Fato
Espíria - Inteligência e Simplicidade
Eugenio
Lara
NR: uma homenagem a Eugenio Lara
Há pessoas que são espíritas sem que tenham
consciência disso. Pensam, sentem e vivenciam ideias e valores que muitos
militantes espíritas “velhos de guerra” nem imaginam como fazê-lo, mergulhados
que estão em seu próprio egoísmo. Normalmente, esse fenômeno acontece e
mostra-se com mais evidência em pessoas que não tiveram, na atual existência, a
oportunidade de se instruir, de aprimorar a inteligência através do estudo.
No processo evolutivo, o homem humilde, mas de bom
coração, que não teve acesso ao estudo nessa vida, pode estar bem mais perto da
perfeição relativa do que o sujeito extremamente intelectualizado, com um quociente
de inteligência (Q.I.) altíssimo, mas que se mostra insensível e fechado em si
mesmo, quando se trata de abrir seu coração para o outro.
Realmente, o Espiritismo é bem esclarecedor nesse
aspecto. Afirmam os espíritos que “o homem simples, mas sincero, está mais
adiantado no caminho de Deus do que aquele que aparenta o que não é.” (Allan
Kardec, O Livro dos Espíritos, q.
828-a). A arrogância, o despeito e a vaidade tomam conta de suas atitudes, de
seu comportamento que, visto sob o ponto de vista moral, mostra-se ridículo e
patético. É o que Deolindo Amorim (1906-1984) chama de falsa cultura: “é
exibicionista, mas a verdadeira cultura é temperada pela humildade, sem
exagero, sem atitudes impressionantes.” (Evangelho e Cultura, em Ideias e Reminiscências Espíritas, Ed.
Inst. Maria)
Todas as pompas e trejeitos sofisticados não fazem do
homem culto e intelectualizado um verdadeiro homem de bem. Isso não significa,
contudo, que devido a esse fato, tenhamos de valorizar a ignorância em
detrimento do desenvolvimento intelectual. Como diz Deolindo Amorim no mesmo
artigo citado: “ao invés de provocar o orgulho ou a empáfia, como tantas e
tantas vezes se diz, a verdadeira cultura cria condições íntimas para a
humildade, mas a humildade raciocinada e não a humildade convencional, que
encobre a presunção recalcada”.
O Espiritismo nos ensina que o progresso intelectual é
incessante, permanente e antecede ao progresso moral. É que o desenvolvimento
da inteligência, da razão, abre portas para o desenvolvimento moral. Através do
livre-arbítrio o ser humano delibera, exercita seu intelecto e cria situações,
dilemas, promove conflitos que exigem decisões, definindo assim caminhos e
escolhas morais.
Sem inteligência não há razão. E sem raciocínio não há
livre-arbítrio. Não dá para pensar em ética, moral e valores sem a existência
do livre-arbítrio. Não há o bem, nem o mal. Haveria apenas um ser que age sem
consciência moral, ou o que é pior, age imaginando que está agindo com
consciência, mas que, na prática, age como um animal, ainda mergulhado no
estado natural.
Na verdade, os maiores obstáculos ao pleno
desenvolvimento intelecto-moral são o egoísmo e a vaidade. Enquanto o sujeito
permanecer bem no alto do pedestal de sua arrogância, não perceberá o quanto
ainda tem que aprender. A sensação de superioridade intelectual ofusca a
necessidade interna de progresso. É o sabe-tudo, o metido a sabichão, que não
percebe o quanto ainda terá de caminhar para ser considerado um homem sábio.
A propósito, o exemplo do grande filósofo grego
Sócrates (469 a.C. - 399 a.C) vem bem a calhar. Quando seu amigo Querefonte
disse-lhe que para o Oráculo de Delfos, ele era o homem mais sábio de Atenas, mostrou-se
surpreso: “Como posso ser o homem mais sábio de Atenas quando sei tão pouco?” Ao
invés de se sentir o “special man”, o “number one” e tirar proveito disso,
apenas dizia: “só sei que nada sei”. Essa atitude de humildade, oriunda do
autoconhecimento, levou o grande filósofo a um permanente questionamento, à
incessante busca da verdade, a se colocar sempre à disposição para debater suas
ideias.
Deolindo Amorim tem, portanto, toda a razão quando
afirma que “quanto mais culta é a criatura humana, mais humilde ela se torna,
porque sabe, e não é mais necessário que alguém lhe diga, que o legítimo
conhecimento só tem proveito para o espírito quando não se deixa influenciar
pela vaidade, pela arrogância, pelo egoísmo”.
Eugenio Lara, arquiteto e designer gráfico e autor do livro Breve Ensaio Sobre o Humanismo Espírita.
Artigo publicado em setembro de 2013 no Jornal Abertura
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