terça-feira, 26 de junho de 2012

Obama e o casamento gay

Marcelo C. Regis – Panamá

O presidente americano Barak Obama anunciou recentemente seu apoio ao casamento gay e se tornou assim o primeiro presidente americano a defender abertamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo. O casamento gay é um direito que avança lentamente nas democracias mais consolidadas e diversos países europeus já aprovaram a medida. Nos Estados Unidos, considerada a mais sólida das democracias ocidentais, essa questão ainda é muito relativizada. Atualmente somente seis estados americanos concedem à união entre pessoas do mesmo sexo o mesmo status legal que o casamento tradicional: New York, Massachusetts, Connecticut, Iowa, Vermont e New Hampshire – alguns outros estados americanos reconhecem alguma forma de união civil entre homossexuais e concedem benefícios mais limitados a esses casais.



Para compreender melhor esse assunto é preciso entender como funciona a federação americana. Historicamente o governo federal americano sempre deixou para os estados a tarefa de definir e sacramentar legalmente o casamento. Porém em 1996 o congresso americano promulgou o Defense of Marriage Act, definindo explicitamente o casamento como a união entre um homem e uma mulher, portanto considerando inválido em nível federal o casamento gay. Porém os estados americanos são independentes para legislar sobre esse tema e sendo assim podem considerar legal em nível estadual o casamento homossexual. Do ponto de vista prático, um casal gay casado em New York é tratado perante a lei estadual e tem acesso aos mesmos benefícios estaduais que qualquer outro casal, porém, como sua união não é reconhecida em nível federal, não tem acesso a nenhum dos benefícios federais tais como seguro social (pensão e aposentadoria,) medicare (seguro médico), food stamps (algo como o bolsa família), partilhas de bens fora do estado, etc. Atualmente 10 países reconhecem o casamento homossexual irrestritamente: Argentina, Bélgica, Canadá, Islândia, Noruega, Países Baixos, Portugal, Espanha, África do Sul e Suécia, porém vários outros países europeus reconhecem alguma forma de união civil entre pessoas do mesmo sexo e oferecem acesso a benefícios similares ou idênticos aos casais heterossexuais (adoção, herança, decisões medicas, etc.). Casamentos desse tipo também são realizados e reconhecidos no estado brasileiro de Alagoas e na Cidade do México.


Obviamente, nenhum país muçulmano aceita a união homossexual tratando-a como crime capital, punível até com a pena de morte. China e Índia também não tem legislação sobre o tema. Portanto, como quase sempre ocorre com avanços sociais e direitos humanos, são os países ocidentais que lideram o debate. Porem, na maior democracia do planeta o tema alimenta debates apaixonados entre conservadores e liberais e promete esquentar mais durante a campanha eleitoral. O debate entre as partes normalmente concentra-se em volta dos seguintes argumentos:


Argumentos contrários: moralmente a união homossexual seria contrária aos desígnios de Deus, conforme definido pelo cristianismo e outras religiões. Alguns argumentam que haveria um grande impacto na criação e desenvolvimento das crianças criadas por esses casais, impactando as novas gerações e colocando em risco a estabilidade e prosperidade do país. A união gay destruiria os valores familiares que são a base da sociedade, estimularia mais pessoas ao homossexualismo e também facilitaria a legalização da poligamia – afinal ao abrir-se o caminho para a união gay, por que não reconhecer outras formas heterodoxas de casamento? Os contrários as uniões homossexuais sustentam que crianças criadas em lares homossexuais estariam mais expostas e mais inclinadas ao homossexualismo e que ao perderem a referência do modelo familiar tradicional estariam mais propensas ao desenvolvimento de problemas psicológicos e a serem mais infelizes. Em geral se parte do pressuposto que o homossexualismo seria um mal, uma doença ou aberração e que legalizar o casamento gay, seria como legalizar qualquer outra aberração sexual e portanto a sociedade não deveria incentivar tal prática.


Argumentos a favor: legalmente os argumentos se concentram em que o homossexual ao pagar seus impostos como qualquer outro cidadão teria os mesmos direitos e deveres legais que qualquer outro heterossexual. Além disso, o reconhecimento legal viria apenas reconhecer algo amplamente aceito e praticado abertamente e evitaria os constrangimentos atuais – hoje mesmo que estejam juntos por mais de 30 anos, um parceiro do mesmo sexo não tem direito de opinar sobre decisões médicas, não tem acesso ao seguro médico federal, nem ao plano de pensão federal do parceiro, não tem direitos legais na herança e partilha de bens do parceiro, etc. A união gay conta também com amplo apoio da comunidade científica no que se refere à saúde mental e psicológica de filhos criados por casais gays. Diversas associações médicas e psicológicas americanas concordam que não há nenhuma evidência negativa que justifique a proibição da união e constituição de família por pessoas do mesmo sexo. De fato os dados disponíveis confirmam que crianças criadas por casais gay têm exatamente o mesmo desenvolvimento que qualquer outra criança. Também não se achou nenhuma correlação entre homossexualismo dos filhos e preferência sexual dos pais ou qualquer outro indício de que a perda da referência familiar tradicional impacte o desenvolvimento normal e sadio das crianças.


Espiritismo: o Livro dos Espíritos trata o casamento implicitamente como a união entre um homem e uma mulher e não encontramos muitas referências a homossexualidade nas obras básicas. A realidade é que o homossexualismo está presente em nossa cultura e sociedade desde os tempos tribais, é uma realidade e não é possível ignorá-lo. Parece-me o mais justo e condizente com a Doutrina Espirita deixar que pessoas adultas definam seus próprios destinos, desde que não prejudiquem um ao outro, a sociedade ou a comunidade em geral. Dessa forma me parece que mais dia, menos dia todos os países democráticos irão reconhecer legalmente a união homossexual e conceder a esses cidadãos os mesmos direitos e deveres impostos a qualquer outro casal.
publicado originalmente no ABERTURA de Junho de 2012

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