A igualdade natural e a farsa do coletivo
"O
perigo de uma meia verdade é você dizer exatamente a metade que é mentira"
(Millôr Fernandes).
"Em
todo ser humano existe algo de sagrado. Mas sagrada não é sua pessoa. Tampouco
a pessoa humana. Sagrado é apenas ele, ser humano" (Simone Weil).
Allan
Kardec complementando a resposta dos espíritos à pergunta 803 do Livro dos
Espíritos afirma que "todos os homens serão submetidos às mesmas leis da
Natureza. Todos nascem com a mesma fraqueza, estão sujeitos às mesmas dores e o
corpo do rico se destroi como o do pobre. Portanto, Deus não deu, a nenhum homem, superioridade natural, nem pelo
nascimento, nem pela morte. Diante dele, todos são iguais".
Se
é verdade como dizem os espíritos que os homens procuram a sociedade por
instinto e que devem concorrer para o progresso ajudando-se mutuamente, não é
menos verdade que o espírito individualmente tomará as decisões por aquilo que
se convenciou chamar de livre escolha. Aqui reside o perigo. De qual perigo
estou falando? De que essa escolha esteja subordinada a uma obediência cega ao
coletivo.
Neste
ano de 2018 completou-se 75 anos da desencarnação da pensadora francesa Simone
Weil. Morreu jovem aos 34 anos de idade. Recomendo a leitura do
livro de sua autoria "Sobre a supressão geral dos Partidos Políticos"
da Editora Iluminuras onde aparece também um texto muito instigante denominado
"A Pessoa e o Sagrado" abordando a questão do coletivo, da pessoa, o
impessoal, o direito e a justiça.
Concordo
plenamente com ela ao afirmar que "a paixão coletiva é uma compulsão para
o crime e a mentira infinitivamente mais poderosa que qualquer paixão
individual". O nazismo, o fascismo e o comunismo estão aí para comprovar
tal afirmação. Segue daí que se uma paixão coletiva toma conta de um país
inteiro, o país todo é unânime no crime. Daí a critica feita por Simone Weil
aos partidos polítcos, que à sua época teriam se transformado numa máquina de
fabricar paixões coletivas. E não seria semelhante nos dias de hoje?
Para
Jesus de Nazaré só o bem é o fim a ser alcançado, quando diz que quem
quiser ser o maior que sirva a todos. Isso só é possível pela decisão
individual de me construir num homem de bem. Pode e deve influenciar a
sociedade ou ser influenciado por ela, mas sua afirmação como espírito livre só
existe se não estiver subordinado a nenhuma teoria de cunho coletivo. O
problema neste é que inexiste uma procura do que poderíamos chamar de
impessoal a nos ajudar na caminhada da encarnação, algo que a doutrina espírita
nos fornece numa dimensão acima do coletivo, o dirigir-se para a verdade.
É
uma construção basicamente individual. O que nos garante que teremos sucesso? A
existência de uma inteligência suprema e causa primária de todas as coisas. E a
lei natural existente na consciência de cada um.
Afirmações
tais como a dos espíritos à pergunta 812 "É possível os homens se
entenderem"? Falando que os homens se entenderão quando praticarem a lei
de justiça, só se concretizará segundo Simone Weil ao se acentuar a primazia da
pessoa sobre o coletivo. O bem é o sagrado (não no sentido religioso) e qual
seria sua medida: a verdade, a justiça e apenas em terceiro lugar a utilidade
pública, ou como se fala na linguagem política dos partidos o "bem
públivo" que obviamente no caso dos partidos políticos não é nem um bem,
muito menos público, porque é deles partidos. O modo de caminhar baseado no
coletivo enquadra-se para mim na resposta à pergunta 781 de que só serviram
para entravar a marcha do progresso.
Precisamos
nos "treinar" mais em comportamentos baseados na pessoa humana,
naquilo que todos nós temos de reserva impessoal, termo esse que designa algo
além dos pensamentos "unificadores". É difícil acostumados que
estamos a nos fornecerem as respostas prontas por aqueles que julgam possuir o
discurso competente.
O
Brasil passou 13 anos sob um regime doutrinador de esquerda e vamos agora, tudo
leva a crer, para um regime doutrinador de direita (vide influência das igrejas
evangélicas na escolha do Ministro da Educação). Se o coletivo do partido for
substituído pelo coletivo religioso, o impessoal de cada ser humano ficará
tolhido de manifestar-se, e os "donos do poder " não aceitarão
críticas que coloquem em dúvida decisões coletivas. Isso é péssimo, pois passam
a aceitar placidamente a corrupção do partido como natural ou necessária e a
intolerância religiosa como destino divino.
Tomara
eu esteja errado. Oremos.
Roberto Rufo.
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