ESPIRITISMO E PANDEMIA
TEXTO DE RICARDO NUNES APRESENTADO NA MESA REDONDA “ESPIRITISMO E PANDEMIA” NO XXIII CONGRESSO DA CEPA EM 08 DE OUTUBRO DE 2021
É
interessante observar que em uma época de individualismo exacerbado promovido
por concepções neoliberais de economia, política e sociedade, um vírus, um
simples e invisível vírus, denominado COVID 19, acentuou ainda mais a separação
entre as pessoas.
Na
verdade, muitos de nós já vivíamos sob a perspectiva do isolamento introjetando
os valores da sociabilidade capitalista, os quais apontam para o ter e não para
o ser, para o egoísmo e não para o altruísmo. Infelizmente, temos
frequentemente esquecido que o bem-estar e o equilíbrio do grupo social são
fundamentais para a existência e felicidade de cada indivíduo e que os laços
sociais são uma espécie de oxigênio da vida.
Durante
a pandemia do vírus não pudemos mais nos abraçar, não pudemos nos beijar, não
pudemos nos aproximar. Ficamos reclusos em nossas casas tentando organizar os
espaços de fora, e nos deparando muitas vezes com os vazios de dentro. O velho
ditado “tempo é dinheiro” perdeu o sentido. Aquela sensação de ocupação e
pressa nos abandonou por esses longos meses.
Tivemos
que exercitar a paciência, a espera, e os dias passaram devagar. Passamos a
trabalhar em casa misturando nossos materiais de trabalho com o ambiente
doméstico e com os brinquedos de nossos filhos, renunciamos aos lazeres e
passeios, nos afastamos de familiares e amigos. Muitos de nós perdemos entes
queridos. Familiares e amigos partiram para o mundo maior, para o mundo dos
Espíritos, enchendo-nos o coração de dor e saudade, sendo a filosofia espírita
o mais forte apoio aos nossos pensamentos e emoções nestes graves momentos.
O
vírus certamente trará grandes lições. Sairemos melhores desta crise?
Aprenderemos alguma coisa? É difícil dizer.
E o espiritismo, enquanto filosofia
espiritualista, o que tem a dizer em um momento tão difícil para a humanidade? A
filosofia espírita descortina a todos novos horizontes existenciais. Nos ensina
que tudo passa, se transforma e evolui.
Segundo o espiritismo, das sociedades agrárias
às sociedades pós-industriais, estamos submetidos a um complexo processo
evolutivo, não uniforme, sem dúvida sujeito a avanços e retrocessos no terreno
da história, porém rumo a patamares superiores de civilização, sendo que tal
processo evolutivo se dá pelas leis psicofísicas da reencarnação.
O
espiritismo ensina que a vida, em si mesma, é imperecível e transcendente. Que
acima de tudo somos e que continuaremos a ser mesmo após a morte. Ensina a
confiança na razão, na ciência, na capacidade do ser humano em resolver os seus
problemas. Lembra que a dor e o prazer, a vida e a morte,
a tristeza e a felicidade, são fatores inerentes às leis naturais do planeta em
que vivemos, sem desconsiderar, é claro, os excessos e equívocos humanos na
produção de sofrimentos.
Nos conscientiza que somos os protagonistas do
nosso destino, sem desprezar os determinismos de variada natureza que incidem
sobre nossas vidas. Esclarece a
importância do amor e da solidariedade na construção de um ser humano e de um
mundo melhor.
Que
possamos, a partir das lições deste difícil período, ter clareza da importância
de nossa existência terrestre em nosso desenvolvimento individual e coletivo.
Que aprendamos a cultivar uma nova sociabilidade não mais centrada apenas no “eu”,
mas que considere o “nós”. Que compreendamos a terra como nossa casa comum a ser
preservada e que nos conscientizemos da rede invisível que nos entrelaça a
todos, em uma trama de ações e reações sob a perspectiva dialética
indivíduo-sociedade.
Uma
das grandes lições do vírus é a de que ele não é democrático, pois atingiu preferencialmente
os pobres e despossuídos, os quais ficaram mais expostos e vulneráveis por
viverem em habitações precárias que não permitem os devidos cuidados de
afastamento social, e também por terem tido que sair às ruas, em meio à maior
crise de saúde pública de nosso século, na busca do pão de cada dia.
Apesar disso, constatamos, que o aristocrata,
o milionário, e o trabalhador são iguais em fragilidade física. Ficou claro
para aqueles que tem “olhos de ver” que o dilema economia X saúde é um falso
dilema. Sem trabalhadores saudáveis não há possibilidade de se construir uma
sociedade economicamente forte.
A prioridade em qualquer sociedade civilizada
deve ser a vida e não o capital, mesmo porque todos sabemos que o problema do
mundo não é falta de dinheiro, mas sim a concentração da riqueza nas mãos de
minorias privilegiadas.
Outra
lição fundamental deste período, foi a que nos ensinou que o risco de morte
repentina é uma realidade mais próxima do que imaginávamos, o que nos fez compreender
que o amanhã na Terra é apenas uma possibilidade. Compreendemos, efetivamente,
a importância do agora.
Esta
crise da pandemia também abriu algumas poucas janelas de oportunidade.
Parece-me que a maior delas se deu no campo das comunicações. Este congresso
virtual da CEPA, reunindo espíritas das Américas e da Europa, sem saírem de suas
casas, é um bom exemplo desse novo tempo que se inicia.
Finalmente,
gostaria de fazer alguns agradecimentos:
Em
primeiro lugar, aos profissionais de saúde, em especial aos médicos e enfermeiros
que ficaram na linha de frente no combate ao COVID 19.
Aos
cientistas que trabalharam intensamente com vistas a descobrir as vacinas
necessárias ao enfrentamento desta doença. Sonho com o dia em que as conquistas
da ciência beneficiarão toda a humanidade.
A
todos os trabalhadores dos supermercados, farmácias e comércios em geral que
mantiveram a economia básica funcionando, com vistas a evitar a escassez de alimentos
e produtos fundamentais.
A
todos os professores que mantiveram sua tarefa de ensinar mesmo à distância,
sem poder contar com a presença física e a alegria de seus alunos.
A
todos os governos que promoveram a valorização da ciência e compreenderam a
necessidade das estratégias de afastamento social e, por isso, cumpriram com seu
dever de cuidado perante seus cidadãos.
A
todos os Estados que possuem um sistema de saúde público, universal e gratuíto.
Ficou absolutamente claro que os países que tinham sistemas públicos de saúde
estavam mais aparelhados para enfrentar essa tremenda crise.
Em relação ao Brasil, meu país, deixo minha
especial homenagem ao SUS (Sistema Único de Saúde), sistema que luta para
sobreviver ante a carência de verbas de financiamento, mas que possui em seus
quadros verdadeiros heróis na luta contra a pandemia e contra as doenças em geral.
Os profissionais e militantes dos SUS têm nos ensinado que medicina e saúde não
devem ser compreendidas como mercadorias.
A
todos os cidadãos do mundo que não deixaram de acreditar na ciência em tempos
de negacionismo científico. Cabe-nos, agora, manter a esperança em dias
melhores. E, juntamente com Chico Buarque de Hollanda, cantor, compositor e
escritor brasileiro, repetir a frase da canção: “Amanhã vai ser outro dia”.
Vírus da política neoliberal e da esquerdalhada que o utilizou para minar um governo eleito;
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