O paradigma Ignorado
Recentemente ao ler o último exemplar recém-lançado da
Coleção Livre-Pensar, o Livro Espiritismo, Ética e Moral, escrito por Milton
Rubens Medran Moreira e Jacira Jacinto da Rocha me deparei com uma citação de
um texto de Maurice Herbert Jones – O paradigma ignorado, publicado em agosto
de 2002, texto que guardamos até hoje. Milton Medran faz referência ao que
Jones chama de espiritocentrista, à visão de Kardec.
Talvez, por ter sido produzido em 2002, não haja cópias deste
importante texto disponível online, então, resolvemos trazê-lo de volta nesta
coluna levando-se em consideração a sua importância, relevância e profundidade
das análises nele contidas.
Com vocês a clareza e a sensibilidade Maurice Herbert Jones.
“O paradigma
Ignorado”
“Os antigos deuses envelheceram ou morreram e outros ainda
não nasceram.” Emile Durkheim
O processo civilizatório a que estamos submetidos transcorre
como se nosso planeta fosse um gigantesco e dinâmico palco com cenários em
permanente mutação e atores em rodízio constante.
Este imenso espetáculo é dirigido por “matrizes ideológicas”
ou paradigmas que, num dado momento e cultura, tornam-se hegemônicos e,
portanto, eleitos para administrar o processo até que, esgotada sua virilidade,
senilizados, são substituídos por novos paradigmas.
Convém reconhecer, todavia, que o envelhecimento ou até
mesmo a morte dos velhos deuses não é facilmente reconhecida. Sando muito
penosa a orfandade, é preferível um deus mumificado a deus nenhum, prolongando,
assim, a crise de referências ao mesmo tempo em que os candidatos à sucessão
são submetidos aos testes necessários.
A crise existencial de nosso tempo tem como uma das principais
causas o esgotamento dos modelos conceptuais ainda vigentes, crescentemente
incapazes de oferecer segurança e identidade.
O psicanalista Hélio Pelegrini afirmou em um artigo que a
angústia metafísica que nos aflige clama por uma filosofia pública sobre o
significado e objetivo da vida, capaz de orientar toda a atividade humana, isto
é, uma visão de homem e de mundo que possa ser racionalmente universalizada.
Os relatos bíblicos, síntese conceptual daqueles tempos e
cultura, nos falam, essencialmente, de um contrato estabelecido entre o criador
e as criaturas, a partir do momento em que estas conquistam a racionalidade,
isto é, a liberdade de desobedecer, que inaugura a história humana. Este
contrato é reformável na medida em que precisa ajustar-se aos novos níveis de
consciência e liberdade conquistados pelo homem, A iniciativa, porém, como a
história nos ensina, cabe ao homem.
Quando os valores tradicionais começam a perder significado
e eficácia, um novo contrato, um novo conjunto de valores deve ser concebido.”
Neste momento, Jones chega ao ponto principal de sua
reflexão.
“Atendendo a esta determinação histórica, Kardec, com
extraordinária lucidez, identifica sinais de esgotamento do paradigma vigente e
lidera uma revolução conceptual de base racional e humanista que, superando o organocentrismo
iluminista propõe uma visão espiritocentrista, isto é, que considera a dimensão
extrafísica ou espiritual como fundamental, afetando, drasticamente, a forma
pela qual o homem, o mundo e a história são percebidos.
A natureza sintética do modelo conceptual Kardequiano é
evidente. Como uma flor tardia da primavera iluminista o Espiritismo surge como
uma esperança de renovação capaz de oferecer ao homem a segurança e a
identidade perdidas, equiparando-o, assim, para avançar, confiante, mais uma
etapa no processo evolutivo.
Quase um século e meio depois de seu surgimento (texto de
2002, hoje seria 165 anos após), o Espiritismo, naquilo que o faz singular,
dinâmico, revolucionário e universal é desconhecido pela maioria esmagadora dos
próprios espíritas que, incapazes de compreender o alcance e a profundidade da
monumental proposta de Kardec, insistem, ingenuamente, em interpretá-la a luz
dos paradigmas agonizantes ou mumificados que teimam em nos influenciar,
reduzindo-a, assim, a uma mera seita religiosa.
Significativamente, foi exatamente esta a interpretação do
Abade François Chesnel em artigos publicados no jornal L’Univers de Paris em
abril de 1859 e tão veementemente contestada pelo fundador do Espiritismo
conforme ficou registrado na “Revue Spirite” de maio e julho daquele mesmo ano.
Como se vê, o padre Chesnel fez escola.”
Maurice Herbert Jones – Ex-Presidente da FERGS –
Federação Espírita do Rio Grande do Sul, diversas vezes membro da diretoria do
CCEPA, desencarnada em 2021. Texto publicado no Jornal Opinião de agosto de
2002.
Sobre Maurice Herbert Jones deixamos o convite à leitura de
sua biografia publicada no site do CPdoc:
www.cpdocespirita.com.br/portal/destaques/personalidades-em-destaque/160-maurice-herbert-jones
Sobre Maurice Herbert Jones
O Abertura em sua edição de julho de 2021 noticiou com pesar
a desencarnação deste grande lumiar espírita, caso queiram reler o Abertura
pode ser acessado na no link:
CEPA
Internacional : basta entrar no site: digitando em seu buscador: CEPA
Associação Espírita Internacional, irão aparecer várias opções, clique no
site e depois na barra azul escolha: Publicações: desça o cursor no Jornal
Abertura, ano de 2021, mês de julho.
Se preferir ir diretamente ao Jornal Abertura de julho de 2021 baixe aqui:
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