer que seja materialista. Mas seja como for o Espírito tem em si mesmo o impulso do progresso e mais uma vez parafrasiando Sarte “ Liberdade é o que você faz com aquilo que aconteceu com você”.

 A lei do progresso é de ação permanente pois sempre queremos, ou almejamos algo a mais para nós mesmos ou para a nossa sociedade.


quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Papel do Perispírito na gestação - II por Jaci Régis

continuando...

Papel do Perispírito na Gestação

Jaci Régis

(publicado no Caderno Cultural Espírita/outubro 2002)

                   O Espírito




                              Encontramos no Livro dos Espíritos informações vagas sobre a natureza do Espírito. Isso é perfeitamente compreensível porque não há forma gramatical ou explicação cientificamente compreensível sobre a complexa ou, quem sabe, simples constituição do ser.
                              A palavra "espírito" (com letra minúscula) é inicialmente empregada para designar o princípio inteligente do universo em contraposição ao princípio material. O Livro faz uma série de ponderações sobre a interação entre esses dois elementos, cabendo a Kardec dizer que "a matéria é o agente, o intermediário, com a ajuda da qual e sobre a qual o espírito atua".
                              Depois, a palavra "Espírito (com letra maiúscula) foi usada para designar "os seres inteligentes da Criação" ou seja, para a individualização do princípio inteligente.
                              Na tentativa de explicar a forma do Espírito, temos alguns itens de grande significação:
                              ... Os Espíritos são imateriais?
                              - Imaterial não é o termo apropriado, incorpóreo seria mais exato... É uma matéria quintessenciada... Tão eterizada, que nao pode ser percebida pelos vossos sentidos.
                              ... Os Espíritos têm uma forma determinada, limitada e constante?
                              - Eles são, se o quiserdes, uma flama, um clarão, uma centelha etérea.
                              Segundo a Doutrina, esse Espírito ao ser criado é um princípio espiritual, que se tornará um "Espírito" ao desenvolver a inteligência e a efetividade, capaz de perceber-se como um ser, numa espiral evolutiva.
                              Uma das mais significativas e inéditas contribuições do pensamento espírita refere-se a sua teoria da evolução do Espírito. De acordo com essa teoria, "o ser inteligente do universo é criado por Deus, como um princípio espiritual, "simples e ignorante". Isto é, um ser potencial, estruturalmente vazio. A potencialidade está contida na possibilidade de expansão e aquisição de experiências, movida por uma forma de energia oriunda de sua natureza permanente, imortal.
                              Essas informações nos levam a ponderar que, em si mesmo, o Espírito não possui organização, sendo um núcleo incorpóreo, potencialmente expansível, dispondo de uma energia intrínseca, propulsora e determinada, sintetizada no instinto de conservação e de uma capacidade potencial de apreensão e reelaboração de experiências.
                              Dentro desse enfoque, o estudo do ser deverá ser feito em dois momentos:
                              O período pré-humano, como tempo de estruturação básica da individualidade.
                              O período de sua inserção no nível humano, onde estrutura uma personalidade mutante.
                              O período pré-humano caracteriza-se, a partir do instinto de conservação ou agressividade natural, como o da aquisição de conteúdos de experiência. Nele, o princípio espiritual nao tem consciência de si mesmo e não possui nenhuma estrutura básica de percepção ou seleção. Na verdade, parece compreensível que a busca incessante de auto-preservação, como elemento básico de perpetuação, seja o desencadeante do processo evolutivo, pois dentro desse impulso inato do ser embrionário esboça  o esforço de construir condições de manter-se íntegro.
                              Em consequência, desencadeia também um complexo, amplo e infindável processo de relações com o meio ambiente e com semelhantes, estabelecendo as bases futuras da consciência.

O corpo mental

                              Já vimos que o princípio espiritual não possui estrutura, pelo menos inicialmente. Todavia, interagindo com os elementos orgânicos, ele vai desenvolvendo uma estrutura psíquica, que chamo, por analogia, de corpo energético e psíquico que o princípio espiritual vai estruturando um sistema mental flexível.
                              Como diz André Luiz, é nesse espaço que vão sendo inscritos "os princípios ontogenéticos" que a experiência repetitiva e incessante vai consolidando, no processo constante de nascer, viver, morrer e renascer. Aí ele estrutura a memória e seleciona as experiências vividas.
                              Ao longo do tempo, construindo, reconstruindo e armazenando as experiências, o princípio espiritual começa a adquirir consciência crescente de si mesmo. Torna-se um Espírito. O corpo mental é, então, seu instrumento de recriação constante nos processos vivenciais repetitivos de vida e morte física ampliando cada vez mais a conscientização de si mesmo e do usufruto dos resultados acumulados das experiências e vivências. E é no corpo mental que ele inscreve e consolida, refunde e recicla suas impressões e aprendizado.
                              Referindo-se ao corpo mental, assim afirma André Luiz "O corpo mental, assinalado experimentalmente por diversos estudiosos, é o envoltório sutil da mente". Estudando os efeitos do monoideísmo que leva `a perda do perispírito, André Luiz diz o seguinte: "cabendo-nos notar que essa forma (ovóide), segundo a nossa maneira atual de percepção, expressa o corpo mental da individualidade, ao encerrar consigo, conforme os princípios ontogenéticos da Criação Divina, todos os órgãos virtuais de exteriorização da alma, nos círculos terrestres e espirituais, assim como ovo, aparentemente simples, guarda hoje a ave poderosa de amanhã ou como a semente minúscula, que conserva nos tecidos embrionários a árvore vigorosa em que se transformará no porvir (...)" (in Evolução em Dois Mundos, Capitulo II - Corpo Espiritual, pags. 25, 91, primeira edição, FEB, 1959).
                              Temos, pois uma descrição possível do corpo mental, como um corpo sutil, de forma ovóide em torno do Espírito, guardando os órgãos de exteriorização da alma. Nessa conjugação mente-espiritual reside a expressão da individualidade.
                              Embora enfatizando o perispírito como centro virtual da organização física, André Luiz, mostra-o, todavia, precário, transitório, dependendo do desempenho mental para manter-se íntegro após a morte, principalmente nos primórdios da evolução e, depois, devido a processos doentios de concentração emocional.
                              Eis o que ele diz: "Pela compreensão progressiva entre as criaturas, por intermédio da palavra que assegura o pronto intercâmbio, fundamenta-se no cérebro o pensamento contínuo e, por semelhante maravilha  da alma, as idéias-relâmpagos ou as idéias-fragmentos da crisálida de consciência, no reino animal, se transformam em conceitos, inquirições, traduzindo desejos e idéias alentadas, substância íntima". Nesse processo evolutivo, informa ele, "vamos encontrar o homem infraprimitivo, na rusticidade da furna em, que se esconde, surpreendido no fenômeno da morte, ante a glória da vida, como criança tenra e deslumbrada à frente de paisagem maravilhosa, cuja grandeza, nem de leve, pode ainda compreender.
                              O pensamento constante ofereceu-lhe a precisa estabilidade para a metamorfose completa... Entretanto, o homem selvagem, que se reconhece dominador na hierarquia animal, cruel habitante da floresta, que apura a inteligência, através da força e da astúcia, na escravidão dos seres inferiores que se lhe avizinham da caverna, desperta fora do corpo denso, qual menino aterrado que, em se sentindo incapaz da separação para arrostar o desconhecido, permanece tímido, ao pé dos seus, em cuja  companhia passa a viver, noutras condições vibratórias, em processos multifários de simbiose, ansioso por retomar a vida física que lhe sugere a imaginação como sendo a única abordável à própria mente...
                              Ressurgir na própria taba e renascer na carne, cujas exalações lhe magnetizam a alma, constituem aspiração incessante do selvagem desencarnado... Pela oclusão de estímulos outros, os órgãos do corpo espiritual se retraem ou se atrofiam, por ausência de função, e se voltam, instintivamente, para a sede do governo mental, onde se localizam, ocultos e definhados no fulcro de pensamentos em circuito fechado sobre si mesmos, quais implementos potenciais do germe vivo entre as paredes do ovo. Nesse período, afirmamos habitualmente que o desencarnado perdeu o seu corpo espiritual, transubstanciado-se num corpo ovóide..." (in Evolução em Dois Mundos, pág. 76, 88 a 91, primeira edição, FEB, 1959).
                              Fizemos essa longa transcrição, para mostrar que o Espírito André Luiz, nos informa que o corpo mental é o único instrumento organizado aderido ao Espírito, como órgão executor e permanente. Daí ter uma forma ovóide, como sinal de concentração em torno do polo central da Inteligencia Espiritual.
                              Verificamos, por essas informações, que perdendo o perispírito por deficiência do interesse e dificuldade em permanecer consciente, o Espírito concentra-se no seu corpo mental, onde provavelmente se instala a mente ou projeção constitucional do Espírito, sede da memória permanente e reduto de todas as experiências de seu processo evolutivo.

Uma reflexão sobre este texto foi publicada no Jornal Abertura de novembro de 2019.

Baixe aqui:



sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

A poética das vidas intinerantes - Por Ciro Pirondi

A Poética das Vidas Itinerantes


Ciro Pirondi*


O olhar estético sobre a existência comumente é associado à dimensão do desnecessário, do supérfluo. Nosso comprometimento com a lógica, com a razão, ensinou-nos a ver na estética, no belo, seus contrários. “Não precisa ser belo, deve funcionar...”, frase comum de ouvirmos no cotidiano das pessoas.

Ciro Pirondi


A “eficiência” toma conta do mundo, do Homem Máquina, razão, capaz de entender tudo, construir máquinas cada vez mais perfeitas, em uma sociedade comprometida com a produção em série, com o desespero pelo consumo priorizando o crescimento econômico. Tratamos cada vez mais a educação como se seu objetivo principal fosse ensinar os alunos a serem economicamente produtivos, ao invés de ensiná-los a raciocinar criticamente e a se tornarem cidadãos instruídos e compreensivos. A perda dessas capacidades básicas põe em risco a saúde das democracias e a esperança de um mundo decente. Somos uma máquina de ansiedade, ligada no automático, em uma sociedade desorientada.
O homem máquina é consequência de um sistema de valores baseado no lucro e no sucesso individual. O trabalho, via de regra, é punitivo e a insegurança consome nossas energias.
Nesse contexto da máquina como espelho, não podemos admitir o erro com um olhar acolhedor, e entender que falhar nos ajuda a crescer e construir um caminho com múltiplas possibilidades. Difícil pensar assim em uma sociedade na qual a palavra de ordem é eficiência. Somos uma engrenagem constituída para produzir sem reflexão, sem questionar. Esquecemos do velho provérbio indiano sobre a transformação: “A nuvem bebe água salgada e chove água doce”.

Livreto distribuído pelo autor no XIV SBPE


Estamos com o botão da reflexão crítica desligado.

Esse estado de cegueira está nos levando a desconfiar do futuro; no entanto, o mundo só melhorou. A média de longevidade ampliou-se muito; as tecnologias diminuíram o trabalho braçal; os meios de comunicação encurtaram a distância entre os homens; pensamos com muita seriedade na possibilidade de construirmos cidades e civilizações em outros planetas.

Habitar o universo.

Contraditoriamente, no entanto, não diminuímos a distância entre ricos e pobres; marginalizamos as mulheres; praticamos chacinas como as de Osasco; discriminamos as minorias; o poder está nas mãos de incapazes...

A aflição de nossa solidão, como descreve o sublime Garcia Márquez, nos faz continuar buscando nossa Macondo ou com Homero, a eterna travessia de Odisseu (o Ulisses romano), em sua jornada pelos mares revoltos. Vezes em lugares mágicos. Vezes em situações terríveis, a nos mostrar ser mais importante na travessia da vida, não onde vamos chegar ao final, mas a maneira como seguimos por ela.

Se optarmos por seguir como máquinas, talvez “a máquina do Mundo”, como no belo poema de Drummond, nos destrua. Mas se amplificarmos as fronteiras do que ainda temos para
descobrir, inventar novas alternativas, com serenidade e sabedoria e entendermos que todo excesso nega o fim proposto, desenhando os caminhos do meio de Buda, não permitindo que o crescimento econômico sirva apenas para destruir a natureza; criar profundas desigualdades, descontentamento e violência entre os desfavorecidos e marginalizados.

O que importa saber é: quais são os ideais políticos, éticos deste homem máquina? Se ele pretende ou ajuda construir uma sociedade justa, humana e compassível?

Penso ser a possibilidade de vidas itinerantes uma alternativa possível.

Fundamento este raciocínio na dimensão de tempo que esta alternativa possibilita. Tempo onde todo o universo flui e se insere; incluso a vida, as fragilidades e sua rapidez.

Como é possível apenas 80 ou 90 anos para aprendermos os conhecimentos já descobertos? Como podemos educar nossos ouvidos e vistas às belezas da música e das artes em apenas 80 anos?

O Espiritismo, como é natural para o período no qual ele surgiu; apostou todas suas reflexões na lei de causa e efeito de maneira cartesiana, ou seja, a toda ação corresponde uma relação direta e imutável, muito ainda influenciada pelo conceito de punição e pecado. E, em um segundo preceito, o da supremacia da razão. Razão pura, Kantiana, crítica e único caminho possível para evoluirmos e encontrarmos a plenitude da vida.

O século XX e XXI nos inundou de outras possibilidades.

Pierre Lévy em seu texto “Inteligência coletiva” afirma: ‘Hoje, o Homo sapiens enfrenta a rápida modificação de seu meio, da qual ele é o agente coletivo, involuntário’. Sugere a via da inteligência coletiva. Tenho a intuição ser este o caminho capaz de produzir novos sistemas de signos, nova forma de organização social, e regulação que nos permitiriam pensar em conjunto.

Nossas forças intelectuais e espirituais multiplicaram nossas imaginações e experiências.

Aprenderíamos, aos poucos, diz o filósofo, a “nos orientar num cosmo em mutação”.

A razão, por si, como pensávamos no século XIX, não basta. A vida é mais bela e complexa. Não cabe em uma lei que pretendia ser totalitária e completa.

Arthur Conan Doyle, por exemplo, um escritor de inteligência iluminada e com uma imaginação invejável, com seu principal personagem - Sherlock Holmes -, chega a afirmar em seu livro “A História do Espiritismo”, que se a reencarnação não fosse uma verdade, precisaria ser inventada para satisfazer a razão. Mesmo um homem de brilho raro como ele, joga tudo na razão.

As reflexões apresentadas aqui no Simpósio Brasileiro do Pensamento Espirita visam compartilhar e apontar a possibilidade de acrescermos a dimensão poética da existência, conjuntamente à razão, à lógica tão valorizada nos meios acadêmicos e espíritas.

Compreendermos e valorizarmos, de verdade, as descobertas artísticas; educarmos nossos ouvidos para percebermos nas sonatas de Mozart tanto valor para o desenvolvimento humano, quanto nas descobertas de Newton ou Einstein; ele mesmo um exímio violinista que afirmava serem elas, as sonatas de Mozart, a expressão mais próxima de sua concepção de desenho do universo.

Se em alguns milênios o Homo habilis tornou-se sapiens, rompeu uma barreira, lançou-se no desconhecido, inventou a Terra, os deuses e o mundo infinito de significação, o que proponho aqui é inventarmos, uma inteligência coletiva, capaz de associar Razão e poética à dimensão das vidas itinerantes. Criarmos uma nova linguagem para o Espiritismo. Este é o nosso principal desafio para este século, cujo resultado não veremos, pois as mudanças de linguagens são obras de gerações.
Mas devemos intuir algo novo. Podemos e desejamos, por pura alegria, contar aos “outros” o quanto é bom e leve sabermos sermos seres projetados no tempo, termos o Universo como nossa casa, e não apenas este pedaço de Terra.

Entendermos de maneira dialética, sabedores desde futuro, ser o presente, tudo o que temos, o mais importante a ser vivido, experimentado. A felicidade não está fora de nós e eu um outro tempo. Com a dimensão poética das vidas itinerantes nos educaremos, onde, com quem e com o que temos hoje.
Em “Emílio ou da Educação”, Rousseau escreve: ‘Cada um perceberá que a própria felicidade realmente não está em si, mas depende de tudo aquilo que o circunda’. Mais tarde, a propósito da felicidade, Marx irá mais longe: ‘A experiência define como felicíssimo o homem que tornou feliz o maior número de outros homens... Se escolhemos na vida uma posição em que possamos melhor operar pela humanidade, nenhum peso nos pode envergar, porque os sacrifícios são para o benefício da humanidade; então, não provaremos uma alegria mesquinha, limitada, egoísta, mas a nossa felicidade pertencerá a milhões de pessoas, as nossas ações viverão silenciosamente, mas para sempre’. (DE MASI, 2014).

Em uma passagem de Fedro, na qual Platão descreve Sócrates que, já ancião e cansado, durante uma abafada tarde de verão se protege num lugar sombreado e aprecia toda a simples fruição que o local oferece: “Ah! Por Hera, que lugar magnífico para se fazer uma pausa! O plátano oferecendo uma sombra maravilhosa! Em plena floração, como está, o lugar não poderia ser mais perfumado. E o fascínio ímpar desta fonte que corre sob o plátano, a frescura da sua água: basta pôr o pé para me assegurar... E diga-me, por gentileza, se o ar puro por aqui se respira não é desejável e extraordinariamente agradável! Clara melodia do versão que faz eco ao coro das cigarras. Mas a mais saborosa dentre essas belezas é este prado, com a natural doçura da sua inclinação, a qual permite, quando nele se deita, que a cabeça fique numa posição perfeitamente confortável” (DE MASI, 2003).
Não concluo, pois é impossível concluir, apenas intuo ser urgente pensarmos associar à tese das vidas itinerantes, além da necessária exploração científica da razão e dos relacionamentos com novas descobertas da neurociência, das pesquisas sobre o cosmo, a educação com os aspectos da poética na construção do Homem espiritual e eterno.

BIBLIOGRAFIA

 DE MASI, Domenico. O futuro chegou – Modelos de vida para uma sociedade desorientada. [tradução Marcelo Costa Sievers]. 1ed. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2014.
 DE MASI, Domenico. Criatividade e grupos criativos. [tradução Léa Manzi e Yadyr Figueiredo]. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.


* Ciro Pirondi é Arquiteto e Urbanista. Graduado em Arquitetura e Urbanismo (1980), possui doutorado (1980/1982), pela Escola Técnica Superior de Arquitetura – Universidade Politécnica de Catalunya – Barcelona – Espanha. Diretor da Escola da Cidade – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (SP), desde 2002 até o momento. Conselheiro da Fundação Oscar Niemeyer, Casa de Lúcio Costa, Instituto de Arquitetos do Brasil e do IBAC (Instituto Brasileiro de Arte e Cultura). Escritório próprio desde 1983 (Ciro Pirondi Arquitetos Associados).

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

15° SBPE - INCRIÇÕES ENCERRADAS

15° SBPE – Simpósio Brasilerio do Pensamento Espírita.

Inscreva-se no 15° SBPE

2 de novembro  a 4 de novembro de 2017

Santos – SP


ICKS – Instituto Cultural Kardecista de Santos

INSCRIÇÕES ENCERRADAS


15° SBPE – Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita

Será realizarado em Santos, na antiga sede do ICKS, hoje Colégio Angelus Domus, na avenida Francisco Glicério, 261, Bairro do Gonzaga em frente ao Mendes Convention Center.

Como se inscrever

Preencha a ficha abaixo e encaminhe ao ICKS pelo correio, endereço Rua Evaristo da Veiga, 211 Santos –SP  - CEP 11075-001 ou escaneie e envie por email, ao ickardecista1@terra.com.br. Ou então ligue no (13) 33247321.

Nome:............................................................................................
Cidade:..........................................................................................
Tipo de Inscrição: ( ) A vista ou ( ) Número de parcelas
E.mail e telefone...........................................................................


Entre em contato com o  ICKS  por email para ickardecista1@terra.com.br .

O valor dé R$ 120,00 que pode ser parcelado em até 3 vezes, desde que inicie o parcelamento até 15 de agosto de 2017, com a secretaria do ICKS.

  
Hospedagem 

Não estaremos provendo este serviço, Santos possui uma grande malha hoteleira e a contratação de hospedagem por aplicativos hoje se mostra muito mais vantajosa, conforme opinião externada por nossos frequentadores nos eventos anteriores.

Atenção: o evento ocorrerá num feriado prolongado, assim antecipem as suas ações de hospedagem.

Trabalhos:
Para apresentar o seu trabalho, você precisa primeiro enviar uma sinópse, de no máximo 1 página, descrevendo o trabalho a ser apresentado e também um pequeno currículo seu. A sinópse deverá ser enviada por email até o dia 30 de Junho de 2017, para apresentar o trabalho você deverá se inscrever no Simpósio.

Até o dia 15 de Julho a Comissão Organizadora, confirmará a aceitação dos trabalhos. 

Você terá então, até o dia 15 de setembro de 2017 para enviar o trabalho completo, com no máximo 20 páginas, letra Arial, tamanho 12. Seu trabalho fará parte do CD do 15° SBPE que é distribuído aos incritos.

Apresentação:

Todos os trabalhos selecionados, deverão ser apresentados por seu autor, sendo considerado 30 minutos para apresentação, seguido de um período de perguntas de 10 minutos. Prepare já o seu trabalho e venha apresentá-lo no 15° SBPE.


Repasse este link aos seus amigos:


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segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Papel do Perispírito na Gestação de Jaci Régis

Papel do Perispírito na Gestação

Jaci Régis

 (publicado no Caderno Cultural Espírita/outubro 2002)

                              Uma das contribuições do Espiritismo na tentativa de compreender o complexo físico-espiritual, que é o ser humano, foi a descoberta do perispírito. Envoltório do Espírito, ele acrescenta ao ser humano uma nova dimensão, passando este ser formado de Espírito, perispírito e corpo.



                              As especulações sobre o objeto da existência terrena, levou a considerações teológicas sobre a encarnação do Espírito, considerada situação pelo menos constrangedora para o ser. Daí a considerar-se o organismo como obstáculo, um empecilho à sua livre manifestação.
                              Diante da inexistencia de um conhecimento mais amplo sobre a natureza do organismo e dos processos genéticos, aliado ao conceito da prevalência do elemento espiritual sobre o físico, houve a tendência tornar o corpo humano mera expressão do Espírito.
                              A existência do perispírito, ainda que sem maiores detalhes de sua constituição, criou a perspectiva de que ele tinha funções de modelagem e consistência das estruturas moleculares. Muitos teóricos espíritas viram nesse corpo energetico, a matriz biológica do organismo, considerando que o perispírito seria uma espécie de molde pré-existente, fruto da elaboração evolutiva e das necessidades afetivas do reencarnante, ao qual as células iriam aglutinar-se, de modo a compor um tipo específico, respeitados os princípios básico da herança dos pais.
                              Os avanços da genética tem descortinado outro horizonte. O próprio Livro dos Espíritos, embora enfatizando a prevalência do Espírito no conjunto, jamais menosprezou a importância do organismo. Chega a afirmar que o desenvolvimento do feto, no seio materno, independia da existência do Espírito. Indica, conforme a questão 356, que pode haver todo o processo procriativo sem que haja um Espírito em reencarnação, nascendo, todavia, o feto morto.
                              Vivemos um tempo em que as pesquisas e experiências do campo da genética vêm demonstrando um quadro de avanços e conhecimentos extraordinários, penetrando do imo do processo de procriação.
                              Nesse novo quadro, as especificações e atribuições dadas ao perispírito parecem não mais corresponder às expectativas teóricas.
                              Nosso propósito é discutir uma proposta sobre o papel do perispirito na gestação, da forma mais equilibrada e autêntica possível.
                              Trata-se, contudo, de uma discussão teórica, uma hipótese de trabalho, que embora alicerçada no momento da ciência sobre as funções da transmissão da herança genética, é ainda uma tentativa de compreender a inserção do elemento espiritual no processos naturais, uma vez que não é possível apresentar provas inconcussas e experimentais da nossa proposta.
                              Vamos apresentar idéias do que se sabe ou se presume serem aceitáveis sobre o Espírito, o corpo mental e o perispírito, com enfoque sobre a existencia deste último no processo gestatório.

O Perispírito

                              Allan Kardec ao afirmar a existência do perispírito, identico ao corpo fisico, definiu-o como o envoltório do Espírito.
                              Como não é possível imaginar o Espírito sem o corpo, seja encarnado ou desencarnado, é lógico supor que o perispírito é permanente. Ou seja, no nosso nível humano, o ser espiritual identifica-se, no espaço extrafísico, com um corpo idêntico ao que possuía enquanto encarnado, sucessivamente.
                              Isso, porém, não significa que seja sempre o mesmo perispírito. Ao contrário, sabemos que em cada encarnação há a desintegração e a reconstrução desse corpo energético, decorrente do processo de germinação e constituição do organismo físico.
                              Dada a impossibilidade, então presumida, da relação direta do Espírito e o corpo físico (Espírito e matéria) atribuiu-se ao perispírito o papel intermediário entre os dois e, ao mesmo tempo, como lugar da memória, inclusive estampada na morfologia corporal, devido à extrema plasticidade do corpo energético.
                              Pensou-se atribuir ao perispírito, além de modelo funcional do organismo fisico, mas também fonte e diretriz de sua morfologia e mesmo de seu funcionamento biológico.
                             Essa idéia tem sido repetida, sob variadas formas desde Delanne até hoje, inclusive André Luiz.

Contestações

                              Estudiosos mais liberais e ligados ao pensamento científico vigente têm procurado contestar as tradicionais informações sobre o papel do perispírito.
                              Os engenheiros Marcelo Coimbra Régis, em trabalho apresentado no IV Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita, em 1995, e Reinaldo di Lucia, no VI Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita, apresentaram interessantes estudos sobre o perispírito.
                               Damos a seguir as principais idéias de Marcelo Coimbra Régis sobre o perispírito remetendo o leitor para a íntegra de seu trabalho publicado no Caderno e aqui no blog do ICKS.
                              "Corpo do Espírito, de estrutura material, composição e estado diferenciado do atualmente registrável e/ou conhecido. Ligação energética entre Espírito (pensante) e corpo (atuante). Ele seria a cópia do corpo humano, mudando a forma de planeta a planeta e de aparência a cada encarnação.
                               Matéria em estado desconhecido, porém sujeita a ação inteligente do Espírito e com capacidade de alterar seu estado natural de forma a tornar-se registrável aos nossos instrumentos (vide fenômenos físicos, ectoplasmia, raps etc).
                              No seu estado natural, responde a ação intencional do elemento inteligente (Espírito) que tal como imã aglutina e mantém sua estabilidade. Analogicamente, o Espírito seria como um foco de atração, tendo ao seu redor a aglutinação da matéria perispirítica, formando o complexo Espírito/perispírito e emanar radiações energéticas, conforme os estados emocionais o Espirito. Portanto o perispirit como o corpo, só existe ligado/aglutinado ao Espírito, não possuindo existência independente.
                               O perispírito tem atuação muito sutil na economia corporal, pois o corpo humano é autônomo em suas funções básicas. Como transmissor das sensações e vontade do Espírito, o perispírito atua principalmente através  do Sistema Nervoso Central, cabendo ao cérebro transformar esses impulsos energéticos em comandos reconhecíveis pelo resto do organismo. Sendo um corpo energético, ele também influencia o rosto do corpo, qual um campo de forças interagindo com as células e tecidos, porém sem comandar diretamente seus movimentos e ações."
                              Transcreveremos, agora, sinteticamente, as posições de Reinaldo di Lucia.
                              "A matéria que compõe o perispírito é perfeitamente integrada com a matéria densa, podendo assim interagir com partes dela. Da mesma forma, por ser muito mais sutil, é perfeitamente suscetível de ação direta pelo Espírito, que pode mudá-la segundo sua vontade.
                               O Espirito age como se fosse uma carga. Tal como uma carga elétrica cria em torno de si um campo eletromagnético, o Espírito cria em torno de si um campo, que, `a falta de nome melhor, poderia ser chamado de campo espiritual.
                              O perispírito nao seria, então, um corpo, um organismo propriamente falando, mas um aglomerado energético-material em constante interação com o Espírito.
                              Encarnado sob este novo modelo, o perispírito passa a ter propriedades e funções mais adequadas aos conceitos atualmente aceitos pela ciência, sem descaracterizar as funções principais que lhe foram atribuídas por Kardec.
                              Age como individualizador dos Espíritos desencarnados, dando-lhes uma forma que lhes permite, especialmente em estágios menos avançados do processo evolutivo, seguir aprendendo e atuando. Pode ser modificado segundo a vontade do Espírito.
                              Durante a encarnação, age permitindo que o Espírito, consiga uma união perfeita com a matéria mais densa que compõe o corpo físico. Poder-se-ia dizer que, de certa forma, é o intermediário entre o corpo fisico e o Espirito. A diferença é ser um intermediário estruturado como um continuum da própria matéria corporal, sob a forma energética, e não algo completamente diferente dela.
                              Não possui a função de transmissor de sensações do corpo para o Espírito ou de ordens no sentido inverso. Da mesma forma, nao tem nenhuma atuação sobre a memória ou inteligência. Não possui órgãos nem nenhuma constituição semelhante, que são exclusivas do corpo físico.
                              Modifica-se de acordo com as necessidades e capacidades do Espírito, mas não obrigatoriamente em mundos distintos (há de se verificar as questões da isotropia material do Universo)."

     Repensando as funções do perispírito

                              Analisando essas contribuições que se contrapõe ao entendimento tradicional sobre o papel e a formação do perispírito, que nas obras de André luiz ganha uma feição de organismo com órgãos e funções, em muitos casos semelhantes à do organismo fisico, faremos a reflexão que nos sugere ser compatível com este momento.
                              No nosso entendimento, realmente, o perispírito nao parece ter funções específicas na encarnação e restringe-se no espaço extrafísico ao papel de "capa energética" identificadora do Espírito desencarnado, com a dupla função de permitir a relação com os demais e servir de auto-identificação, uma vez que é na encarnação que o ser espiritual de nosso nível evolutivo encontra a própria imagem.
                              Assim, parece-nos perfeitamente aceitável que o perispírito, não sendo um organismo, não possua órgãos, o que elimina a suposição de que a mente, ou seja, a capacidade intelecto-afetiva do Espírito esteja nele sediada.
                              Isso é pouco provável uma vez que sendo o perispírito uma criação temporária, sucessivamente reconstruída pelo Espírito, nao teria condições de perpetuar a memória, que embora seja uma propriedade intrínseca do Espírito, é instrumentada de forma externa a ele.

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Uma reflexão sobre este texto foi publicada no Jornal Abertura de novembro de 2019.

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quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Bem-vindo, 2017 - por Reinaldo di Lucia

Bem-vindo, 2017

E lá se vai 2016. Ano crítico, com muitos problemas, crises e desilusões. Nestes últimos doze meses, vimos um Brasil com suas feridas mais graves expostas: problemas éticos, políticos e sociais – portanto humanos – aparecendo por todos os lados.

Um ano em que a crise econômica acabou com o emprego, e temos uma situação caótica que, infelizmente, vai perdurar por um bom tempo. Muitos brasileiros viram o ano passar sem que conseguissem renda suficiente par sustentar suas famílias. Um enorme contingente de trabalhadores voltou para a informalidade, e é impressionante o aumento da quantidade de moradores de rua. Em termos de bem-estar social, o retrocesso foi patente.

Foi também um ano de intenso debate político. Mas o que deveria, por si só, ter sido positivo (afinal, só se cresce com a discussão ampla de ideias), acabou tornando-se simplesmente fonte de ataques pessoais. Vimos, mesmo entre espíritas, amigos que jogaram fora um relacionamento de anos pela defesa intransigente e apaixonada de pontos de vista extremados, muitas vezes sem o menor senso crítico.

E terminamos 2016 com mais uma tragédia, criminosa, que acaba com a vida de dezenas de jovens apenas começando suas carreiras. Mais uma vez, a ganância e a irresponsabilidade ditando norma, sobrepondo-se à preocupação com a vida.

Um outro lado também se fez presente, porém. Na última semana tivemos a oportunidade de participar de mais um almoço promovido pela ARS – Ação de Recuperação Social, entidade que atende famílias carentes da periferia de Santos. Apesar de observarmos a presença de poucos conhecidos, pudemos ver que as pessoas que lá estavam tiveram momentos de muita alegria, ao divertirem-se com coisas simples, como as brincadeiras quando do sorteio de prendas simbólicas. Cantavam, batiam palmas, brincavam com os demais – enfim, confraternizavam-se de um modo caloroso, sem afetação, criando um ambiente de fraternidade contagiante.

Pensamos que é com este espírito que devemos entrar em 2017. Proporcionar mais espaços em que seja possível este espírito, abrindo a possibilidade financeira e geográfica de as pessoas participarem, abraçarem-se, afagarem-se, tornando mais leve um ano que, se não promete grande melhoras em ternos econômicos, está aí, em branco, pronto para que escrevamos sua história da maneira que quisermos.

Em 2017 teremos também, novamente, um espaço maravilhoso para estudo e confraternização dos espíritas: mais uma edição do Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita, em Santos, evento que consideramos dos melhores e mais democráticos do movimento. Três dias em que poderemos conversar sobre espiritismo e sentir o carinho do abraço de companheiros que, muitas vezes, levados por essa roda-viva do cotidiano, não vemos há tempos.

Quem sabe não podemos fazer deste o primeiro encontro dos espíritas livre-pensadores 100% transmitido via internet (Skype)? Isto poderia fazer que muitos colegas, impossibilitados de comparecer presencialmente, estivessem ainda assim junto conosco, ampliando essa comunidade de amigos. Que tal, organização?


É, talvez 2017 ainda fique na história de cada um como um grande ano. Só depende de nós.

NR: Texto publicado no ABERTURA de dezembro de 2016

sábado, 21 de janeiro de 2017

Sobre os riscos do desequilíbrio sócio-econômico - por Alexandre Machado

Sobre os riscos do desequilíbrio sócio- econômico


Vivemos num momento de grandes riscos, fundamentalismo religioso, choque entre a riqueza da Europa e América do Norte versus subdesenvolvimento ao sul do Equador.

As cenas reais de milhares de refugiados tentando, primeiro chegar na Europa e depois aos países europeus mais ricos, não parecem esmaecer, ao contrário, não parecem ainda demonstrar ter um fim.

O Espiritismo nos ensina que como Espíritos temos igual potencial para nos desenvolvermos, que as desigualdades se explicam por um lado pelo egoísmo, mas também decorre dos acúmulos de experiências de nossa bagagem rencarnatória. Fatores externos como cultura, religião e avanço social claro tem sua importância.

Estamos abourdando uma das diversas ameaças planetárias; as reações das diversas populações querendo mudanças, algumas buscando o isolamento, como no caso da Grã-Bretanha ou a ameaça Trump, nos Estados Unidos. Trump e sua política segregassionista que assumiu o comando do país mais rico do mundo e também com o maior potencial bélico.

Apesar das cenas ao vivo de barbaridades, se comparado ao que ocorria no mundo apenas há 100 anos atraz, em plena 1ª Guerra Mundial, morrem muito menos pessoas, só que hoje podemos assistir quase ao vivo, na televisão, no celular ou no tablet.

O Espiritismo nos ajuda a pensar que o bem tem mais força que o mal, e que superaremos os grandes desiquilíbrios, passarão ainda muitos anos, mas a força das boas ideias prevalecerá.


NR: Artigo publicado no Jornal ABERTURA em Novembro de 2016, adaptado para a data da publicação no Blog.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

É Hora da Autonomia Individual


" Quando uma ideologia fica bem velhinha , vem morar no Brasil "  ( Millôr Fernandes )


A professora Mara Chiari, quando esteve no ICKS, nos colocou em contato com um pensador polonês de nome Sygmunt Bauman e sua obra Modernidade Líquida. Desencarnou neste janeiro de 2017 esse grande pensador.  Ele aponta com muita propriedade que "Devido à sua preocupação com a eficácia, a administração da vida, a modernidade deixou recuar cada vez mais a consciência moral".

 A corrosão das crenças, instituições e valores já causou muitos danos, diz ele. Localizar o "objetivamente satisfatório" é muito difícil pois exige o crescimento da emancipação individual e as pessoas gostam de padrões e rotinas.

Uma coisa é certa, o fracasso do socialismo, nas palavras do crítico de literatura, Alfredo Monte (Jornal A Tribuna), não ajudou muito a aspirar um "objetivamente satisfatório" que seja alternativa válida para a sociedade de consumo, onde o capitalismo se apresenta com toda sua força avassaladora. Lembremos que o capitalismo tem pouco apreço, praticamente nenhum, na verdade, na base da pirâmide social.

O melhor caminho é deixar florescer cada vez mais as iniciativas individuais. Com o tempo as pessoas saberão definir melhor suas identidades. Vai doer, pois a ausencia de normas nos angustia na luta do dia a dia.

 Aí sim o Espiritismo é de uma utilidade ímpar, como demonstra Paulo Henrique de Figueiredo na sua obra "Revolução Espírita - A Teoria esquecida de Allan Kardec" (Livro indicado por Jon Aizpurua - vide Jornal Opinião), ao dizer que a doutrina dos Espíritos "defende e fundamenta  uma revolucionária moralidade descoberta na era moderna, a autonomia moral ou o autogoverno". Segundo o autor, o espiritismo nega todas as crenças enraizadas do velho mundo quanto às doutrinas que preconizam uma última revolução sangrenta (própria do marxismo) para uma sociedade igualitária.

                              Enfim, chega de teorias e pensamentos coletivos. Assim como cansa ouvir de pastores evangélicos expressões tais como, "Deus unirá o seu rebanho no dia do juízo final", cansa mais a expressão "o coletivo da sociedade decidiu que...".

Roberto Rufo


quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Por Que Somos Simplesmente Humanos! por Jacira Jacinto da Silva

Por Que Somos Simplesmente Humanos!

Jacira Jacinto da Silva




“Por que são mais numerosas, na sociedade, as classes sofredoras do que as felizes?
– Nenhuma é perfeitamente feliz e o que julgais ser a felicidade muitas vezes oculta pungentes aflições. O sofrimento está por toda parte. Entretanto, para responder ao teu pensamento, direi que as classes a que chamas sofredoras são mais numerosas, por ser a Terra lugar de expiação. Quando a houver transformado em morada do bem e de Espíritos bons, o homem deixará de ser infeliz aí e ela lhe será o paraíso terrestre” (O Livro dos Espíritos, q. 931).

Uma rápida pesquisa sobre a biografia das maiores celebridades da história, de qualquer área: ciência, arte, esporte, religião, política, ou outra, revelará que o(a) investigado(a) não pode ser considerado unanimidade, não estava “acima do bem e do mal”, tinha, ou tem, seus defeitos, e não raro apresentava, ou apresenta, alguma característica um tanto estranha aos padrões usuais.

As pessoas trabalham, lutam, buscam o aperfeiçoamento pelo estudo, pela reflexão e a conscientização, mas o estágio da humanidade terrena não induz perfeição, donde se inferem naturais as atitudes muitas vezes mal sucedidas, que denominamos erros. Somos humanos, sendo natural que não acertemos sempre e não podemos esperar perfeição dos outros. Mauro Spinola  diz que cada um dá o que tem.

Todos os dias e em todos os momentos fazemos escolhas; viver é decidir se já é hora de comprar um carro, ou trocar o que temos; se devemos investir em algum negócio, se deveríamos mudar de emprego, se caberia diminuir a carga de trabalho, fazer ou não uma viagem, e até se deveríamos visitar uma pessoa, ou comer algo diferente. Evidentemente, dessas escolhas decorrem consequências, às vezes boas, às vezes razoáveis e pode ocorrer de serem péssimas; muito desastrosas.

Também é certo que todas as nossas ações têm reflexos, não só influenciando os outros, como os atingindo diretamente. E como temos reagido ao sermos atingidos pelas consequências ruins das escolhas das outras pessoas? Certamente, muito mal. Lógico, inadmissível que alguém seja tão irresponsável a ponto de não se preocupar com as consequências dos seus atos; todos deveriam cursar “MBA (Mestre em Administração de Negócios) para aprender a gerenciar riscos” e ninguém, absolutamente, ninguém, portanto nós também, tem o direito de causar mal a outrem.

Nós achamos que estamos sempre corretos, mas deveríamos meditar sobre a seguinte frase atribuída a René Descartes:Não há nada no mundo que esteja melhor repartido do que a razão: toda a gente está convencida de que a tem de sobra” e não esquecer um só dia desta outra proposição do mesmo pensador: Humanamente não existe um ser feliz sem que o outro também seja.

Muito provavelmente esteja nessa última frase a melhor de todas as explicações para o texto epigrafado, extraído de O Livro dos Espíritos. Realmente, nenhuma pessoa, de nenhuma classe social, é perfeitamente feliz, estando o sofrimento por toda parte. A desigualdade social impõe aos que vivem à margem dos bens materiais toda sorte de privação, implicando naturalmente em dores morais como o preconceito e a discriminação. As classes privilegiadas também amargam suas dores; debatem-se no antro da inveja, do ciúme, do egoísmo, da doença física e mental, do crime, dos vícios etc.
Os espíritos encarnados na terra revelam uma variação muito grande de evolução, talvez em infinitos graus, disso resultando o convívio entre pessoas que se doam a causas altruístas, como Irmã Dulce, e que destroem a paz social, como Marcola, no mesmo país, sob as mesmas leis, formados em culturas muito similares. Mas são extremos, por que a maioria dos humanos não está na posição de Irmã Dulce, tampouco na de Marcola, navegando no mesmo barco daqueles que venceram determinados vícios, mas não se desapegam de outros; que lutam contra a própria natureza diariamente, buscando vencer a ignorância, a maldade, a inveja, a gula, a hostilidade, a avareza, a vaidade exagerada, a tentação de enganar, de se prevalecer, a arrogância etc. etc. etc.

Então, por que será que mesmo estando nós nessa condição de relativa igualdade, é tão notória a nossa intolerância com a dificuldade do outro, como se superar limitações fosse tarefa exclusiva dos outros?

A pergunta tem muito a ver com a resposta à questão de Kardec, que termina assim: Quando a houver transformado em morada do bem e de Espíritos bons, o homem deixará de ser infeliz aí e ela lhe será o paraíso terrestre. Talvez no mencionado tempo a sugestão de Descartes faça sentido; por enquanto, essas dificuldades ocorrem por que somos simplesmente humanos!

Jacira Jacinto da Silva, juíza de Direito  reside em São Paulo e Presidente da CEPA

NR: Texto publicado no Jornal Abertura de Setembro de 2015



terça-feira, 17 de janeiro de 2017

E viva a Democracia - por Reinaldo di Lucia

E viva a Democracia

Na  edição de setembro do jornal Abertura, o colunista Roberto Rufo relembrou que em 2017 serão comemorados os 100 anos da revolução que deu origem ao regime comunista na Rússia, que, com o tempo, gerou a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Lembrava ele também que todos os regimes comunistas que surgiram posteriormente foram fracassos redundantes (vide Cuba, Coréia, Vietnam, China).
A constatação destes fatos leva normalmente à exaltação do sistema democrático de cunho capitalista como a melhor solução político-econômica para as nações. Fala-se muito das oportunidades iguais que tal sistema proporciona aos cidadãos, da geração contínua de riqueza, da liberdade que todos gozam. E, por tabela, elogia-se a economia de livre mercado, verdadeira panaceia econômica para o mundo.
O outro lado da moeda é a situação que vemos no Brasil. Observamos uma promiscuidade generalizada entre o poder público e a iniciativa privada, com propinas a políticos de todos os matizes, formação de carteis, fraudes em licitações, “pedaladas”, e outras tantas práticas que vêm cada vez mais fazendo parte do vocabulário do brasileiro.

Agora em Athenas



Mas não nos enganemos. A crise que vivemos (que, a propósito, é menos política ou econômica que moral) não é prerrogativa do Brasil. Ocorre em todos os países, em maior ou menor grau. Difere em tamanho, na punição e no grau, mas em todos eles encontramos a mesma promiscuidade.

E aí vemos as pessoas dizendo que “o povo tem uma arma: o voto!”. Mas como usá-la se não há partido em que se possa confiar, se não existe agremiação política que não tenha por princípio o mesmo velho princípio do “é dando que se recebe”. A democracia existe na teoria: na prática...E a faceta mais perversa desta prática, que tanto mal causa ao país foi mostrada ao Brasil na última semana: para tentar garantir um mínimo de governabilidade, a presidente entregou o ministério de maior orçamento ao partido com maior número de representantes, visando, obviamente, garantir quórum nas votações do Congresso. Seria só mais do mesmo se, para tanto, ela não tivesse que demitir o melhor Ministro da Saúde que já tivemos, nosso companheiro Arthur Chioro (Ademar, para nós dqui de Santos).

Saímos deste episódio mais fracos, mais desamparados, mais desesperançados. E, pelo menos eu, cada vez mais desacreditado do sistema capitalista. Um sistema que tentam nos mostrar como justo, mas que concentra 50% (isso mesmo, metade!) de todo o dinheiro do mundo na mão de 86 pessoas. Essa desigualdade na distribuição da riqueza, historicamente, levou a grandes desgraças – esperemos que isto não ocorra novamente.


Ademar, obrigado pelo trabalho excepcional neste curtíssimo tempo. E quem sabe este exemplo possa inspirar a todos a como tratar a coisa pública. Precisamos de tempo, mas esse é um começo muito promissor.

NR: Artigo originalmente publicado no Jornal ABERTURA em novembro de 2015.