60 anos
de Espiritismo:
Jaci
Régis ao completar 60 anos dedicados ao Espiritismo
Este texto
foi extraído da edição de novembro de 2007, Jaci Régis viria a desencarnar em
dezembro de 2010, podemos perceber a tranquilidade e consciência que Jaci Régis
tinha de seu papel e vida. Republicamos o texto, pois para muitos leitores,
alguns detalhes da vida deste grande pensador podem ter passado despercebidos.
O texto é escrito de próprio punho por Jaci Régis, vale a pena recordar.
“Neste mês
de novembro completo 60 anos de atividades ininterruptas, diárias, no movimento
espírita. Foi neste mês, em 1947, que comecei a participar da então Juventude
Espírita de Santos, transformada em Mocidade Espírita Estudantes da Verdade.
Sessenta anos é um tempo bastante expressivo na vida de cada um. Nesse longo
período a existência se corporificou no casamento, nos 6 filhos, 11 netos e,
agora, na primeira bisneta. O mundo em que reencarnei, era totalmente diferente
do atual. Acompanhar a febril transformação política, social e tecnológica, foi
tarefa de inteligência e flexibilidade. Penso que consegui. De um simples
aparelho de rádio às poderosas transmissões via satélite, estabelecendo novas
formas de comunicação. Do automóvel desprovido e raro, aos carrões que circulam
e se tornaram o sonho de consumo da maioria, da máquina de escrever ao
computador. Do telefone precário de então ao celular e, finalmente, à internet,
deixamos a aldeia circunscrita de meus primeiros dias neste mundo, à aldeias
globais, na qual, a despeito de nosso desejo, estamos imersos até as orelhas.
Li a República de Platão, aos treze anos, na Biblioteca Pública de
Florianópolis, onde reencarnei. Desde sempre estive com livros embora só
tardiamente frequentasse a Universidade, obtendo três títulos, a partir dos 39
anos de idade. Dentro do movimento espírita as coisas também mudaram. Na mesma
década de trinta do século passado em que reencarnei, começou a missão de
Francisco Cândido Xavier, mudando o perfil do Espiritismo que, todavia, fortaleceu-se
como uma religião menor. Primeiramente a iniciação num Espiritismo crítico,
mas, sem dúvida, religioso, cristão.
Embora a
influência do líder naqueles primeiros dias, sempre segui um caminho próprio e
nunca fiquei atrelado a um ídolo ou ícone. Essa independência me rendeu, no
tempo, muitos dissabores, se assim posso referir-me aos entraves,
incompreensões e agressões que recebi. Todavia, jamais me tiraram o ânimo. Tinha
algo a fazer e fiz. Sem missão ou coisa parecida. Os desafios marcaram os
passos. O ideal, a inovação, a criatividade estabeleceram novos caminhos. Mas o
que mais me satisfaz, em termos de doutrina espírita, foi a liberdade de pensar
fora do esquema religioso. Só quem libertou-se dos estritos caminhos do pensar
religioso pode avaliar o que significa essa liberdade. Não é ser antirreligioso,
maldizer as crenças. Nada disso. É ser livre para analisar os fatos sem
preconceitos, aceitar ou rejeitar, duvidar e prosseguir. Um jogo fascinante na
busca de um centro de referência e reflexão. O fato de ser kardecista, de ter
em Kardec a base do pensar, nunca me tolheu, nem me cerceou. A crença é um
direito e deve ser respeitada. Só que, na minha visão, não cabe no Espiritismo,
se ele quiser ser livre pensador, aberto, progressista.
Na verdade,
minha existência terrena se pautou pelo trabalho no movimento espírita. Por
ele, aderi ao Lar Veneranda, onde permaneço há 47 anos e que, posso dizer sem
vaidade, solidifiquei sua estrutura, seu trabalho assistencial, sua destinação.
Uma obra de minha vida. Formatei, também, o pensamento da Mocidade Espírita
Estudantes da Verdade e, consequentemente, do Centro Espírita Allan Kardec em
cuja direção trabalhei muitos anos, estabelecendo seu rumo doutrinário. Há
também o desenvolvimento do gosto de escrever. Dirigi o jornal Espiritismo e
Unificação, da União Municipal Espírita, por mais de 20 anos. Depois, devido a
ruptura, fundei o ABERTURA, em 1987 e continua. Embora, tenha publicado
folhetos e pequeno livreto, foi a partir de 1975, que me tornei um escritor,
publicando oito livros que tiveram, a princípio, muita boa saída,
contabilizando mais de 100 mil livros vendidos.
Desde 1986,
o movimento espírita bloqueou-me. Fiquei na lista dos indesejáveis, as vendas
tiveram uma queda muito grande e milhares de livros estão estocados. No meio
das confusões da ruptura com o movimento religioso, fundei a LICESPE, -
Livraria Cultural Espírita Editora, dentro do Lar Veneranda, em substituição à
Dicesp que criei e presidi no esquema unificador.
E, enfim o
ICKS - Instituto Cultural Kardecista de Santos, uma iniciativa que se encaminha
vitoriosa, abrigando o SBPE, Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita,
iniciado em 1989, como ousada reação ao fechamento imposto pelo sistema
unificado do movimento. Um balanço bastante positivo pelo que vejo.
Na vida
econômica ganho o suficiente para ter uma vida tranquila. Não dependo de
ninguém, casa vazia, só eu e a esposa, enquanto filhos e netos seguem suas
vidas dentro de padrões moralmente muito bons e economicamente satisfatórios.
Não sei quanto tempo ainda estarei por aqui, mas reconheço um grande ganho para
minha alma ao longo de setenta e cinco anos vividos com cardiopatia crônica,
duas cirurgias para colocar pontes de safena, edema pulmonar, angioplastias,
cateterismo, alguns pólipos na bexiga, gastrite crônica, mas assim mesmo
relativamente sadio, pois permaneço ativo.
Essa
pequena síntese que faço ao sabor da memória me remete a todo um caminho no
qual perfilei com pessoas de variadas expressões emotivas e intelectuais, com
as quais aprendi a conviver, a superar impulsos e perdoar atritos. A maioria
foi. Eu fiquei. Ao completar sessenta anos de trabalho doutrinário me sinto
feliz. Meu olhar prossegue atento e mantenho alto meu estandarte de trabalho. Tenho
objetivos. É o que vale”.
Nota:
Artigo originalmente publicado no Jornal Abertura de Santos.
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