A História e o Espiritismo livre-pensador - por Roberto Rufo
" A diferença entre o capitalismo e o comunismo,
é que o capitalismo é a exploração do homem pelo homem e o comunismo é o contrário
" ( Millôr Fernandes )
" No casamento, cada pessoa deve realizar a
função que lhe compete. O homem deve ganhar dinheiro, a mulher deve economizar
" ( Martinho Lutero )
Afinal o que seria um Espiritismo livre-pensador
na prática? Antes de tentar responder a essa pergunta gostaria de
relembrar dois acontecimentos históricos importantes que tiveram suas datas
simbólicas ocorridas em Outubro/2017. Em 31.10.2017 celebrou-se os 500
anos da Reforma Protestante. Em 31.10.1517 Martinho Lutero pregou na porta da
igreja de Wittemberg na Alemanha as 95 teses que revolucionaram o cristianismo,
a igreja e a política. Lutero tornou-se referência para os anseios de reforma
que ecoavam na Europa. Ele recebeu proteção de autoridades simpáticas à causa.
Um jovem aristocrata de 23 anos, Albrecht de
Brandenburg, havia sido sagrado arcebispo. Para arcar com os custos devidos ao
Vaticano, ele recebeu do papa a autorização para vender indulgências, uma
espécie de créditos adquiridos pelos fiéis para aplacar dívidas de pecados já
cometidos e por cometer. A ideia alastrou-se.
Mas a Reforma Protestante não foi apenas um marco
religioso, foi também um movimento que mudou os cenários político, econômico e
cultural naquele período. Mas ilude-se quem pensa que Lutero foi um liberal em
matéria religiosa ou no comportamento moral. Vivia sob um dilema: em que consiste
a justiça de Deus? Resposta: a justiça de Deus se revela nos textos sagrados e
só é acessível pelos caminhos da fé. O controle absoluto pelos livros sagrados
intensificou-se. Quinhentos anos depois o pastor reverendo Milton Ribeiro da
Igreja Presbiteriana ( Doutor em Educação pela USP, Mestre em Direito pela
Universidade Presbiteriana Mackenzie, de onde já foi vice-reitor emitiu as
seguintes opiniões em entrevista ao jornal A Tribuna de Santos:
1ª - A igreja
presbiteriana não aceita a união homoafetiva. A razão é simples. Os textos
sagrados da Bíblia falam o contrário.
2ª - Não
aceitamos pastoras pela mesma razão.
Lutero, com certeza, assinaria essas assertivas há 500
anos atrás. A abertura a novas ideias é praticamente nula. O imobilismo uma
certeza.
O mês de Outurbo marcou também os 100 anos da
Revolução Bolchevique que levou ao surgimento da União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas ( URSS ) que trouxe inúmeros progressos a uma sociedade
semi feudal russa. Alguns historiadores citam o surgimento do primeiro sistema
universal de saúde, a participação da mulher no mercado de trabalho, a
transformação educacional e a planificação da economia. No entanto, ainda
segundo esses historiadores, o sistema de partido único criou um paradigma. O
modelo que queria a busca da utopia na terra ( a sociedade sem classes ) queria
também carta branca para decidir qual tipo de comportamento era o ideal para a
sociedade. Transformou-se numa das mais sanguinárias experiências sociais da
História da humanidade. Em 1.973 Alexander Soljenitsyn, Prêmio Nobel de
Literatura, lançou o livro Arquipélago Gulag. Físico e matemático russo,
Soljenitsyn passou 11 anos aprisionado em campos de trabalhos forçados na
Sibéria sob a acusação de nas suas correspondências fazer críticas ao
ditador Stalin. No livro Arquipélago Gulag ele enumera dez traços ou
comportamentos dos presos nos campos de " reeducação " na Sibéria.
1º - O
medo constante; 2º - Servidão e subjugação; 3º - Dissimulação e
desconfiança;
4º - Ignorância universal; 5º - O medo
de ser delatado; 6º - A traição como forma de existência; 7º - Degradação
moral; 8º - A mentira como parte de sua natureza; 9º - Crueldade; 10º -Psicologia de escravos.
Quem já leu o livro sabe as imagens chocantes e
asustadoras relatadas da vida dos prisioneiros nos campos de concentração na
Sibéria. Quarenta e quatro anos depois da primeira edição do livro ainda
existem adultos bem formados que se dizem stalinistas e defensores
ferrenhos do total controle dos comportamentos humanos pelo estado.
Dessa forma fica muito difícil uma sociedade desse
tipo estar aberta às evoluções do comportamento. O imobilismo estabeleceu-se.
Por sua vez o Espiritismo foi pensado como um modelo
aberto às ideias progressistas, mesmo porque Allan Kardec aventou essa
possibilidade de transformação doutrinária diante do contraditório dos fatos. Leiam-se
sua declaração:
" Caminhando de par com o
progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas
lhe demonstrarem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificará
nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará " ( A Gênese,
capítulo I, Item 55 ).
Na edição de janeiro de 1867, da Revista Espírita, Kardec
ainda esclareceu que essa natureza contingente do conhecimento espírita deve
ser garantida pelo exercício do livre-pensar de seus adeptos:
“Toda crença eclética pertence ao livre pensamento; todo homem que não
se guia na fé cega é, por isto mesmo, livre-pensador; a esse título, os
Espíritas são também livres-pensadores”.
Em resumo, o exercício do livre pensar espírita
torna-se condição essencial para que o aspecto progressivo do Espiritismo seja
mantido. Dependerá sempre, é claro, da utilização de critérios racionais que
evitem o imobilismo. É um fator de sobrevivência doutrinária. Finalizemos com
Obras Póstumas, II dos Cismas, cap. XXXVII:
" O princípio progressivo,
que a doutrina espírita inscreve no seu código, será salvaguarda da sua
perenidade e a sua unidade se manterá, exatamente porque ela não se assenta no
princípio da imobilidade ".
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