O
AI-5 e seu comparativo com o Espiritismo
"Às
favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de
consciência" (Frase do Ministro do Trabalho Jarbas Passarinho em dezembro
de 1968 ao presidente Costa e Silva. Passarinho foi um dos 17 signatários
do AI-5).
"O
ser humano é responsável pelo seu pensamento? Sim, é responsável diante de
Deus. Só Deus, podendo conhecê-lo, o condena ou o absolve segundo a sua
justiça". (Pergunta 834 do Livro dos Espíritos).
Em tempos de muita ideologia e pouco pensamento
produtivo assiste-se no Brasil uma polarização irritante e desgastante
produzindo uma insuportável avalanche de mensagens de fakenews nas redes
sociais. Não
adianta responder mostrando o contraditório do absurdo, pois a resposta feita
e fabricada pelos líderes dessas redes logo se apresenta: "quem pesquisa
se é fakenews pertence a grupos comunistas". Pronto de homem burguês
conservador sou alçado à condição de comunista impatriota.
Muitos
espíritas, dentro do seu inalienável direito de expressão e opinião,
manifestam profundas simpatias pelo presidente Bolsonaro, a quem
abomino por profundas discordâncias de consciência. Não só pelo seu inútil
período de 28 anos como Deputado Federal, mas pelo seu histórico de impulsos desequilibrados
e preconceitos ridículos.
No
citado histórico o atual presidente, em 1987 confessou que elaborou um
plano que previa a explosão de bombas em quartéis e outros
locais estratégicos no Rio de Janeiro (Adutora de água do Guandu). Sua
luta era pelo aumento do soldo dos militares. Note-se que ainda era
Capitão da ativa. O plano foi descoberto.
Nesse
artigo quero analisar em particular a ausência de autocrítica dos espíritas
simpatizantes do presidente pelos apelos incessantes do grande grupo de apoio
que clama por uma intervenção militar e pela volta do Ato Institucional nº 05.
Ou para minha imensa tristeza talvez apoiem tais sandices.
Nas
mega manifestações de apoio ao presidente em Brasília, Rio de Janeiro e
São Paulo lá estavam dezenas de cartazes pedindo a volta do AI-5.
Os
mais jovens talvez não conheçam o que foi esse famigerado artigo, mas os
maiores de 65 anos têm a obrigação de saber. Pretendo com a minha experiência
ajudar os mais jovens na compreensão desse hediondo artigo comparando alguns de
seus itens com os conceitos espíritas, mesmo sabendo que "a luz que a
experiência nos dá é de uma lanterna na popa, que ilumina apenas as ondas que
deixamos para trás" nas sábias palavras do poeta inglês Samuel Taylor
Coleridge (1772-1834)
De
início vamos esclarecer que o Ato Institucional Número Cinco (AI-5) foi o
quinto de dezessete grandes decretos emitidos pela ditadura militar nos anos
que se seguiram ao golpe de estado de 1964 no Brasil.O AI-5, o mais duro de
todos os Atos Institucionais, foi emitido pelo presidente Artur da Costa e
Silva em 13 de dezembro de 1968.
Consequências
imediatas do Ato Institucional Número Cinco foram:
1º)
- O Presidente da República recebeu autoridade para fechar o Congresso Nacional e
as Assembleias
Legislativas dos estados;
esse poder foi usado assim que o AI-5 foi assinado, resultando no fechamento do
Congresso Nacional e de todas as Assembleias Legislativas dos estados
brasileiros (com exceção de São Paulo) por quase um ano; o poder de fechar
forçadamente o Congresso Nacional seria novamente usado em 1977, durante a
implantação do Pacote de Abril;
Comparativo
com o ideal espírita: Pergunta 837 do Livro dos Espíritos "qual o
resultado dos entraves postos à liberdade de consciência"? Respondem os
espíritos: "constranger os homens a agirem de modo contrário ao que
pensam, torná-los hipócritas. A liberdade de consciência é um dos caracteres da
verdadeira civilização e do progresso".
2º)
- A permissão para o governo federal, sob pretexto de "segurança
nacional", para intervir em estados e municípios, suspendendo as
autoridades locais e nomeando interventores federais para dirigir os estados e
os municípios;
Comparativo
com o ideal espírita: Kardec em comentário à pergunta 872 diz que sem o
livre-arbítrio o homem não tem demérito no mal, nem mérito no bem, e isso é
igualmente reconhecido no mundo, onde proporciona a censura ou o elogio à
intenção , quer dizer à vontade,. Ora, quem diz vontade diz liberdade.
Em
resumo, indicar interventores, como aconteceu nas cidades de Santos e Cubatão é
vilipendiar a vontade popular. Durante muitos anos essas cidades foram
impedidas de eleger seus representantes.
3º) - A censura prévia de música, cinema, teatro e
televisão (uma obra poderia ser censurada se fosse entendida como uma
subversão dos valores políticos e morais) e a censura da imprensa e de
outros meios de comunicação; A ilegalidade das reuniões políticas não
autorizadas pela polícia; houve também diversos toques de recolher em todo
o país;
Comparativo
com o ideal espírita:
Pergunta 795 do Livro dos Espíritos : "qual é causa da instabilidade das
leis humanas"? Respondem os espíritos: "Nos tempos de
barbárie, são os mais fortes que fazem as leis e as fazem para eles".
Aqui me permito contar um caso ocorrido com o meu estimado sogro, o pensador
espírita Jaci Regis. Nessa triste época do AI-5 ele como jornalista possuía um
pequeno jornal na cidade de Cubatão em sociedade com um amigo. O jornal era
muito crítico ao interventor do momento em Cubatão. Este por sua vez fez uma
denúncia ao DOPS (Departamento de Ordem Pública e Social). Neste local
aconteciam prisões e torturas a quem ousasse criticar o regime militar. O
jornalista Vladimir Herzog foi um trágico exemplo.
Denunciado,
Jaci Régis foi "convidado" a comparecer à sede do DOPS em Santos.
Algumas pessoas entravam e não saiam mais. Jaci informou apenas seu grande
amigo José Rodrigues e sua esposa Palmyra. Felizmente foi apenas um susto, mas
que tirou o sono do Jaci até o caso ser resolvido. Resultado: fecharam o jornal.
4º) - A suspensão do habeas corpus (por crimes de
motivação política):
Explique-se: o habeas corpus é o mais básico dos
processos porque ele protege o mais básico dos direitos: à liberdade
pessoal;
Comparativo com o ideal
espírita: Pergunta 880 do Livro dos Espíritos: "Qual o
primeiro de todos os direitos naturais do homem"? "O de viver.
Por isso ninguém tem o direito de atentar contra a vida de seu
semelhante. Nem de fazer nada que possa
comprometer a sua existência corporal".
Espero
ter esclarecido a total incompatibilidade do ideário espírita com o AI-5. Por isso espíritas simpatizantes do presidente
Bolsonaro, solicito-lhes que pelo menos se recusem a aceitar essa aberração em
suas vidas doutrinárias.
Roberto
Rufo
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