terça-feira, 15 de novembro de 2016

O ESPIRITISMO ANTE A CRISE METAFÍSICA OCIDENTAL por Ricardo Nunes

Este Trabalho foi apresentado no XIV SBPE em Santos em novembro de 2015.


O ESPIRITISMO ANTE A CRISE METAFÍSICA OCIDENTAL

“Quem é capaz de ver o todo é filósofo; quem não, não”, Platão.
“Os metafísicos são músicos sem talento musical”,  Rudolf Carnap.

INTRODUÇÃO
 Devemos informar, preliminarmente, ao amigo ou amiga que esteja nos lendo neste momento, que não é nosso objetivo nestas breves linhas, fazer um estudo erudito, exaustivo, baseado em ampla bibliografia, sobre o tema objeto de nossa análise.Procuraremos, apenas, dar algumas informações básicas, introdutórias, gerais, sobre a chamada “crise da metafísica”  no  pensamento ocidental. Refletiremos, também, sobre  o posicionamento do  espiritismo ante tão importante acontecimento da história da filosofia.

Ricardo de Moraes Nunes, no XIV SBPE

Entendemos que tal reflexão se faz necessária, uma vez que o espiritismo é uma “filosofia espiritualista”, sendo, portanto, uma doutrina metafísica. É característica das doutrinas metafísicas postularem um “além” para a realidade física. Outra característica do pensamento metafísico é a confiança no poder da razão, em sua capacidade de compreender o ser em sua totalidade. O espiritismo, igualmente, acredita no poder da razão e na capacidade do homem conhecer a realidade e possui uma teoria sobre o ser.
Por outro lado, existem filosofias que, mesmo sendo materialistas, também postulam um “além” mundo, mesmo que este “além” seja bem terreno, como postula o marxismo com sua utópica sociedade comunista. Alguns pensadores pós-modernos afirmam que estes “ideais” nos afastam da realidade, provocando alienação, e que são resquícios da mentalidade religiosa. Desta forma, observaremos, na presente reflexão, que existem alguns sentidos diversos para a palavra “metafísica”.
Outra motivação para escrevermos o presente artigo, é o fato de nos inserirmos em uma perspectiva espírita progressista, não conservadora. Queremos dizer com isso, que entendemos que o espiritismo deve acompanhar a evolução cultural da humanidade. O espiritismo, como proposta cultural, não pode ficar estagnado sem refletir criticamente sobre o devir dos conhecimentos humanos.
A “desconstrução” do pensamento metafísico ocidental é um dos fatos mais relevantes nos últimos dois mil e quinhentos anos de história da filosofia. Na verdade, esta “desconstrução” busca colocar em xeque muitas pretensas conquistas do pensamento ocidental, e, por isso, este processo interessa ao espiritismo. De fato, o espiritismo situa-se como herdeiro do pensamento moderno, e resgata algumas teses importantes do pensamento antigo. Acolhe, em sua teorização, muitos conceitos combatidos pelo pensamento anti-metafísico contemporâneo.
Não podemos falar em “crise da metafísica” sem falar em algumas importantes correntes do pensamento metafísico e suas características. Falaremos um pouco, apenas um pouco, sobre Platão e Aristóteles. Analisaremos a concepção hegeliana de história. Posteriormente, já iniciando o estudo da “desconstrução”, veremos a reflexão de Kant sobre a possibilidade do conhecimento. Observaremos Nietzsche se contrapor a todos os ídolos.  Estudaremos o ataque do neopositivismo às doutrinas metafísicas. Por fim, colocaremos  alguns temas da  filosofia espírita sob análise, ante este panorama histórico do pensamento ocidental.

PLATÃO E ARISTÓTELES: O ALÉM, O AQUÉM E O MOTOR IMÓVEL
Platão é um dos grandes metafísicos do pensamento ocidental. O seu pensamento influenciou profundamente a história da filosofia. Muitos concordaram com as afirmações platônicas ao longo da história, outros, por sua vez, contestaram suas teorias, mas nenhum filósofo conseguiu ignorar a contribuição do ilustre ateniense.
Para entrarmos diretamente ao assunto, devemos dizer que o pensamento platônico se insere na perspectiva de resolução de um grande problema colocado pelos pré-socráticos Parmênides e Heráclito: o problema do ser e suas características. Para Parmênides, o Ser é imutável, eterno, imperecível, e invisível aos nossos sentidos, mas acessível ao pensamento. Já Heráclito, por sua vez, dizia que a essência da realidade, do ser, é a mudança, e a realidade funciona, segundo o ilustre filósofo, em uma dinâmica de contraposição dos opostos, da qual resulta a “harmonia dos contrários”.
Platão considerou que Heráclito tinha razão, pois realmente o mundo sensível é mutável e contraditório. Porém, Platão também considerou Parmênides correto quando afirma que, para atingirmos o real conhecimento das coisas, devemos abandonar este mundo sensível, que atingimos pelos sentidos, visando, pelo pensamento, acessar o mundo verdadeiro, o do ser, que está além do sensível.
Observemos que, segundo esta visão platônica, não é possível atingir a verdade no plano sensível. Porém, e este ponto é importante a este trabalho, é possível atingir a verdade através da ascese do filósofo que deverá, por esforço da razão, se desligar do mundo sensível, para atingir este outro plano da realidade que podemos chamar de mundo das ideias ou mundo inteligível.
Ensina Marilena Chauí: “a ontologia platônica introduz uma divisão no mundo, afirmando a existência de dois mundos inteiramente diferentes e separados: o mundo sensível da mudança, da aparência, do devir dos contrários, e o mundo inteligível ,da identidade, da permanência, da verdade, conhecido pelo intelecto puro, sem qualquer interferência dos sentidos e das opiniões”.[1]
A tese platônica é um verdadeiro paradigma de tese metafísica. Nela encontramos a confiança no poder da  razão para compreender o ser, a realidade como um todo.Ao mesmo tempo, Platão postula que a realidade mesmo, de verdade, não está no mundo em que vivemos, está além.
Aristóteles foi o grande discípulo de Platão que rompeu com seu mestre. Da mesma maneira que séculos mais tarde Jung rompeu com Freud, Aristóteles seguiu seu caminho filosófico se distanciando de seu mestre.
Em primeiro lugar, ao tratarmos de Aristóteles, devemos  lembrar uma curiosidade sobre o surgimento da palavra metafísica. Segundo Marilena Chauí: “A palavra metafísica foi empregada pela primeira vez por Andrônico de Rodes, por volta do ano 50 a.C, quando recolheu e classificou  as obras de Aristóteles  que, durante muitos séculos, haviam ficado dispersas e perdidas.Com essa palavra- ta meta ta physika- o organizador dos textos aristotélicos  indicava um conjunto de escritos que, em sua classificação, localizavam-se após os tratados sobre a física ou sobre a Natureza, pois a palavra grega meta quer dizer: depois  de, após, acima de”.[2]
De fato, aqueles escritos de Aristóteles receberam do próprio estagirita, a designação de “filosofia primeira”, a qual tem por objeto de estudo  “o ser enquanto ser”. Segundo Aristóteles, esta “filosofia primeira” estuda os princípios originários, as causas primárias de todas as coisas. Aquilo que vem antes e que fundamenta como condição a existência dos seres.
Diz Marilena Chauí : Que quer dizer “vir antes”? Para Aristóteles, significa estar acima dos demais, estar além do que vem depois, ser superior ao que vem depois, ser a condição da existência  e do conhecimento do que vem depois. Ora, a palavra meta quer dizer isso mesmo: o que está além de, o que está acima de, o que vem depois, mas no sentido de ser superior ou de ser a condição de alguma coisa. Se assim é, então a palavra metafísica não quer dizer apenas o lugar onde se encontram os escritos posteriores aos tratados de física, não indica um mero lugar num catálogo de obras, mas significa o estudo de alguma coisa que está acima e além das coisas físicas ou naturais  e que é a condição da existência do conhecimento delas”.[3]
Aristóteles discorda de Platão em relação a tese de que o mundo sensível seria apenas aparência e não realidade.Aristóteles não duplica a realidade Para ele a natureza é real e não uma mera sombra ou aparência e comporta, portanto, a multiplicidade e o devir.Sendo assim, segundo o filósofo, é possível fazer ciência da natureza, é possível adquirir conhecimento proveniente da realidade sensível.Sem Aristóteles, talvez não tivéssemos começado a desenvolver a atividade científica, já no mundo antigo, e seríamos, ainda por longo tempo, seres meramente contemplativos.
Tese metafísica por excelência, é a tese do “Primeiro Motor Imóvel” de Aristóteles. Este “Primeiro Motor” encontra-se fora do mundo e funciona como uma força de atração dos seres e das coisas em busca de perfeição. Esta tese busca explicar o movimento e o devir dos seres, a sua passagem de potência para ato.
Sobre esta tese de Aristóteles, afirma Marilena Chauí: “A mudança ou o devir são a maneira pela qual a Natureza, ao seu modo, se aperfeiçoa e busca imitar a perfeição do imutável divino. O ser divino chama-se Primeiro Motor porque é o princípio que move toda a realidade, e chama-se Primeiro Motor Imóvel porque não se move e não é movido por nenhum outro ente, pois, como já vimos, mover significa  mudar, sofrer alterações qualitativa e quantitativas, nascer é perecer,  e o ser divino, perfeito, não muda nunca”.[4]
A METAFÍSICA CRISTÃ
O cristianismo é uma doutrina religiosa metafísica, na qual as ideias do além estão fortemente presentes. As ideias cristãs influenciaram profundamente a civilização ocidental. Ora o cristianismo fez uma ponte com a filosofia de Platão, como por exemplo, em Santo Agostinho, ora com a filosofia de Aristóteles, como em São Tomás de Aquino.Somente este fato já nos mostra a vocação metafísica dos dois grandes filósofos  gregos.

HEGEL: O REAL É RACIONAL E O RACIONAL É REAL.
Até aqui vimos a confiança que os dois importantes filósofos da antiguidade tinham na capacidade de compreender a realidade, o ser. Esta confiança no poder do intelecto irá se estender por séculos, até que um dia será colocada em questão. Agora vamos estudar um pouco de outro grande idealista da história do pensamento ocidental: Hegel.
Hegel realiza uma virada genial na história da filosofia, para compreendermos isso, basta pensarmos que os filósofos sempre separaram razão e realidade. Hegel fará justamente o contrário. O famoso filósofo alemão postula a identidade entre a realidade e a racionalidade, conforme a célebre frase: “O que é racional é real e o que é real é racional”
Diz o professor Alysson Leandro Mascaro:  “As disputas em torno do significado dessa identificação só não foram maiores que o espanto da filosofia de seu tempo, acostumada à tradição dicotômica, que confortavelmente dava uma casa à filosofia sem obrigá-la a conviver na outra, da realidade. Essa identificação abre um novo mundo de perspectivas à filosofia, superando definitivamente o passado das dicotomias entre o plano da razão e o da realidade”.[5]
Hegel, por um lado, retira a reflexão filosófica do plano abstrato, ideal, meramente racional, como queria Platão. A partir da filosofia hegeliana a história concreta entra em cena. Com isso, poderíamos dizer que a tradicional ideia metafísica do além mundo é afastada,  e o homem passa a ser compreendido como um ser histórico.Por outro lado, Hegel dá legitimidade racional ao desenvolvimento histórico, o que é uma tese bastante discutível.A razão passa a “encarnar” na história em um movimento dialético.
Segundo Alysson Leandro Mascaro: “Ocorre que a identificação entre real e racional conduz , ao mesmo tempo que ao fim da metafísica, também a uma nova imantação do mundo. Se o que é deve ser, então há uma lógica intrínseca no mundo e na existência, e tal lógica se deve a uma cadência universal da razão, que no limite se liga a Deus.Para Hegel, a realidade fica legitimada a partir de uma espécie de caminho necessário da razão”.[6]
Trata-se, portanto, de aceitar que o mundo dos homens, a história, encerra uma “racionalidade intrínseca” e se desenvolve segundo uma “cadência universal da razão” .A razão, definitivamente, segundo esta tese, pode ser encontrada na realidade histórica e social em movimento.  Segundo Alysson Mascaro, tal pensamento encerra uma face progressista e outra conservadora:
“Se a razão é a realidade, não se duplica o mundo, e, portanto, pensa-se a própria razão a partir de referenciais  concretos e históricos. Trata-se de uma visão progressista. Mas, por outro lado, se o que é é também o que deve ser, então o mundo está legitimado, mesmo nas suas ignomínias e nas suas injustiças . Trata-se de um edulcoramento do mundo, implicando, pois, na face conservadora do pensamento hegeliano”.[7]
Poderíamos, a partir deste pensamento hegeliano, justificar como “racionais” as piores atrocidades da história, pois, em tese, fariam parte do desenvolvimento dialético da razão no mundo. Hegel será, posteriormente, muito criticado por este pensamento totalizante da história. Porém, irá inspirar a muitos, entre estes, o materialista Marx, que entenderá que a história se desenvolve em um determinado sentido. Segundo Marx, do desenvolvimento do sistema capitalista, necessariamente, surgiria uma sociedade mais universal e melhor: a sociedade comunista.

KANT E OS PROBLEMAS DO CONHECIMENTO
Kant é o responsável por uma verdadeira revolução na história do pensamento ocidental. Ele passa a questionar  as condições do conhecimento em um sentido diferente do que até aquele momento tinham feito as correntes racionalistas, que enfatizavam a razão como fonte do conhecimento  verdadeiro, e as correntes   empiristas, que enfatizavam a apreensão dos sentidos, como o verdadeiro critério para o conhecimento.De fato, os racionalistas entraram em um processo dogmático de suas afirmações, já os empiristas, por sua vez, acabaram por cair em um relativismo extremo, muito próximo da sofística. Neste sentido afirma José Herculano Pires:
 Já vimos que Kant havia descoberto o vazio das oposições filosóficas, notando que faltava às doutrinas opostas, um verdadeiro conteúdo. Todas elas, por assim dizer, lutavam no vácuo. O Racionalismo, por exemplo,  tornara-se tão dogmático quanto a Escolástica: a partir da suposta realidade do pensamento, reconstruíra toda a Metafísica, sem primeiro provar aquela realidade, estudar a sua natureza e examinar o problema de suas relações com o mundo das coisas. O Empirismo, por sua vez, voltara às teorias protagóricas do conhecimento, pondo toda a sua ênfase no problema das relações entre o pensamento e as coisas, mas não conseguira estabelecer a validade das coisas.Assim, estabelecera também uma forma de dogmatismo...”.[8]
Kant defende que a estrutura mental do sujeito do conhecimento é fundamental na organização dos dados advindos da percepção sensorial. É a mente, é a consciência do sujeito, que organiza  aquilo  recebe do mundo exterior.A consciência, o intelecto, possui estruturas fundamentais que auxiliam na harmonização dos dados dos sentidos, entre estas estruturas destacamos, como exemplo, as categorias de espaço e tempo, que são internas ao sujeito e não externas.
Diz  Herculano Pires: “É na forma da consciência que a matéria das sensações vai ser organizada,e por assim dizer, fundida. Mas essa forma geral contém, no seu interior, as formas diversas da experiência. E as duas formas primárias da experiência são as categorias de espaço e tempo, ou seja, as intuições de espaço e tempo. Nessas formas, toda a experiência é modelada. As sensações  se acomodam nessas categorias, e adquirem a unidade e a estabilidade necessárias para que se realize o processo do conhecimento, da maneira semelhante à da água que se acomoda nos recipientes. Espaço e tempo não são, pois, fatos exteriores, mas formas a priori do pensamento, pelas quais a consciência modela a realidade exterior, graças às sensações”.[9]
Nesta visão kantiana o conhecimento é problematizado. Não se trata apenas de “adequação do intelecto à coisa”, conforme sempre se pensou. O sujeito do conhecimento possui função ativa na elaboração deste. O conhecimento, portanto, é  também produto das estruturas mentais do sujeito do conhecimento.
É ainda Herculano que nos ensina: “A forma da consciência não é apenas receptiva, mas também ativa, uma vez que constrói a realidade com os dados dos sentidos. Assim, o espírito imagina o mundo exterior, ou seja, elabora uma imagem desse mundo, com as sensações que dele recebe, mas servindo-se de suas próprias categorias, de suas formas receptivas. Entretanto, não existe o problema do extremo subjetivismo, que levaria ao solipsismo, pois as formas da consciência não são individuais, mas comuns aos seres pensantes”.[10]
Ora, se o conhecimento é organização subjetiva do intelecto, tendo como fonte os dados da percepção sensorial, como fica, então, a antiga questão da metafísica, que consiste justamente em indagar sobre as causas primeiras da realidade e seus fundamentos últimos não acessíveis aos sentidos? Não estariam as ideias metafísicas condenadas por Kant?
Segundo José Herculano Pires: “Realmente, para kant, como vimos, Deus não pode ser compreendido nas limitações de espaço e tempo das nossas básicas intuições intelectivas, nem apreendido  pelas categorias mentais. Nem a imortalidade da alma ou o princípio de liberdade podem caber nessas medidas do intelecto. Porque nem Deus, nem a imortalidade, nem a liberdade são entidades fenomênicas, perceptíveis através dos sentidos orgânicos por meio das sensações. Em vez de sombras na parede da caverna, defrontamo-nos aí com ideias, com realidades pertencentes ao mundo da luz, para o qual os nossos olhos mortais se mostram cegos. Essas são, na realidade, coisas em si, númenos, que escapam ao intelecto, uma vez que este só opera no plano dos fenômenos”.[11]
A conclusão óbvia da reflexão kantiana, portanto, é que não é possível fazer ciência das chamadas questões metafísicas, pois só se faz ciência tendo por objeto o mundo sensível. Isso não quer dizer que Kant tenha negado a realidade metafísica, apenas afirmou ser esta realidade inacessível à ciência. Será verdade esta afirmação de Kant? O espiritismo não a desmente, em parte, quando pretende ter comprovado, empiricamente, a sobrevivência do espírito à morte?

O ILUMINISMO E O POSITIVISMO
Dois movimentos filosóficos dos séculos XVIII e XIX são dignos de nota. O iluminismo e o positivismo. Tais movimentos, que se pretendiam racionais e científicos, defenderam grandes ideias metafísicas.  Apesar de muitas vezes se contraporem à religião, não deixaram de ser metafísicos em outro sentido como veremos.

NIETZSCHE: O DEMOLIDOR DE TODOS OS IDEAIS.
Muitos lembram de Nietzsche apenas para  designá-lo como o profeta da “morte de deus”. No entanto, não menos importante, é sua oposição  a todos os ideais que postulam um “além” para a humanidade, seja um além terreno ou espiritual. Segundo Luc Ferry:
Nietzsche pensa que todos os ideais, explicitamente religiosos ou não, de direita ou de esquerda, conservadores ou progressistas, espiritualistas ou materialistas, possuem a mesma estrutura, a mesma finalidade: fundamentalmente eles partem, como lhe expliquei, de uma estrutura teológica, já que se trata sempre de inventar um além melhor do que este mundo, de imaginar valores pretensamente  superiores e exteriores à vida ou, no Jargão dos filósofos,  valores transcendentes”.[12]
O próprio Nietzsche afirma no prefácio de Ecce Homo:
 “Melhorar a humanidade? Eis a última coisa que eu prometeria. Não esperem de mim que eu erija novos ídolos! Que os antigos aprendam antes quanto custa ter pés de barro! Derrubar os “Ídolos” – é assim que chamo todos os ideais- esse é meu verdadeiro ofício. É inventando a mentira de um mundo ideal que se tira o valor da realidade, sua significação, sua veracidade.A mentira do ideal foi até agora a maldição que pesou sobre a realidade, a própria humanidade se tornou mentirosa e falsa até o mais fundo de seus instintos até a adoração dos valores opostos àqueles que poderiam lhe garantir um belo crescimento, um futuro...”.[13]
Ser niilista, para o genial filósofo alemão, é preferir o além -seja no sentido espiritual ou no sentido de uma sociedade ou homem melhor- em detrimento do aquém. É trocar o ser concreto, real, por um questionável dever ser utópico e imaginário. É preferir o nada no lugar da terra. É repudiar o agora, em detrimento de um futuro. Quão distantes de Platão estamos aqui!
 Nietzsche também apresenta uma visão interessante sobre o problema do conhecimento. Segundo ele não é possível fazer avaliações sobre a realidade como se estivéssemos de fora dela, a partir de um ponto de vista superior, a partir do qual poderíamos julgar a realidade. Diz ele em o Crepúsculo dos Ídolos:
Juízos, juízos de valor sobre a vida, a favor ou contra, nunca podem ser, em última instância, verdadeiros: não possuem outro valor  senão o de sintomas – em si, tais juízos são imbecilidades. É, pois, necessário estender os dedos para tentar apreender essa fineza extraordinária que reside no fato de que o valor da vida não pode ser avaliado. Não por um vivente, pois ele é parte, e até mesmo objeto do litígio; não por um morto, por uma outra razão”.[14]
Portanto, para Nietzsche nada de certezas “absolutas”, de conhecimentos “verdadeiros”. Para ele o mundo não é nada harmônico ou “racional”, como tradicionalmente se pensou tanto no mundo antigo quanto no mundo moderno. Diz  Nietzsche sobre  sua própria visão de mundo:“Sabem o que é o “mundo” para mim? Querem que eu o mostre em meu espelho? Esse mundo é um monstro de forças, sem começo nem fim, uma soma fixa de forças, dura como o bronze, uma mar de forças tempestuosas, um fluxo perpétuo”.[15]
 Neste sentido, afirma Luc Ferry:
 “Mas se o conhecimento jamais alcança a verdade absoluta, se seu horizonte é continuamente recuado, impedindo que atinja a rocha sólida e definitiva, é porque, evidentemente, o próprio real é um caos que não se parece em nada com o sistema harmonioso dos Antigos, nem mesmo com o universo ainda mais ou menos “racionalizável” dos Modernos”.[16]
Portanto, Nietzsche, pretende demolir todos os “ídolos”: as ideias de razão, ordem, progresso, verdade, sentido da vida e da história, harmonia cósmica, conhecimento verdadeiro, mundo melhor, tudo isto, segundo o inquieto filósofo, é metafísica, ilusão, resquício do passado mítico e mágico a humanidade. O mundo é um caos e devemos aceitar isso, sem maiores pretensões.Continua Luc Ferry interpretando o pensamento de Nietzsche:
 “ O racionalismo científico dos Modernos é nada mais que uma ilusão, um modo de, no fundo, perseguir a ilusão das cosmologias antigas, uma “projeção” humana ( e Nietzsche já emprega palavras que logo Freud usará), quer dizer, um modo de tomar nossos desejos por realidade, de nos oferecer um simulacro de poder sobre uma matéria insensata, multiforme, caótica, que na verdade nos escapa totalmente”.[17]
Podemos afirmar, finalmente, que Nietzsche é um verdadeiro paradigma do pensamento anti-metafísico. Seu pensamento irá influenciar profundamente a pós-modernidade.


O NEOPOSITIVISMO E O ATAQUE À METAFÍSICA.
 O neopositivismo é uma corrente filosófica que surgiu com o “círculo de Viena”, famoso grupo filosófico, surgido na primeira metade do século XX, que tinha por objetivo refletir sobre as questões do método científico, da linguagem e epistemológicas.
Segundo Giovanni Reale e Dario Antiseri: “A reflexão sobre o método científico conhece, nos anos que intercorrem entre as duas guerras, um impulso decisivo. O principal centro para a filosofia da ciência foi, nesse período, a universidade de Viena, onde um grupo de intelectuais (Rudolf Carnap, Herbert Feigl, Friedrich Waismann, Otto Neurath, Hans Hahn, Félix Kaufmann etc) se reuniram, a partir de 1924, ao redor de Moritz Schlick, dando vida ao que se tornou o Círculo de Viena, cuja atividade, consistia de discussões, seminários, congressos, publicações, durou até pela metade da década de 1930. A tomada do poder por Hitler levou consigo também o fim do círculo de Viena”.[18]
O principio fundamental do neopositivismo do circulo de Viena, é o princípio da verificação, segundo este principio só têm sentido aquelas proposições que podem ser empiricamente verificadas, que podem ser convertidas na linguagem da física, química, geografia, história, geologia , etc. Aquilo que foge a este principio de verificação empírica, é pura metafísica, sem sentido.
Assim, ensinam Giovanni Reale e Dario Antiseri: “Daí a antimetafísica dos neopositivistas vienenses , para os quais as afirmações metafísicas junto com as religiosas são simplesmente não-sentidos, justamente pela razão de que não são verificáveis”.[19] (Pág. 113)
O radicalismo dos filósofos do circulo de Viena nos proporcionou frases muito interessantes em relação a alergia que tinham no que diz respeito às chamadas questões metafísicas. Wittgenstein afirma que “A maioria das proposições e das questões escritas em matéria de filosofia não são falsas, mas desprovidas de sentido”; Schlick “compara os metafísicos a atores que continuam a representar seu insosso papel até depois que a plateia se esvaziou”.;Rudolf Carnap, por sua vez, afirmou: “Nem Deus nem diabo algum poderão jamais nos dar uma metafísica” ou esta outra “ Os metafísicos são músicos sem talento musical”. Neurath dizia que a principal tarefa da filosofia era”elaborar uma linguagem o mais livre possível da metafísica”.[20]
Giovanni Reale e Dario Antiseri nos contam um episódio interessante:
 “A segunda mulher de Neurath, Marie, e R.S. Cohen recordam o seguinte episódio: Neurath interrrompia frequentemente, esclamando Metafísica!, durante a leitura e a discussão do Tractatus de Wittgenstein nas reuniões do Círculo, irritando M. Schlick, que , por fim, disse-lhe que estava interrompendo muito amiúde os trabalhos. Como bom conciliador, Hans Hahn propõe a Neurath que dissesse só “M”. Como contou mais tarde Hempel, depois de um longo murmúrio, Neurath fez outra proposta a Schlick: “ Acho que     economizaremos tempo e esforço se eu disser “Não M” toda vez que o grupo não estiver falando de metafísica”.[21]
Neste singelo exemplo conseguimos enxergar, precisamente, a postura de radicalismo  de tais filósofos, de absoluta rejeição a tudo que não for verificável, mensurável e objetivável .Antes de entrarmos na visão espírita sobre o tema, devemos fazer algumas considerações sobre esta postura antimetafísica.
 Em primeiro lugar, devemos dizer que os lances de “desconstrução metafísica” na filosofia contemporânea são muitos, citamos apenas Nietzsche e o Círculo de Viena como exemplos interessantes. Infelizmente, não podemos nos alongar em demasia neste breve texto sobre os demais “desconstrutores”.
 Quanto a atitude antimetafísica podemos dizer que, sem dúvida, existe um aspecto positivo nela, pois seu fundamento é justamente a busca do  rigor na conquista do conhecimento. Este rigor tem por finalidade nos impedir de ficarmos discutindo como dizem o “sexo dos anjos”. Era muito comum na Idade Média estas discussões estéreis, inúteis, sem objeto de estudo concreto, absolutamente abstratas e indemonstráveis.
 Portanto, uma postura de dúvida metódica, e  cautela em relação aos temas metafísicos, se faz necessária, se quisermos manter nossos pés no chão.Isto é uma coisa, outra, porém, é termos preconceito contra qualquer tese metafísica, e nos recusarmos, terminantemente, a discuti-la, mesmo quando existam argumentos e evidências razoáveis em seu favor. Se assim fizéssemos, muito do conhecimento conquistado pelo homem, nestes séculos de civilização, não viria a luz.
As metafísicas podem gerar hipóteses científicas.
Um filósofo pré-socrático de nome Demócrito intuiu, pela força de seu pensamento, na Grécia antiga,  sem qualquer instrumento de verificação, a existência de um elemento fundamental da realidade: o átomo.Séculos e séculos depois, chegou-se à comprovação experimental da existência deste elemento da natureza. Quando Demócrito pensou o átomo, este era, sem dúvida nenhuma, uma tese metafísica, atualmente não é mais.
Finalmente, encerramos este tópico com Giovanni Reale e Dario Antiseri:
 “ As metafísicas podem desenvolver a importante função de gerar hipóteses científicas. São questões cientificamente insolúveis que põem, todavia, na maioria das vezes, problemas que encontram depois uma solução. De fato, disse Strawson, “aquilo que começa como metafísica pode acabar como ciência”. E não diversamente de Strawson pensa, a próposito de tal questão, K.R. Popper, para o qual “ a maior parte dos sistemas metafísicos pode ser reformulada de modo tal a se tornarem problemas de método científico”. A metafísica, portanto, pode ser a aurora da ciência. Descartes gerou Newton, Hegel alguns historiadores,e Marx muita sociologia e muita historiografia”.[22]

O MUNDO PÓS-MODERNO E O LUGAR DO ESPIRITISMO.
O mundo pós-moderno até que teve suas razões na “desconstrução” da metafísica. Afinal, os donos da verdade foram muitos na história da religião, da política e da cultura em geral e ainda estão por aí, mesmo após todo ataque histórico às pretensões absolutistas da ciência, da filosofia, da política e da religião.Neste sentido Diz Dora Incontri:
 “Em toda atitude nadificante, que caracteriza o pós-moderno, há boa dose de rebelião a várias formas de verdades autoritárias e de arbitrariedades absolutas. A metafísica é crucificada em nome das imposições milenares das religiões: a objetividade científica é banida por conta do dogmatismo cientificista herdado do positivismo: a visão histórica como construção evolutiva e com densidade teleológica fica esvaziada pelos excessos do hegelianismo ou pelo fracasso do marxismo aplicado; a verdade se dissolve em virtude das verdades ingenuamente absolutizadas e culpa-se o próprio Deus pelas atrocidades humanas, e que por isso, é morto ontologicamente, retirando o chão de todas as certezas, construídas na tradição ocidental”.[23]
Assim, vivemos um momento de descrença, de niilismo, negativismo e preconceito ante todo e qualquer discurso afirmativo do ser, do conhecimento e da verdade. Ainda segundo Dora Incontri: “O medo de estar contaminado por qualquer resquício metafísico, por qualquer convicção confortadora, “nostálgico-restauradora”, no dizer de Vattimo, paralisa hoje um discurso afirmativo”.[24]
E o espiritismo, ante este estado de coisas, acaba por sofrer um verdadeiro “pacto de silêncio” sobre suas teses, da parte da cultura acadêmica em geral. Neste sentido indaga Dora Incontri:
“O que teria provocado isso que parece um  implícito e estranho pacto de silêncio, em torno de uma filosofia, que teve sua projeção na Europa do século XIX e continua conquistando adeptos, 150 anos depois? Ainda que fosse para critica-la, por que não comentá-la?”.[25]

A POSSÍVEL CONTRIBUIÇÃO DO ESPIRITISMO À CIÊNCIA.
Neste tópico refletiremos sobre a possível contribuição de alguns postulados metafísicos espíritas à ciência, a partir de uma breve análise do que Jon Aizpúrua chamou de “postulados básicos do espiritismo”, são eles: a existência de Deus, a preexistência e sobrevivência do espírito, reencarnação, a lei de evolução universal, mediunidade e pluralidade dos mundos habitados.
Procuraremos refletir, brevemente, e sem dogmatizar, é claro, sobre aqueles princípios metafísicos espíritas- espíritas porque defendidos pelo espiritismo, mas que seriam pertencentes acima de tudo, à natureza- que, segundo nosso entendimento, já oferecem à ciência algumas evidências razoáveis merecedoras de estudo e atenção.
 Ao mesmo tempo, procuraremos refletir sobre aqueles princípios,  que ainda são teses puramente metafísicas, não menos importantes, certamente, mas que ainda se encontram em um estado semelhante a tese do átomo, defendida por Demócrito na Grécia antiga.Tais teses, que nomeamos de “puramente metafísicas”, apenas para nosso entendimento no presente trabalho,  permanecem somente no campo da razão e da intuição, sem abrir espaço, até este momento histórico, para nenhum tipo de pesquisa científica que forneça evidencias razoáveis de sua realidade.
 Não ignoramos, entretanto, que a grande a maioria da comunidade científica contemporânea, nacional e internacional, desconhece  as teses do espiritismo. Neste sentido,  é mais fácil um físico  quântico remontar à sabedoria de Buda, há mais de dois milênios, do que  referir-se a um sujeito genial como Kardec, que viveu na França, em meados do  século XIX, e  que  deu uma contribuição imensa na investigação dos fenômenos psíquicos transcendentes. Assim é a vida...
 Porém, isso não deve nos impedir de refletir sobre as possíveis contribuições do espiritismo ao mundo do conhecimento.

A PREEXISTÊNCIA E SOBREVIVÊNCIA DO ESPÍRITO E A MEDIUNIDADE.
O espiritismo, inequivocamente, é uma doutrina metafísica. Seu objeto de estudo é um tema metafísico por excelência: a alma. Muitos já falaram sobre a alma na história das filosofias e das religiões. Nas filosofias, o problema da alma, foi tradicionalmente abordado sob o ponto de vista da racionalidade, já nas religiões, sob o ponto de vista da fé.
O espiritismo, no entanto, possui um diferencial, uma singularidade, que precisa ser bem compreendida. O espiritismo aborda este tema metafísico com o método da observação científica. O espiritismo, ousadamente, pretende ter demonstrado, empiricamente, a realidade do Espírito.Neste sentido, afirma Kardec:
 “como meio de elaboração, o Espiritismo procede exatamente da mesma maneira que as ciências positivas, isto é, aplica o método experimental. Fatos de ordem nova se apresentam que não podem ser explicados pelas leis conhecidas; Ele os observa, compara, analisa e, partindo dos efeitos às causas, chega à lei que os rege; depois, deduz as consequências e busca as aplicações úteis. O Espiritismo não estabeleceu nenhuma teoria preconcebida; assim, não se apresentam como hipótese nem a existência e a intervenção dos Espíritos, nem o perispírito, nem a reencarnação, nem qualquer dos princípios da doutrina; conclui-se pela existência dos Espíritos porque essa existência resultou como evidência da observação dos fatos; e assim os demais princípios. Não foram os fatos que vieram posteriormente confirmar a teoria, mas foi a teoria que veio subsequentemente explicar e resumir os fatos. É rigorosamente exato, portanto, dizer que o Espiritismo é uma ciência de observação e não o produto da imaginação”.[26]
Esta característica faz da filosofia espírita uma doutrina metafísica “sui generis”, pois não se serve apenas da razão ou da intuição, ou mesmo da revelação religiosa, como é o caso das religiões em geral, para o embasamento de suas teses. Procura fundamentar seus argumentos em ampla variedade de fenômenos físicos e inteligentes, naturais e não sobrenaturais, propiciados pela mediunidade.
Sendo assim, para as finalidades de nosso estudo, entendemos que, em relação às  teses da preexistência e sobrevivência do espírito, o espiritismo já consegue abrir um horizonte bastante interessante para a pesquisa científica, desde é claro, que os preconceitos sejam deixados de lado, o que certamente é muito difícil.Do século XIX até os dias atuais, muitos pesquisadores sérios e renomados se debruçaram sobre o chamado “fenômeno espírita”.E isto não deveria ser ignorado.

SOBRE A EXISTÊNCIA DE DEUS
O espiritismo defende a existência de Deus. Obviamente que não um Deus antropomórfico como as religiões tradicionais sempre defenderam. A ideia espírita de Deus é uma ideia filosófica “Deus como inteligência suprema causa primária de todas as coisas”. O espiritismo chega a falar em “provas” da existência de Deus, como um dia falaram filósofos do passado e mesmo pensadores da igreja como Tomás de Aquino.
Hoje, sabemos que não é possível provar a existência de Deus.  Este é um dos mais enigmáticos temas metafísicos de todos os tempos, porém, absolutamente inacessível a qualquer tipo de pesquisa de caráter científico. Podemos chegar a Deus, talvez, por uma certa inferência lógica, pela intuição, pelo sentimento, mas não pela ciência. Provavelmente, aqui seja o grande acerto de Kant. Os próprios espíritos disseram a Kardec que a reflexão sobre este tema não levaria a lugar algum:
 “Deus existe, não o podeis duvidar, e isso é o essencial. Acreditai no que vos digo e não queirais ir além. Não vos percais num labirinto, de onde não poderíeis sair. Isso não vos tornaria melhores, mas talvez um pouco mais orgulhosos, porque acreditaríeis saber, quando na realidade nada saberíeis. Deixai, pois de lado, todos esses sistemas: tendes de vos desembaraçar de muitas coisas que vos tocam mais diretamente, Isto vos seria mais útil do que querer penetrar o que é impenetrável”.[27]
Apreciamos muito esta  afirmação dos espíritos que dizem que existem temas que “vos tocam mais diretamenteAnte os inúmeros problemas e injustiças de nosso planeta, esta afirmação é muito sábia. Acreditarmos ou não em Deus, não é o grande problema do mundo contemporâneo, mas, sim, a forma que agimos neste mundo. Precisamos muito mais em nossos dias da reflexão ética do que teológica.

REENCARNAÇÃO E EVOLUÇÃO
Em relação a tese espírita da reencarnação podemos dizer que já existem pesquisas científicas muito sérias neste campo. Ian Stevenson é apenas um exemplo de pesquisador que conseguiu estudar esta questão com rigor científico. Não nos deteremos em ficar citando outros cientistas que fizeram pesquisas sérias neste tema, pois não é objetivo de nosso trabalho.O que queremos dizer é que esta tese metafísica da reencarnação já possui uma abertura para o estudo da ciência.
Quanto à chamada lei de evolução entendemos que as coisas são mais complexas, principalmente no que diz respeito à teoria de que há uma evolução do Espírito através dos reinos mineral, vegetal, animal, hominal, até chegar a Espírito puro.Entendemos, que é um panorama grande demais para fazermos afirmações.  Temos, aqui, uma tese metafísica grandiosa, um grande sistema de compreensão do mundo, que ainda escapa de qualquer evidência científica.
Nós, espíritas, neste tema, podemos dizer apenas:
a) que existem evidências a respeito da preexistência e sobrevivência do espírito humano;
b) que existem evidências da sobrevivência do principio espiritual dos animais;
c) Já a afirmação de que o principio espiritual do animal um dia será o espírito de um homem é um salto, que ainda não podemos dar, pois não temos evidências, apenas podemos conjecturar.
d) É certo, igualmente, que no campo biológico, Darwin nos fala de “evolução das espécies”. Poderíamos argumentar, então, que mediante esta perspectiva, não seria um absurdo a evolução do principio espiritual em direção a estados superiores.
e) A ideia de um “espírito puro” está totalmente fora de nosso alcance.
f) Podemos concluir, portanto, que a tese que postula um processo evolutivo do mineral ao espírito puro ainda é uma tese puramente metafísica.


DA PLURALIDADE DOS MUNDOS HABITADOS
O espiritismo aposta na existência de civilizações extra-terrestres. É famosa a interpretação espírita a respeito da frase de Jesus de Nazaré: “Há muitas moradas na casa de meu Pai”. Podemos dizer que esta tese ainda é puramente metafísica, sem nenhum tipo de evidência. Pelos menos, no sentido da pesquisa científica tradicional, que busca encontrar vida inteligente- e mesmo vida microscópica- em outras esferas.
 Curiosamente, apesar dos resultados negativos até o momento, há um grande investimento da ciência tradicional neste campo. Cientistas como Carl Sagan não descartavam a ideia de  encontrar vida fora da terra, apesar de sua formação cética em relação a estes temas.

CONCLUSÃO
Na idade média, a filosofia era subordinada à “revelação” religiosa. Não podia jamais contradizer os mandamentos da religião. No mundo contemporâneo, tenta-se fazer da filosofia uma espécie de apêndice da ciência, restringindo em demasia a reflexão filosófica, destituindo-a de sua característica fundamental de indagar sobre os grandes temas ontológicos do ser, da vida e da morte.
Alguns defendem que “deus morreu” e com ele a reflexão metafísica. Afirma Miguel Reale que alguns consideram que a filosofia deve tratar apenas das reflexões de ordem lógica e axiológica:
: “Alguns autores pensam que a filosofia se esgota nas duas questões fundamentais de ordem lógica e axiológica, sendo apenas uma teoria do conhecer e uma teoria do agir; porém, o homem não é um ser que tão somente conhece e age, mas é também, e antes de mais nada, um ser, uma “existência”, um ente  que sabe que existe entre outros entes, de igual ou de diversa categoria- donde os problemas radicais do ser e da existência, em uma palavra, da Metafísica”.[28]
Continua o grande filósofo brasileiro:
 “Não se trata apenas de perguntar apenas sobre o que vale o pensamento ou o que vale a conduta, mas sim de considerar o valor de nós mesmos e de tudo aquilo que nos cerca. Que vale a existência? Que vale ou representa o universo? Que vale o homem inserido no universo? Que ser é o homem? Que é ser? Existe algo como suporte do objeto conhecimento?”.[29]
 Devemos dizer que tais questões são eternas e típicas da reflexão metafísica. O espiritismo procura responder estas questões, sem dogmatizar, consciente das limitações do conhecimento humano.  Porém, o espiritismo não foge e não se omite frente a uma reflexão mais profunda sobre o ser. Oferece a sua reflexão. Estará com a verdade? Nós, espíritas, acreditamos que, em muitos aspectos, o espiritismo oferece excelentes respostas, e também perguntas, referentes aos problemas do ser, do homem e do mundo.
  Finalmente, devemos dizer que as questões metafísicas são naturais à curiosidade humana. Impossível ao homem deixar de pensar, em um momento ou outro de sua vida, sobre o sentido de sua existência, de onde veio, para onde vai. Podemos afirmar, portanto, sem medo de errar, que o pensamento metafísico está em crise, mas não morreu.
 Pelo contrário, na atualidade, existem estudos que abordam alguns temas metafísicos sob o ponto de vista científico, como uma verdadeira ruptura do legado kantiano que afirma a impossibilidade de se fazer ciência de tais  questões: Disciplinas como a parapsicologia, física quântica, psicologia transpessoal, projeção da consciência ou projeciologia, pesquisas sobre experiências de quase morte, kirliangrafia, pesquisas atuais sobre reencarnação e mediunidade, magnetismo e outros, abrem verdadeiras janelas para o estudo do espírito.
Acreditamos, como espírita que somos, que Allan Kardec foi um verdadeiro precursor deste movimento em direção ao que podemos chamar de “espiritualismo científico”. Neste movimento, alguns temas tradicionais da reflexão espiritualista, acabam por entrar para o domínio a ciência. Trata-se, enfim, de uma verdadeira revolução no campo do conhecimento que, acreditamos, já está em andamento, apesar de todas as resistências.

BIBLIOGRAFIA

AIZPÚRUA, Jon. Os Fundamentos do Espiritismo. São Paulo, Editora C.E. José Barroso, 2000.
ANTISERI, Dario- REALE Giovanni. História da Filosofia -Filosofia Pagã antiga- Vol. I.São Paulo, Ed. Paulus,2003.
ANTISERI, DARIO – REALE Giovanni. História da Filosofia- De Nietzsche à Escola de Frankfurt- Vol 6.São Paulo, Ed. Paulus, 2006
ANTISERI, DARIO – REALE Giovanni. História da Filosofia- De Freud à atualidade. Vol 7. São Paulo. Ed. Paulus, 2006.
CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia..São Paulo, Ed. Ática, 2002.
FERRY, Luc. Aprender a viver-Filosofia para os novos tempos. Rio de Janeiro, Ed. Objetiva, 2010.
INCONTRI, Dora. Pedagogia Espírita- Um projeto brasileiro e suas raízes. Bragança Paulista-SP, Ed. Comenius, 2004.
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MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do Direito.São Paulo, Ed. Atlas, 2009
PIRES, José Herculano. Os Filósofos. São Paulo, Ed. FEESP, 2000.
REALE, Miguel. Filosofia do Direito.São Paulo, Ed. Saraiva,2002.


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[1] CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia..São Paulo, Ed. Ática, 2002, p. 212.
[2] Ibid., p. 209
[3] Ibid., p. 210
[4] Ibid., p. 219
[5] MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do Direito.São Paulo, Ed. Atlas, 2009, p. 239
[6] Ibid., p. 241
[7] Ibid., p. 241
[8] PIRES, José Herculano. Os Filósofos. São Paulo, Ed. FEESP, 2000, p. 231
[9] Ibid., p.232
[10] Ibid., p.232
[11] Ibid., p.236
[12] FERRY, Luc. Aprender a viver-Filosofia para os novos tempos. Rio de Janeiro, Ed. Objetiva, 2010, p. 141
[13] Ibid., p. 140
[14] Ibid., p.147
[15] Ibid., p.149
[16] Ibid., p.148
[17] Ibid., p.150
[18] ANTISERI, DARIO – REALE Giovanni. História da Filosofia- De Freud à atualidade. Vol 7. São Paulo. Ed. Paulus, 2006, p. 113
[19] Ibid., p.113
[20] Ibid., p.117
[21] Ibid., p.117
[22] ANTISERI, DARIO – REALE Giovanni. História da Filosofia- De Nietzsche à Escola de Frankfurt- Vol 6.São Paulo, Ed. Paulus, 2006, p.330

[23] INCONTRI, Dora. Pedagogia Espírita- Um projeto brasileiro e suas raízes. Bragança Paulista-SP, Ed. Comenius, 2004, p.16
[24] Ibid., p.17
[25] Ibid., p.19
[26] KARDEC, Allan. A Gênese. São Paulo, Ed. LAKE, 1999, p.16
[27] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos.São Paulo, Ed.FEESP, 2005, questão 14
[28] REALE, Miguel. Filosofia do Direito.São Paulo, Ed. Saraiva,2002, p.38
[29] Ibid., p.38

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