Espiritismo,
antídoto contra o fundamentalismo
“Fundamentalistas
dão um toque de arrogante intolerância e rígida indiferença para com aqueles
que não compartilham suas visões de mundo.” (Umberto Eco).
"Se
eu atirasse em alguém numa avenida nova-iorquina, nem por isso perderia um só
voto" (Donald Trump)
"Eu não sou um ditador, mas às vezes a situação
faz com que você se torne um" (Nicolás Maduro).
Em interessante artigo publicado no jornal O Estado de
São Paulo,Dom Odílio Scherer, Cardeal-Arcebispo de São Paulo aborda o tema
"Cultura Bipolar" e a meu ver com razão afirma que vivemos tempos
marcados pela exacerbação ideológica, em que se confundem facilmente valores
com posições ideológicas e partidárias. O que interessa no discurso ideológico
é desqualificar o oponente. Ou se trata de um esquerdista comunista e ateu ou se
trata de um direitista ultra-conservador. Ou se é mortadela ou se é coxinha. Na verdade, trata-se de um debate
paupérrimo de ideias. O articulista está sentado na razão quando assinala que a
complexidade das coisas não cabe necessariamente em duas caixinhas tão
apertadas.
Caso contrário, serei obrigado a admitir como certo o
pensamento de um grande amigo,ex-metroviário como eu, que tentava me convencer
na época do escândalo do mensalão de que na verdade o que estava acontecendo é
que a quadrilha azul queria apenas tirar a quadrilha vermelha do poder. E hoje
esta gostaria de recuperar o lugar de onde foi apeada. O mundo não pode
ser tão simplista assim.
Claro que os extremistas raivosos e as manifestações
de ódio envenenam o convívio social. Segundo D. Odílio Scherer a vida social
alicerçada no respeito às pessoas e no senso de colaboração e justiça faz bem a
todos. O Espiritismo em seu surgimento oficial em 18 de abril
de 1857 com o lançamento do Livro dos Espíritos sempre expressou uma mensagem
ponderada e isenta de preconceitos.
Numa entrevista que Herculano Pires concedeu ao
primeiro Anuário Espírita, em 1964 o jornalista e filósofo foi questionado
sobre diversos temas: parapsicologia, tradução das obras da Codificação,
filosofia e fanatismo.
“Do
ponto de vista espírita, um fanático espírita, é uma aberração, porque o
Espiritismo, está sujeita ao exame crítico. Onde se fala de crítica, no sentido
exato do termo, que é o do exame aprofundado e sereno das coisas, não há lugar
para manifestações de fanatismo”, disse o escritor.
Os sistemas livres, diz H. Pires, correspondem ao
espírito da filosofia; já os sistemas fechados, ao espírito das religiões. Como
a filosofia nasceu da religião, e esta era, interpretada sempre de forma
rigidamente sistemática, durante muito tempo os filósofos elaboraram grandes
sistemas filósofos, que fizeram época. No tempo de Kardec, os sistemas
filosóficos imperavam. O sistema de Hegel (1770-1831), por exemplo, e o de
Tomás de Aquino (1225-1274). E nesse mesmo tempo surgiam dois novos sistemas: o
positivismo e o marxismo. Eram o que podemos chamar “sistemas-sistemáticos”,
construções dogmáticas do pensamento. Os Espíritos Superiores indicaram a
Kardec a inconveniência dessas construções, que encarceravam o pensamento em
determinados princípios. Daí a formulação por Kardec de um “sistema
não-sistemático”, ou seja, livre “dos prejuízos do espírito de sistema”. Uma
doutrina que, à maneira do Evangelho, se constituía de orientações gerais do
pensamento. Este é um aspecto que nos revela a perfeita atualidade do
Espiritismo, no plano filosófico.
O preocupante para mim no debate político exacerbado
de hoje é que não existe um programa de governo de ambos os lados. A luta é pelo
poder. Nas palavras do cientista político e professor da PUC-Rio Luiz
Werneck Vianna há uma realidade nova no país. Tem uma ralé diz ele (no sentido que a pensadora Hannah Arendt a
utiliza),
que pode se tornar uma base de apoio a grupos
fundamentalistas de esquerda e de direita. Não é só pobre não diz o cientista
político. É classe média também. É apenas ressentimento e falta
de valores. A sociedade abdicou de valores, deixou-se
perverter. Cumpre esclarecer o sentido da palavra ralé
apresentada pela pensadora Hannah Arendt (1906-1975) em sua obra magna "As
origens do totalitarismo":
"Ao buscar entender como o nazismo se apossou da
Alemanha, Arendt formula a tese de que a ralé chegou ao poder. Como ela define
o que seja esta ralé? Ela
se funda em grupos residuais de todas as classes sociais, por esta razão lembra
Hannah, é fácil confundi-la com o povo; é como se fosse um grande resto, uma
porção das mais diferentes classes sociais que tem em comum negar a
política e a contradição como instâncias da vida social, por isso sua aversão
à política e às práticas de equalização ou equilíbrio social e às
diferentes instâncias da vida democrática; a ralé tem o ódio como missão e a
violência como seus motores".
Portanto, fica muito claro que o Espiritismo, em
sua teoria racional e equilibrada, quando parte para a prática, só pode apoiar
projetos que façam autocritica permanente, pois dessa forma sempre podem
corrigir desvios inerentes a qualquer processo de gestão. Como subsídio oferece
as Leis Morais do Livro dos Espíritos como exemplificação do que julga ser o
modelo correto de convivência política e social.
Artigo publicado no jornal ABERTURA abril 2020
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