quinta-feira, 20 de abril de 2023

Racismo e o Espiritismo por Alexandre Cardia Machado

 Racismo e o Espiritismo 

 

Da mesma forma que a sociedade, como um todo, passamos pelo mesmo processo de crítica à literatura, é o caso dos grupos antirracistas, que lutam pela revisão da história, este é um fato recorrente mundo afora e não seria o Brasil um caso diferente.


As obras literárias escritas antes da Segunda Guerra mundial estão sendo criticadas e em muitos casos forçadas a serem alteradas. 


Pessoalmente, quando leio um livro dos anos 80, ou assisto um filme desta época, espero encontrar lá um pensamento desta época. Não me parece que seja necessário escrever, numa nova edição, ou na apresentação de um filme " esta obra representa o modo de pensar da época em que foi produzida" isto é óbvio. No entanto isto atingiu obras de Allan Kardec. 





Não é possível mudar o passado e a mente eurocentrista de escritores do século XIX. 


Podemos e devemos sim escrever artigos novos, ou outros livros que tratem destes fatos. Devemos nos declarar e praticar o antirracismo. Mas existem muitas dúvidas quanto à forma revisora na fonte. 

Os jornais ligados à CEPA estão o tempo todo analisando, criticando e mesmo propondo mudanças na visão espírita. A própria CEPA, juntamente com o CPDoc lançaram a série literária - Livre Pensar- Espiritismo para o Século XXI, atualizando o pensamento com os avanços científicos e sociais.  

No entanto, tempos de indignação são assim mesmo. Passa-se aqui e ali do ponto, entendemos que não com a intenção de adulterar uma obra, mas contextualizá-la, portanto, conviver com notas explicativas, em livros, não parece um problema.  


Nos anos 80, Herculano Pires fez isto, ao traduzir os livros de Allan Kardec na LAKE, adicionou uma série de notas explicativas, não o fazia na forma de revisão, mas sim com o intuito de esclarecer, ou mesmo trazer para o português coloquial do fim do século XX alguns aspectos que podem trair o leitor.

 

Entretanto é inequívoco que Allan Kardec teve sim uma visão científica equivocada na questão dos indígenas e africanos, algo que nós chamamos a atenção, talvez pela primeira vez, já em 1997 no V Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita, em Cajamar -SP, no trabalho “O ser humano e a evolução, uma análise pré-histórica”, não por menos este artigo é o mais acessado no blog do ICKS. https://icksantos.blogspot.com/2011/12/o-ser-humano-e-evolucao-uma-analise-pre.html. Parte deste texto está incorporado em nosso livro – Uma breve história do Espírito - num capítulo de mesmo nome. 

 

“A posição de Kardec, ... os selvagens também fazem parte da humanidade e alcançarão um dia o nível em que se acham seus irmãos mais velhos. Mas, sem dúvida, não será em corpos da mesma raça física, impróprios a um certo desenvolvimento intelectual e moral”. (Gênese,1868) 
 
A utilização de técnicas genéticas - ... Com relação às raças existentes atualmente, comparando as amostras coletadas dos mais diversos grupos étnicos, os cientistas verificaram serem pequenas e triviais as diferenças entre as raças. “A cor da pele, por exemplo, é resultado de mera adaptação ao clima – negra na África, para se proteger do sol forte; branca na Europa, para facilitar a absorção dos raios ultravioleta, que ajudam a produção da vitamina D.” (Revista Superinteressante, setembro de 1988). O que nos leva, portanto, a crer que, antes da expansão do homem moderno os nossos ancestrais comuns eram todos negros. (Celso Lima, A Evolução Humana 1990) 


 

Todas as experiências feitas até hoje com seres humanos de diversas origens jamais conseguiram demonstrar a superioridade racial de qualquer tipo sobre os outros, qualquer ser humano, dispondo de condições semelhantes de alimentação e educação, apresentará resultados médios semelhantes em quaisquer testes psicológicos. É evidente que a comparação direta entre um europeu com um índio semicivilizado do interior da Amazônia, dentro de critérios desenvolvidos por europeus demonstrará uma superioridade muito grande a favor dos europeus, mas o inverso ocorrerá se colocarmos um europeu no meio da selva amazônica. 

 
O racismo é uma criação recente, surgida com os grandes descobrimentos, quando por razões econômicas iniciaram-se as escravidões em massa de negros e índios, no século XVI.  

 

Claro está que os seres humanos brancos, de olhos azuis, são oriundos dos primeiros homens modernos, que eram africanos e de pele negra e que as diferenças na inteligência e na posição social ocupada pelas diversas raças, se originam de sua história natural e não da sua história biológica. Somos todos da mesma família originária há 150 mil anos. 

 
O conhecimento sobre este tema avançou infinitamente, com relação ao que se pensava então, em meados do século XIX. Tanto Allan Kardec como qualquer outro estudioso daquele tempo pensariam da mesma forma na sua época.  

 

Isto é mais uma evidência de que precisamos atualizar o conhecimento, principalmente na forma de produção de conteúdo novos e não revisando obras antigas, pois elas em muitos aspectos estão superadas como não poderia ser diferente. Einstein não revisou Newton, simplesmente apresentou uma nova teoria da relatividade. Seguimos estudando as leis de Newton, naquilo nas quais as mesmas se aplicam perfeitamente, quase ninguém estuda Newton na fonte, razão pela qual não se faz necessária nenhuma alteração na mesma. 

 

Por outro lado, defendendo a tese de que Kardec não era racista estrutural, lá atrás no século XIX ele ressaltava que "na reencarnação desaparecem os preconceitos de raças e de castas, pois o mesmo Espírito pode tornar a nascer rico ou pobre, capitalista ou proletário, chefe ou subordinado, livre ou escravo, homem ou mulher. Se, pois, a reencarnação funda numa lei da Natureza o princípio da fraternidade universal, também funda na mesma lei o da igualdade dos direitos sociais e, por conseguinte, o da liberdade". Uma ideia muito além de sua época. 



 Extraído do editorial do Jornal Abertura de abril de 2023.


Para ler o exemplar do jornal, clique abaixo é grátis e seguro:


https://cepainternacional.org/site/pt/cepa-downloads/category/31-jornal-abertura-2023?download=230:jornal-abertura-abril-de-2023



terça-feira, 18 de abril de 2023

17° Fórum Espírita Livre-Pensar da Baixada Santista - semana do lançamento do Livro dos Espíritos

 

17° Fórum Espírita do Livre-Pensar da Baixada Santista

 

Ocorreu com bastante participação das casas espíritas ligada à CEPA a décima sétima edição, no sábado 15 de abril, os Fóruns sempre são realizados próximo do dia 18 de abril, que neste ano estamos comemorando 166 anos do lançamento da primeira edição do Livro dos Espíritos.

Após dois anos onde os fóruns se realizaram de forma virtuais, em decorrência da Pandemia de Covid, pudemos nos reunir nas dependências do CEAK – Centro Espírita Allan Kardec de Santos. Estiveram presentes mais de 50 pessoas para conversar sobre  o tema “ Reflexões sobre o Amor”.

O evento constou de uma abertura feita pela presidente do CEAK, Sandra Lia Chioro dos Reis e do coordenador do evento Jaílson Mendonça, logo seguida de uma apresentação do coral Integrasom, formado por espírita de várias casas espíritas de Santos, sob a regência de Sandra Régis.








 Inicialmente os participantes foram divididos em grupos, numa oficina, para discutir o que é o amor sobre a ótica espírita, três grupos receberam uma pergunta em comum e duas distintas. A pergunta em comum era: “É possível amar o outro como a ti mesmo?”. Foram 30 minutos de discussão, seguido das apresentações.










Na segunda parte, três convidados falaram 15 minutos sobre os seguintes temas:

Ricardo de Morais Nunes – O Amor a partir da Filosofia e do Espiritismo



Alexandre Cardia Machado – A delicada questão do sexo e do amor

 


Alcione Moreno – O amor nas relações humanas.

 








Após as apresentações houve um debate com os presentes no evento, seguido das considerações finais. Ao término foi oferecido um lanche a todos.

Foi um encontro feliz de muita amizade, integração e amor!

 

 

 





sexta-feira, 17 de março de 2023

DESAPEGA - por Cláudia Régis Machado

 

DESAPEGA

A palavra desapegar é muito usada para expressar a ideia de desprender, desligar, distanciar e pode ser utilizada tanto para situações e bens materiais como para comportamentos, atitudes psicológicas, visão do mundo etc.

O desapego pode ser visto como deixar um problema, que atrapalha a dinâmica da vida, pois quanto mais o seguramos, de leve torna-se pesado. É pensar no que podemos simplificar naquilo que incomoda, no entanto neste artigo vamos explorar mais no campo do estilo de vida, o modo que conduzimos nossa existência.



 Uma expressão, talvez, se encaixe melhor nesta abordagem ‘Abrir mão do que não nos preenche mais” pois parece mais completa para o nosso enfoque.

Uma premissa para discutirmos este tema é ter consciência que viver é estar em constante transformação elegendo o que é mais relevante para uma jornada vivencial positiva. A essência da vida é o movimento, a evolução, o crescimento do ser, daí as mudanças estarão sempre presentes.

Olhando para os caminhos percorridos devemos levar em conta que é da natureza do comportamento humano nos sentirmos saudosos das coisas vividas, porque é a história de vida de cada um e porque trouxeram bons resultados deixando-nos adaptados. E na zona de conforto.  

Muitos ”chamados” da vida pedem para abrirmos mão de muitas coisas que não nos preenchem mais como: fim de um ciclo da vida, amadurecimento, maternidade, paternidade, aposentadoria entre outras coisas. Cenários que diversas vezes nos colocam face a face com a necessidade de transições para tornar a existência mais significativa e gratificante com maior qualidade.

” Todo fechamento de um ciclo é uma passagem para uma nova abertura”.

Neste caso, falamos em desapego de estilos de vida que contém comportamentos e atitudes que não tem mais o porquê de serem reproduzidos, pois não trazem felicidade, empatam a vida, não promovem alegria e fazem a vida sem graça.

Importante ressignificar nosso estilo de vida, olhá-lo sob novas luzes. Vislumbrar a vida com nova perspectiva porque a antiga não nos serve mais, não tem maior significado, só há perda de tempo e energia.

O ser humano tem padrões de comportamento que se repetem e geralmente nos viciamos nos caminhos automáticos quebrá-los não é fácil, entretanto alguns acontecimentos como os que foram citados anteriormente desencadeiam, provocam movimentos de renovação.

Em qualquer idade devemos nos enxergar como criadores de novos modos de ser e viver. Sair em busca de coisas que novas que correspondam às novas necessidades.

Acorde sua imaginação, interessante conversar com projetos novos com calma não se espantando com as crenças limitantes – “isto eu não consigo”. Abrir mão é uma escolha que deve estar alinhada a quem somos e queremos ser. Não é uma busca desenfreada e sim entender o que é necessário, o que importa.

Nesta nova busca é fundamental incluir sempre a perspectiva espiritual que amplia, aprofunda a dimensão da nossa realidade.

 Abrir mão pode ser visto como uma oportunidade de entender que “algo precisa terminar para a existência continuar a florir”.

Toda essa reflexão tem um paralelo com a Doutrina Espírita que vê o individuo como um espírito reencarnante com a chance de progredir, aprender para ser uma pessoa melhor sendo básico para isto ocorrer - mudanças - e com melhor entendimento podemos incentivar a procura, para estarmos melhores conosco mesmo e consequentemente com o mundo e com as outras pessoas.

Também podemos ver no desapego a lei de destruição que tem no fundo a mensagem: tirar algo para que outras coisas possam ser construídas e estruturadas.” É preciso que tudo se destrua para renascer e se regenerar o que é chamais de destruição não é senão uma transformação que tem como objetivo a renovação e o melhoramento dos seres vivos”.

Artigo publicado no jornal ABERTURA de novembro de 2022

Leia mais - Abertura novembro 2022: https://cepainternacional.org/site/pt/cepa-downloads/category/22-jornal-abertura-2022?download=206:jornal-abertura-novembro-de-2022


segunda-feira, 6 de março de 2023

O MOVIMENTO DAS IDEIAS NO MOVIMENTO ESPÍRITA - por Ricardo de Morais Nunes

 

O MOVIMENTO DAS IDEIAS NO MOVIMENTO ESPÍRITA

Na atualidade muitos espíritas sentem que é necessário ou desejável um posicionamento de caráter político. No artigo do nosso estimado amigo Roberto Rufo no Abertura do mês de setembro ele indaga ao comentar sobre um evento do coletivo Espíritas à esquerda: “politicamente sou de centro-direita. Tenho salvação? ”   Alexandre Cardia, nosso querido editor, afirma na mesma edição “temos publicado artigos de nossos articulistas, alguns de centro, outros mais à direita ou mais à esquerda”. A referência à esquerda, à direita ou ao centro está na ordem do dia no movimento espírita brasileiro.

Ricardo de Morais Nunes -12° SBPE


O que quero ressaltar, no entanto, nesse artigo, não é propriamente o posicionamento político que cada um entende melhor para si, o que é legitimo dentro de uma perspectiva de livre pensamento. Por exemplo, eu mesmo me situo em uma perspectiva de crítica ao capitalismo, por entender que o capitalismo, enquanto sistema econômico, precisa ser superado ou, pelo menos, reformado profundamente, pois efetivamente tem gerado abismos de desigualdade intransponíveis entre os seres humanos, criando de um lado uma restrita classe de privilegiados que tudo possuem ao excesso e, do outro, a grande maioria, uma população marginalizada excluída dos bens fundamentais à vida.  Nesse sentido, me coloco à esquerda em termos de posicionamento político, sem a menor hesitação.

Mas meu objetivo hoje não é analisar as posições de esquerda, centro ou direita existentes no movimento espírita brasileiro. Meu objetivo é chamar atenção para o fato de como as circunstâncias históricas objetivas mudam independentemente de nossas vontades pessoais e nos colocam desafios inesperados para a reflexão.

 Há alguns anos, no Brasil, o assunto fundamental no movimento espírita, para um importante número de pensadores, era sobre a natureza religiosa ou não do espiritismo, sobre a natureza cristã ou não do espiritismo. Esse foi o grande debate no qual estiveram envolvidos grandes pensadores, uns defendendo a natureza cristã e religiosa do espiritismo, outros defendendo a natureza laica e universal da proposta filosófica espírita. O debate era tão intenso que se criou naquela época uma lenda urbana ou, como diríamos hoje, uma “fake News”, de que alguns espíritas, no caso os laicos, queriam “tirar Jesus do espiritismo”.

 Na atualidade, no entanto, esse debate não deixou de ser relevante. Pelo contrário, como espírita laico e livre pensador entendo que este tema é fundamental para a melhor compreensão da obra de Allan Kardec, porém, esse tema cedeu muito espaço às questões políticas e sociais.

 Tais questões surgiram a partir de uma demanda da sociedade brasileira para que os espíritas se posicionassem quanto a sua visão de sociedade e política, dadas as crises e ameaças à democracia liberal brasileira. Não foi por acaso que surgiram os chamados coletivos espíritas, nos quais a preocupação social é evidente já a partir da denominação desses grupos.

Interessante observar, neste novo horizonte de discussão, que tem havido diálogos interessantes e fraternos entre espíritas laicos progressistas e espíritas religiosos progressistas. Assim como os espíritas conservadores também dialogam entre si sejam eles laicos ou religiosos.  As demarcações rígidas que tínhamos entre espíritas religiosos e não religiosos se atenuaram em parte por força da temática política e social e houve um processo de interação em nosso movimento espírita.  Nesse sentido, o adjetivo “progressista”, pode pertencer a espíritas laicos ou religiosos o mesmo ocorrendo com o adjetivo “conservador”.

É necessário chamar atenção que essa agenda temática se impôs de fora ao movimento espirita brasileiro e convocou os espíritas a pensar sobre as questões políticas e sociais de seu tempo e, a partir dessa reflexão, se dividiram em visões de mundo distintas. Essa situação nos mostra claramente como somos reféns, em boa medida, de nosso tempo histórico. Na verdade, o “Espírito do tempo” é a moldura sobre a qual se realiza nosso fazer filosófico.

O espiritismo, enquanto filosofia espiritualista, pode ser apto a acompanhar o devir das ideias. Mas também pode não acompanhar e ficar estagnado passando a se constituir em mais uma cosmovisão dogmática no campo do espiritualismo.

 Mais uma vez é necessário lembrar o acerto da famosa frase de Léon Denis: “O espiritismo será o que dele fizerem os homens”. Ou, em boa linguagem atual:  O espiritismo será o que dele fizerem os homens, as mulheres, e os integrantes da comunidade LGBTQI+ de nosso tempo.

 Uma coisa é certa em meio a esses novos enfoques e prioridades temáticas que abalam, mas também redirecionam o tradicional movimento espírita brasileiro. Não será fácil para a maioria dos espíritas, principalmente os que já militam há muitos anos no movimento espírita, se acostumarem a essa mudança de agenda temática. Surgirão muitos espíritas que não se reconhecerão sintonizados com esse novo tempo de reflexão espírita.

 A nossa tendência, como ser humano, é nos cristalizarmos em nossas idiossincrasias, é nos acomodarmos em nossas “verdades” e em nossas “certezas”. Porém, o novo sempre vem, e nos assusta. A verdade é que desejamos, mesmo que de forma inconsciente, que o tempo pare, na exata conformidade dos nossos anseios pessoais e de nosso mundo muito particular. Mas, felizmente, o mundo é maior que nossos desejos, que nossos condicionamentos, enfim, o mundo nos supera.

Artigo originalmente publicado na página 8 do Jornal Abertura de outubro de 2022. Se quiseres ver o jornal todo baixe:

https://cepainternacional.org/site/pt/cepa-downloads/category/22-jornal-abertura-2022?download=202:jornal-abertura-outubro-de-2022