O desafio de manter a serenidade em tempos de mudanças socias
Trabalho apresentado no XXIII Congresso Espírita Panamericano
Tivemos a oportunidade de fazer parte deste evento
mundial e poder apresentar uma reflexão mais positiva a respeito do gênero
humano. Procuramos demonstrar que não há nada na história recente da humanidade
que nos desanime e que não nos permita pensar que estamos evoluindo como
espíritos. Como em tudo na vida a evolução não se dá em linha reta, precisamos
entender os nossos ciclos.
Notamos,
mesmo entre os espíritas um comportamento muito próximo das pessoas não
espíritas, o fato de sabermos que somos imortais não parece arrefecer o impulso
a ações mais ríspidas, ou mesmo exageradas.
O
Espiritismo nos ensina o caminho do meio, a moderação o controle de nosso
impulsos a temperança.
Buscamos
trazer aqui trechos de artigos publicados por diversos autores nas páginas do
Jornal Abertura palavras que nos animem e que nos ajudem a manter a serenidade.
Nas
palavras de Jaci Régis:
“O
Novo modelo (Doutrina Kardecista) identifica o ser humano, prioritariamente,
como um Espírito imortal, evoluindo através de sucessivas encarnações. Embora a
extraordinária e fundamental importância da vida corpórea para o Espírito, o
nascimento, a existência e a morte no campo corpóreo é apenas um segmento da
vida, na sua expressão imorredoura, progressiva e dinâmica.”[1]
Finalmente concluiremos que uma das missões do espiritismo é demonstrar na prática que este comportamento sereno é possível, que se pode criticar e com isto aprender a melhorar, mas não podemos perder a tranquilidade porque a imortalidade dinâmica nos ensina que esta caminhada é longa e tem percalços, mas por isto mesmo é bonita.
O momento em que o Espiritismo surge – ambiente
A primeira vez que uma pessoa lê o Livro dos Espíritos
percebe imediatamente que se trata de um diálogo tranquilo entre o mestre
Kardec e os Espíritos que colaboraram na sua elaboração.
Muitos podem imediatamente pensar que Kardec que
residia em Paris, na França onde todos sabemos que o trabalho foi desenvolvido,
vivia momentos tranquilos, mas a realidade pessoal e social não era bem assim.
Mas isto não o impediu de ser sereno na condução da elaboração da Doutrina
Espírita.
Tentarei montar o quadro da situação geopolítica na
Europa nos anos 50 e 60 do século 19.
Buscando concentrar nos principais conflitos no mundo de então nos quais
a França esteve de alguma forma envolvida:
(ver o vídeo)
Peço aos historiadores que me perdoem por não
aprofundar em demasia e não incluir todos os conflitos que havia na época entre
países europeus em suas colônias, que só eram mantidas a força. Assim como a
luta entre eles mesmos, mundo a fora.
Este quadro histórico demonstra, que mesmo neste
ambiente conturbado, Kardec não transcendia estas aflições que certamente o
acometiam à construção do Espiritismo.
Allan Kardec o bom senso encarnado se focava nas
relações humanas e espirituais, nos aspectos individuais, ou seja, aqueles que
contribuíam para o crescimento do ser espiritual. Isto não significa que Kardec
e os espíritos superiores consideravam a guerra ou os abusos de crueldade algo
desprezível. Para tal nos deixaram a chamada Lei da Destruição (Livro Terceiro
– capítulo VI do LE).
No entanto estes problemas não eram a sua prioridade,
ele os julgava temporários, com a evolução humana os conflitos tenderiam a se
reduzir. Isto claro não aconteceu imediatamente, para Kardec parecia que as
mudanças seriam muito mais rápidas, mas estas mudanças de fato estão
acontecendo vagarosamente.
Se olharmos o século 19 tivemos as guerras
Napoleônicas, a guerra do Congo e a Revolta Taipé na China que juntas mataram
mais de 27 milhões de pessoas, no século 20 com a primeira Guerra Mundial, a II
Guerra Mundial e a revolução Russa que juntas levaram a morte a mais de 60
milhões de pessoas segundo a revista Superinteressante, outros conflitos
levaram muito mais pessoas para o Plano Espiritual.
Já nos 21 anos de século XXI, nos principais conflitos
que de alguma maneira ainda persistem até os dias de hoje, como: a guerra do
Iêmen; a guerra de Boro Karan; do Afeganistão; do Iraque; do Sudão e da Síria
(todas tem como vínculo causal as disputas internas do islamismo combinada com
a proximidade de grandes jazidas petrolíferas). Estes enfrentamentos levaram a
morte cerca de 1 milhão de pessoas e milhões de refugiados.
Fica claro que os mecanismos internacionais, ainda que
deficientes estão sendo capazes de reduzir os efeitos terríveis, de mortes
inúteis nas guerras.
Não há dúvida de que vivemos num mundo muito melhor do
que aquele onde Kardec desenvolveu a Doutrina Espírita.
Evidências de que Kardec se manteve sereno
Reforçamos então a mensagem de que o Espiritismo surge
para nos dar tranquilidade diante das intempéries da sociedade. Na introdução
do Livro dos Espíritos[1]
Kardec assim nos ensina “ Os bons
Espíritos nos solicitam para o bem, nos sustentam nas provas da vida e nos
ajudam a suportá-las com coragem e resignação; os maus nos solicitam ao mal: é
para eles uma alegria nos ver sucumbir e nos assemelharmos a eles.” Como na
música de Roberto Carlos “se o bem e o mal existem, você pode escolher, é
preciso saber viver”.
Para saber viver é preciso ter clareza sobre quais problemas do mundo
temos capacidade de influenciar e quais estão fora de nosso alcance, procuremos
atuar naqueles que podemos fazer algo e acreditar que há boas pessoas que podem
fazer o mesmo nos problemas em que a solução está fora de nosso alcance como
indivíduo. (Alexandre
Cardia Machado – A tranquilidade Espírita -março 2020 -Jornal Abertura)
O momento em que
vivemos hoje – A Parábola da calçada (assista o vídeo no Youtube)
Esta foto da calçada da
Ponta da Praia em Santos, nos ajudará a ilustrar a mensagem que gostaríamos de
passar A calçada, assim como a nossa democracia é um caminho, para o bem estar.
Santos é uma cidade que possui seis quilômetros de praia, na área urbana, na
sua maior parte possui um grande jardim, mas quanto mais nos aproximamos da
Ponta da Praia, bairro mais próximo ao Guarujá, o jardim termina e ficamos
apenas com a calçada.
Andar por este caminho é
exercer a democracia na prática, pois o espaço é justo e é compartilhado por
pescadores, gente carregando canoas, foodtruck para dar um
novo nome aos traillers que vendem alimentos, alguns poucos
bares nos piers existentes, turistas, gente correndo, cães com ou sem
coleiras, carrinhos de bebê e muita gente. Todos andando desordenadamente, cada
qual exercendo seus direitos individuais do livre ir e vir.
O que isto tem a ver com
a democracia? Bem a democracia é uma ideia boa, pois permite que todos
expressem suas ideias, ideologias e disputem o mesmo pedaço de forma
organizada. No caso a disputa do governo de um país, estado ou municípios.
Neste espaço estreito da
calçada temos que negociar a passagem, a velocidade com que nos deslocamos a
fim de que todos possam usufruir dela. Isso é o que acontece com as
democracias. Tudo isto faz parte da Lei de Sociedade. Precisamos negociar os
limites de nossas ideias que em algum momento entram em choque. Quando tudo
parece bem, acontecem eventos não esperados. No caso aqui apresentado, as
ressacas, nas democracias, as crises, geralmente associadas a grandes perdas
balanço de pagamentos internacional, guerras, pandemias ou preços das comodites.
O que vemos é que 5 anos depois a calçada está mais larga e mais resistente,
assim como nós deveríamos ficar no convívio com o processo democrático.
Este fenômeno de
mudanças mais ou menos radicais no equilíbrio dos partidos se dá de forma
global, em muitos países, há costumeiramente uma mudança, sempre que um governo
lança um país em uma crise, ou não consegue sair dela. Nestas condições
acontecerá o que ocorreu na França, Itália, Grécia e Espanha com guinadas ora
para a esquerda, ora para a direita, só para citar alguns exemplos. Mas a
vontade popular é que a democracia sobreviva.
Allan Kardec, chamado
por seus contemporâneos de o bom senso encarnado, já atribuía o bom senso ao
avanço intelecto-moral. Assim como na calçada da Ponta da Praia, e na política
a busca pelo equilíbrio é proporcional ao bom senso nosso de cada dia (Machado, Alexandre - O difícil caminho da
democracia - editorial jornal Abertura de novembro de 2016).
Serenidade
Sobre como enfrentar a
realidade e o Estado de Bem Estar Social - O Pensador francês Luc Ferry muitas
vezes citado neste periódico, em seu livro “ A Revolução do Amor” de 2010 nos
apresenta um texto, contido no capítulo - Três fortes
objeções contra uma “política do amor” - que gostaria de
reproduzir aqui alguns trechos, como contribuição ao debate que nos assola nos
dias de hoje e convidar os leitores a revisar este livro.
“Alguns pensam que
com a crise “vamos retornar a um pouco mais de generosidade, a um pouco menos
de egoísmo” porque eles não compreenderam nada de economia nem da humanidade.
Retornar (retrotopia)? ... Vocês acreditam que a sociedade do século XIX era
mais generosa e menos egoísta que a nossa? Releiam Balzac e Zola!” – André
Comte-Sponville – O gosto de viver”.
Não se poderia dizer
melhor. Concordo que se deva apelar para o ideal para criticar o real. Mas,
nessas condições, a menor das exigências consiste em indicar de que real se
fala, e que ideal se exige. Ora, apesar de todos os defeitos que se queira
encontrar, o real dos Estados de bem-estar social europeus é simplesmente o
mais suave que já se conheceu na história humana.
Quanto ao ideal em nome
do qual ele é criticado, o mínimo é que ele exiba claramente os motivos que nos
permitam ter a menor esperança de que ele fará melhor, e não, como de costume,
infinitamente pior. Vocês me permitirão duvidar ainda e sempre, mais do que
nunca, de que o marxismo-leninismo enfeitado com um pouco de maoísmo e de trotskismo,
doutrinas que sempre produziram as piores catástrofes humanas por toda parte
onde foram impostas aos povos, esteja hoje pronto para fazer melhor do que esse
misto admirável de liberdade e bem-estar que, bem ou mal, conseguiram garantir
nossas repúblicas democráticas.”
Luc Ferry expressa
claramente o porquê da rejeição aos partidos socialistas que vem ocorrendo
repetitivamente mundo afora, eles não apresentam históricos convincentes de
sucesso. Onde atingiram algum sucesso, foi à custa de muitas vidas e pela
supressão da liberdade. A guinada ao centro que estamos presenciando é uma
aposta da sociedade na busca deste estado de bem-estar social. Que é
social-democrata, que é capitalista, mas com viés social, que não é estatizante
e que valoriza a produtividade.
A Tão Complexa Lei do
Progresso
Gostaríamos de discutir
um pouco esta importante Lei Natural que é a lei do progresso onde muito bem,
nos explicam os Espíritos tem como maiores obstáculos ao seu desenvolvimento
natural no orgulho e o egoísmo.
Da Questão 793 do Livro
dos Espíritos quero extrair uma frase importantíssima “À medida que a
civilização se aperfeiçoa, faz cessar alguns dos males que gerou, males que
desaparecerão todos com o progresso moral.” Vejam a pergunta e uma parte da
resposta abaixo:
“793. Por que indícios
se pode reconhecer uma civilização completa?
“Reconhecê-la-eis pelo
desenvolvimento moral. Credes que estais muito adiantados, porque tendes feito
grandes descobertas e obtido maravilhosas invenções; porque vos alojais e
vestis melhor do que os selvagens. Todavia, não tereis verdadeiramente o
direito de dizer-vos civilizados, senão quando de vossa sociedade houverdes
banido os vícios que a desonram e quando viverdes como irmãos, praticando a
caridade cristã. Até então, sereis apenas povos esclarecidos, que hão
percorrido a primeira fase da civilização.” A civilização, como todas as
coisas, apresenta gradações diversas. Uma civilização incompleta é um estado
transitório, que gera males especiais, desconhecidos do homem no estado
primitivo. Nem por isso, entretanto, constitui menos um progresso natural,
necessário, que traz consigo o remédio para o mal que causa. À medida
que a civilização se aperfeiçoa, faz cessar alguns dos males que gerou, males
que desaparecerão todos com o progresso moral...”
Enfim fica aqui o
convite à reflexão de nossos leitores.
[1] Kardec, Allan – O livro dos
Espíritos -Ed FEB - Introdução
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