15º SIMPÓSIO BRASILEIRO DO PENSAMENTO ESPÍRITA
De 02 a 04 de novembro/2017
TEMA: DO DISCURSO À AÇÃO E O
COMPORTAMENTO ESPÍRITA
Jailson Lima de Mendonça
Santos/SP
Esse
trabalho tem como motivação alguns questionamentos e reflexões sobre nosso
comportamento, em especial como espíritas, a responsabilidade do exemplo e também
do distanciamento entre o discurso e a ação no contexto que vivemos.
Consideramos
interessante a capacidade que temos de nos indignar momentaneamente quando
recebemos uma notícia ou um post nas
redes de informação em especial as sociais, as quais muitas vezes nos causam tristeza,
revolta mesmo, enquanto em outros nos levam à reflexão sobre nossa própria vida,
valores, potencialidades e limitações.
Em
alguns casos no sentido positivo, nos embebêssemos de uma vontade que antes não
estava presente, como se fora um impulso, um pensar o que não havíamos pensado,
um querer assumir e acreditar que somos capazes de realizar. Em outros, no
sentido negativo, nos sentimos fragilizados, as vezes impotentes, mas que nos incita
pra fazer, mudar, realizar, mas que no geral se vai esvaindo e voltamos ao
nosso estado de ser tentando nos conformar de que não podemos fazer mais do que
já estamos fazendo. Será?!
Vivemos
em um mundo onde, ainda, as pessoas são analisadas, julgadas e criticadas pela
aparência, pelo visual, por suas posses e não estamos preocupados com o que os
outros efetivamente tem a oferecer, qual a contribuição que tem pra dar e
agregar ao meu próprio aprendizado.
As
notícias que vemos ou fatos que presenciamos no geral nos deixam inertes, como
se não tivéssemos nada a ver com isso. E vem o inquietamento, pois é difícil acreditar
que vivendo no século XXI com a imensidão de conhecimento e informações que já
foram desenvolvidos, pensados e escritos, não nos parece crível que agimos
desta ou daquela maneira e que muitas das atitudes que consideramos aceitáveis
parecem exceções.
Verificamos
que a construção efetiva se dá num passo muito menor do que da nossa capacidade
criativa e intencional. A execução, o agir, esbarra em uma série de artefatos,
concretos ou não, que a nossa vontade não consegue transpor. E porquê?
Somos
todos iguais na origem, e espíritos num processo natural de desenvolvimento
individual, com livre arbítrio e inteligência, mas que necessariamente passamos
ou adquirimos aprendizado através da relação com o outro.
Quando
falamos da distância entre o discurso e ação, será que o falar, por si só não
seria uma ação? Já que ao falarmos estamos de alguma forma nos comprometendo ou
influenciando aquele que escuta?
O
professor do Centro de Análise do Discurso da Universidade de Paris 13, o linguista
francês Patrick Charaudeau diz em "O discurso entre a
ação e a comunicação" de 2002 que “a linguagem é, por si própria, ação, já que ela faz ou faz fazer, seja
expressando de forma direta (“Feche a porta”) ou indireta (“Está fazendo
frio”). Deste ponto de vista surgiu a teoria dos "atos de fala",
promovida por Austin e Searle, que estavam convencidos de que “uma teoria da
linguagem é uma parte de uma teoria da ação”. Observaremos aqui que a relação
entre a linguagem e a ação é uma relação de fusão de uma na outra: não há,
nesta perspectiva, combinação entre ação e linguagem, mas integração da ação na
linguagem. O exemplo emblemático disso é o ato performativo (“Eu vos declaro
unidos pelos laços do matrimônio”) onde o dizer, descrevendo sua própria ação,
torna-se ação. A ação não é, portanto, exterior à linguagem, e esta, não
possuindo existência autônoma, não pode exercer por sua vez uma influência
sobre a própria linguagem.”
Naquela
palestra o professor ainda acrescenta que “A
intenção, contrariamente ao fim, não é outra coisa que a intenção de
influenciar o outro, de produzir nele um efeito ("efeito visado") que
o leve a modificar sua própria intenção. É apenas na observação do
comportamento do outro ("efeito produzido") que poderá ser medido o
impacto do efeito visado”.
Bom,
essa discussão não é nova, desde Aristóteles, a ação é considerada levando-se
em conta o sentido social que a mesma gera e em relação aos geradores dos fatos
sociais.
As
ações dos seres humanos, ou melhor, dos espíritos encarnados, são representadas
por uma linguagem verbal ou não que de toda forma gerará consequências a partir
da capacidade representativa do autor e sua vontade, ou seja, do seu campo de
influência e dos diversos motivos que animam os interesses pessoais e
coletivos.
“(...) a virtude está em nosso poder,
do mesmo modo que o vício, pois quando depende de nós o agir, também depende o
não agir, e vice-versa. De modo que quando temos o poder de agir quando isso é
nobre, também temos o de não agir quando é vil; e se está em nosso poder o não
agir quando isso é nobre, também está o agir quando isso é vil. Logo, depende
de nós praticar atos nobres ou vis, e se é isso que se entende por ser bom ou
mau, então depende de nós sermos virtuosos ou viciosos".
(Aristóteles, III)
E
nesse momento que vivemos um período de revisão de valores é preciso ceder
espaço à reflexão de que quanto mais se assume o que se é, embora não sem dor,
abre-se caminho para a felicidade.
No
livro O Problema do Ser, do Destino e da Dor, Léon Denis nos fala da vontade
como a maior das potências e que “O
princípio de evolução não está na matéria, está na vontade, cuja ação tanto se
estende à ordem invisível das coisas como à ordem visível e material. Esta é
simplesmente a consequência daquela. O princípio superior, o motor da
existência, é a vontade”. E mais adiante “Querer é poder! O poder da vontade é
ilimitado. O homem, consciente de si mesmo, de seus recursos latentes, sente
crescerem suas forças na razão dos esforços. Sabe que tudo o que de bem e bom
desejar há de, mais cedo ou mais tarde, realizar-se inevitavelmente, ou na
atualidade ou na série das suas existências, quando seu pensamento se puser de
acordo com a Lei Divina”.
Atualmente,
em especial com a difusão das redes sociais, verificamos como as pessoas se
sentem muito mais a vontade ou persuadidas a interagir, pois com um único
clique se pode replicar ou transmitir algo que tenham “curtido”, tanto para o
bem como para o mal, sem que muitas vezes tenham checado seu conteúdo,
veracidade e muito menos avaliado as consequencias da repercussão de tal
informação.
E
assim, nós somos agentes e/ou receptores de tais situações, suscetíveis e
sensíveis a frustração, decepção, mágoa, etc ou ao júbilo, alegria e entusiasmo
dos resultados obtidos ou não, num linguajar atual se fomos ou não curtidos.
O
homem, tanto nas grandes ou pequenas ações do cotidiano, perde a oportunidade em
ter uma atitude de respeito aos pontos de vista dos outros e de compreensão
para com suas eventuais fraquezas, ou seja, de exercitar a tolerância, cuja
virtude é a potência do ato, onde reflete seu próprio progresso e a disposição
de se atualizar.
O
comportamento humano é a atitude do ser perante a vida, sua postura no cotidiano,
seus procedimentos e reações com o outro.
Como a atitude é uma intenção de se comportar
de certa maneira, a intenção pode ou não ser consumada, dependendo da situação
ou das circunstâncias.
E as mudanças nas atitudes de uma pessoa podem demorar
muito para causar mudanças de comportamento que, em alguns casos, podem nem
chegar a ocorrer.
Cada
pessoa deve ser vista e analisada de acordo com suas particularidades, até
porque somos uma individualidade, com nossos vícios e imperfeições, mas também
com nossas virtudes, portanto é bom lembrar que as grandes variedades que o comportamento humano apresenta, não
podem servir de regras para todas as outras pessoas, pois cada ser apresenta
características individuais.
Segundo
Aristóteles, a virtude deve ficar no meio, ou seja, nem se exceder para cima e
nem para baixo, por exemplo o excesso de humildade pode transformar-se em
orgulho e o excesso de orgulho pode transformar-se em humildade. O que nos
sugere que a tolerância as vezes demonstrada pode não ser verdadeira.
Então,
a verdadeira tolerância deve ser humilde, mas convicta. Respeitar as ideias e
condutas dos demais, sem desprezá-las, mas também sem minimizar as diferenças,
porque sabe que é a contradição que leva ao bem comum.
Devemos
agir com parcimônia, mas quais são os limites da virtude da tolerância?
Pensamos que pode se resumir em dois princípios: “Não faças aos outros o que
não queres que te façam a ti” e “Não deixes que te façam o que não farias a
outrem”.
COMPORTAMENTO
ESPÍRITA
Neste
ponto paramos para refletir sobre quais outros subsídios o Espiritismo nos
oferece para uma melhor interpretação do tema e lembramos daquele pequeno,
mas importante livro Comportamento Espírita, resultado de uma conferência de
Jaci Régis para um grupo de jovens em uma confraternização espírita (COMELESP)
no início dos anos 80, encontramos a preocupação do autor em tratar da questão
do comportamento e sua repercussão:
“Por
fim, uma abordagem sobre o comportamento não é um julgamento. É uma discussão
aberta, simples e objetiva das formas de interação social e humana que decorrem
e resultam da existência e da vida.
Tal
é o nosso propósito. Queremos apenas suscitar debates, comentários e reflexões.
Para equacionar, porém, a análise que pretendemos fazer, levantamos, como
hipótese de trabalho, as seguintes questões, que terão desenvolvimento nos
capítulos desta obra:
1.
O comportamento
espírita é naturalmente diferente ou deve esforçar-se para ser?
2.
Se o espiritismo
não impõe regras, como se definirá o comportamento espírita?
3.
Vivendo no mundo,
como superar as exigências, os desafios, as necessidades, sem comprometer-se
espiritualmente?
4.
Como se situar
diante do apelo aos excessos e vícios que estão presentes e são estimulados no
mundo?
5.
De que maneira
compreender e usar as forças sexuais?
O
comportamento é a expressão da individualidade, exteriorizada em atos,
palavras, gestos, ações e interiorizada em pensamentos, ideias, desejos,
constituindo o que se chama de personalidade.
Na
encarnação, admitem-se comportamentos específicos, próprios aos vários níveis
de idade. São decorrentes de experiências cristalizadas na mente imperecível e
desencadeadas, em cada encarnação, de acordo com as circunstâncias e as
condições do ambiente.
É inegável que o espiritismo propõe uma nova visão
de vida e do homem. É a partir dessas ideias básicas que se erguerá o
comportamento espírita.
A proposta do espiritismo, relativamente ao
comportamento, é dinâmica. Isso significa, objetivamente, que o espiritismo não
nos sugere qualquer comportamento que se expresse antinaturalmente ou que
signifique uma posição alienada, isto é, afastada da realidade e transferida
para o além.”
ALGUMAS
REFLEXÕES:
ü De nada adianta as pessoas terem um excelente
currículo e discurso se não conseguirem tratar o outro com civilidade (não
estamos falando de amor).
ü Devemos nos preocupar em demonstrar, através do
exemplo, respeito por todos aqueles com os quais nos relacionamos, a começar
dentro do próprio lar.
ü É comum justificarmos que as preocupações em
excesso, a ansiedade dos tempos modernos e a falta de tempo são responsáveis
por comportamentos grosseiros.
ü Comportamentos injustificáveis nos mostram que está
faltando controle sobre as próprias ações e, acima de tudo, respeito para com o
próximo.
ü Pode parecer difícil agir com amabilidade no mundo
competitivo e individualista em que vivemos, mas não devemos abrir mão de
nossas convicções.
ü É lamentável que as expressões Com licença, Por
favor e Obrigado estejam sendo usadas com menor frequência.
ü Caso venhamos a sofrer indelicadezas, não nos
deixemos envolver por essas atitudes e sigamos em frente dando bom exemplo,
mesmo que seja através do nosso silêncio.
Não dá para fugir, se aqui estamos, estamos para fazer e
realizar, assumindo a responsabilidade dos nossos pensamentos, ações e
comportamentos, a parte que nos cabe na construção de uma nova sociedade mais ética,
justa e fraterna.
Questionamentos, dificuldades, resistências e reflexões
haverão, mas não há mudanças sem esforço e comprometimento.
Somos
espíritos e temos nosso livre-arbítrio o que significa a possibilidade de
optarmos entre muitas variáveis, exercendo o direito de escolha e praticando o
exercício da vontade como garantia do poder de executar nossa decisão. Ora,
todas essas atitudes só se concretizarão a partir de uma base de conhecimento
do porquê, das razões e de se ter um consistente objetivo para a vida.
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