É possível ser livre-pensador espírita?
Muitos de nós já
nos fizemos esta pergunta, seria possível ser livre-pensador espírita? O fato
de nos auto denominarmos espíritas, já não trás consigo uma série de restrições
ao pensamento?
Tentando responder
esta inquietação, poderíamos pensar que ter o pensamento livre nos permite ir
além dos conceitos originais da Kardequiana, comparar o que foi dito e
pesquisado, ao tempo de Kardec, com os avanços das diversas áreas do
conhecimento humano atuais. Podemos também incoporar novos ensinamentos
espirituais, desde que façam sentido.
Ser livre-pensador
é não aceitar amarras, outras que não sejam as do limite da razão, é questionar
o até então considerado verdade, buscando sempre um novo aprofundamento, uma
nova abordagem, ou mesmo uma nova aplicação para um determinado conhecimento.
Trazer novos
conhecimentos, para o âmbito do Espiritismo, nos torna Livre-Pensadores
Espíritas. A espiral do saber não para nunca, quando algo novo é descoberto,
volta-se ao que sabíamos antes e por obrigação, devemos repensá-lo, este é o
método científico. A cada evolução de instrumentos de medição, de métodos de
estudos, de novos estudos publicados, outras pessoas podem apoiar-se sobre este
conhecimento e fazer novas perguntas, novos testes, enfim aprimorar o
conhecimento até então dominado sobre uma área de saber.
Esta sistema de
perguntar e testar as respostas é o que produz o conhecimento, as perguntas
movem o mundo, através de novas respostas. Isto acontece em todas as áreas.
Esta é a razão principal de Allan Kardec escrever, no livro a Gênese que: “Assimilará
as idéias reconhecidamente justas, de qualquer ordem que sejam físicas ou
metafísicas. Pois não quer ser jamais ultrapassada, constituindo isso uma das
principais garantias de credibilidade”.
Ser livre-pensador
é ser questionador, inconformado, ser culto, integrado, atualizado, ser
livre-pensador é ser progressista por natureza, pois estaremos sempre pensando
em coisas novas, novas perspectivas, um novo olhar.
Estas
considerações, não se restringem apenas ao aspecto científico, vale para tudo,
para uma análise social, para uma abordagem poética, não importa. O mundo muda
o tempo todo, os conceitos evoluem, novos problemas éticos surgem e merecem uma
nova observação e um novo pensamento sobre eles.
Aqui está a beleza, a estética de uma Doutrina em permanente mutação. Mudanças
estas que devem ser feitas observadas algumas condições que permitam a formulação
deste pensamento livre e isto seria através do método científico. Recorro a
Reinaldo di Lucia, em seu trabalho “ EPISTEMOLOGIA
E CIÊNCIA ESPÍRITA - Contribuição para Debate” donde extraio:
“Assim, podemos definir os princípios do moderno método científico:
- A experimentação, através da
qual se pode comprovar ou não a teoria, e que permite a repetição por qualquer
cientista convenientemente aparelhado.
- A universalidade, isto é, a
confirmação dos experimentos em diversos locais por diversos cientistas.
- O critério de falseabilidade,
que permite que uma teoria possa ser falseável, para que possa, também, ser
convenientemente demonstrada.
- A quantificação, que permite
uma delimitação precisa do "até onde" podemos considerar válida a
teoria. A partir da definição do princípio da incerteza, esta quantificação
passou a incluir, necessariamente, critérios estatísticos.
Seguir estes passos, garantem ao menos uma
ordem, um processo facilmente reproduzível, explicável, e vale, como já
mencionamos, para todos os aspectos do conhecimento.
Assim voltando à questão de ser Livre-pensador
Espírita, sim, temos limites metodológicos e de princípios. Pois se ao
estudarmos, refletirmos, venhamos a mudar algum ponto central do Espiritismo,
alteraremos tanto a Doutrina que ela necessariamente passaria a ser outra
coisa. Agora se este princípio central se demonstrar errado, não haveria outro
caminho a seguir senão denunciá-lo, pois não poderíamos admitir um erro central
no Espiritismo, pelo medo de balançar as estruturas. Este risco tem que estar
presente sempre, pelo bem do progresso do conhecimento. Este seria quem sabe
exatamente este ponto que diferencia o Espiritismo de uma religião.
Este risco é intrínseco ao Espiritismo, desde a sua fundação, pois Kardec
o considerava progressivo: do trabalho do ICKS - Pode o Espiritismo ser considerado Ciência da
Alma? Uma análise epistemológica da proposta do pensador espírita Jaci Régis
“Porque já dizia que o Espiritismo terá
que estar alinhado ao desenvolvimento das ideias que contribuem para o melhor
entendimento do homem.
É progressista porque atendendo os
anseios da alma que está em evolução acompanhará as mudanças e crescimento para
atender os seus conflitos, problemas, respondendo as suas inquietações.
As regras de moralidade e as relações
sociais e interpessoais progridem e a ciência da alma terá que interagir com
estas mudanças, influindo e sendo influenciada para que siga progredindo.”
Este caráter de progresso atende a lei
de progresso e é sustentado por Kardec na criação da Doutrina Espírita num de
seus postulados como coloca Jaci no livro Doutrina Kardecista “é capaz de
superar os entraves contextuais e projetar-se para o futuro, porque teve a
sabedoria de abrir o caminho para o progresso, de tal forma que seria capaz de
reciclar-se, aceitando as novas idéias e mudar o que fosse necessário para não
imobilizar-se, que seria, disse, o suicídio da doutrina”.
Reafirmado no livro A Gênese “Um último
caráter da revelação espírita, a ressaltar das condições mesmas em que ela se
produz, é que se apoiando em fatos, tem que ser, e não pode deixar de ser,
essencialmente progressiva, como todas as ciências de observação...”
Portanto, ser Livre-Pensador Espírita
obriga a pensar com responsabilidade, visando o aprimoramento e atualização de
uma Doutrina que tem a capacidade de abrir um caminho para o engrandecimento da
sociedade, de uma maior compreensão da sua imoratalidade dinâmica.
O jornal Opinião de Porto Alegre
publicou em sua última edição de Janeiro/Fevereiro um artigo denominado “Os
Espíritas são Livres-Pensadores” de onde extraio uma frase muito interessante
de Allan Kardec “ O Livre-pensamento eleva a dignidade do homem, dele fazendo
um ser ativo, inteligente, em vez de uma máquina de crer”.
Recorro a Allan Kardec, que na revista
Espírita no ano de 1867 escreve um artigo denominado “ Livre Pensamento e Livre
Consciência” que foi analisado aqui no ABERTURA na coluna Revista Espírita em
Foco de Julho de 2016, lá Kardec assim se refere “ é o Espiritismo, como pensam
alguns, uma nova fé cega substituíndo a outra fé cega? Por outras palavras, uma
nova escravidão do pensamento sob nova forma? Para o crer, é preciso ignorar os
seus primeiros elementos. Com efeito o Espiritismo estabelece como princípio
que antes de crer é preciso compreender. Ora, para compreender há que usar o
raciocínio ... Não se impõe a ninguém; diz a todos: Vede, observai, comparai e
vinde a nós livremente, se vos convier”. Acredito que o que precisa ser dito
está mais do que exposto.
Alexandre Cardia Machado
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