A evolução do espírito e da matéria
Na revelação cristã é filosoficamente fundamental,
básico, o conceito de uma queda original do homem no começo da sua história, e
também o conceito de um Messias, um reparador, um redentor. Conceitos
indispensáveis para explicar o problema do mal, racionalmente premente e
racionalmente insolúvel. A solução integral do problema do mal viria unicamente
do mistério da redenção pela cruz - necessário complemento do mistério do
pecado original.
As palavras acima, retiradas de um site católico, mostram claramente
a diferença entre o cristianismo e o Espiritismo.
Como a Doutrina Kardecista pode analisar esse fato?
Se considerarmos a Teoria Evolutiva do Espiritismo, que contempla a
criação do ser espiritual “simples e ignorante”, compreenderemos que o
planejamento da evolução do ser espiritual, possui a mesma coerência que pode
ser constatada na análise do processo evolutivo geral. Ou seja, existe uma total coerência nos
processos de evolução dos elementos materiais e espirituais.
É o que nos ensina O Livro dos Espíritos, sobre a Lei Natural ou
divina.
“a lei natural abrange todas as circunstâncias da vida”.
A Teoria Evolutiva do Espiritismo, torna o ser espiritual parte do
mesmo processo que dinamiza e constitui o universo material. Esse dualismo
conceitual parece ser inevitável no encaminhamento intrínseco entre todos os
fatores da vida universal, entrosando matéria e espírito, embora cada um
determinando um caráter e um perfil que conjugado possibilita a vida.
No processo de evolução do universo, encontramos a inevitável
seqüência de nascer, viver, morrer e renascer, aplicada tanto ao ser espiritual
quanto aos elementos materiais. Em ambos os casos, temos uma “imortalidade”,
isto é, como disse Lavoisier, nada se perde, nada se cria, considerando a
reciclagem dinâmica dos fatores.
Dada a natureza diferenciada do elemento espiritual, a imortalidade
do espírito, contudo, conteria um elemento singular, consistente, que determina
uma individualidade permanente, isto é, embora intrinsecamente ligado ao
elemento material não se perde na dissolução eventual dos elementos, nem na
dissipação da energia produzida por eles. Na verdade como elemento da natureza
o princípio espiritual guarda a qualidade de ser, de constituir uma
individualidade que deteria a essência do movimento vivo, agregador, e dissipador
dos elementos.
Conforme se auto desenvolve esse elemento individual e espiritual,
ganha a capacidade de pensar, criar e recriar, submetendo elementos esparsos ao
vetor diretor de sua vontade.
Nesse sentido, assim como os elementos materiais são conjugados,
reciclados ao sabor da inteligência motriz, natural, o Espírito também precisa
de tempo e espaço para alongar-se, desenvolver-se.
No ciclo vida, morte, renascimento, o elemento espiritual possui o
ritmo acelerador da reencarnação, uma vez que está mais que evidente que, nessa
simbiose espírito-matéria que é a base do universo, a inteligência ou essência
motriz do ser espiritual organiza organismos para manifestar-se. É o princípio
da encarnação, entendida como elemento de aglutinação, ajuste e processual do
desenvolvimento das potencialidades do Espírito.
Na verdade podemos afirmar que a lei natural não é moral.
Se acompanharmos a evolução do princípio espiritual, por exemplo, no
nível animal, verificaremos que ai o elemento moral inexiste. Ou seja, um
pedrador ao atacar sua vitima não expede um julgamento moral, uma incerteza do
certo ou do errado. Ao destruir sua presa satisfazendo sua necessidade ele não
sente culpa.
Essa culpa será desenvolvida no nível hominal. Na transição de
elemento espiritual para Espírito, o ser agora dispõe de capacidade de
analisar, comparar e decidir. Mas, sobretudo, descobre o outro. É nessa
descoberta que se inicia propriamente o senso moral.
É nessa relação conflitiva e ao mesmo tempo essencial que ele
desenvolve o senso moral, o certo e o errado, o bem e o mal, dentro de
parâmetro que a organização social estabelece.
Ao iniciar a organização social houve a necessidade de nomear os
que, por eleição divina passaram a estabelecer as regras de comportamento, o bem
e o mal.de modo a permitir vida comum.
Por isso no estágio de desenvolvimento das civilizações primordiais
que povoaram a Terra o princípio da causalidade, ou seja, a análise dos fatores
a partir da realidade sensorial, a busca da razão e do porquê das coisas e dos
eventos, teria que centrar-se não apenas num criador poderosos, mas num criador
capaz de punir, reagir, zangar-se. Ou seja, um criador humanizado, como Jeová
dos judeus e os deuses de todos os povos e dos gregos, porque há, não obstante,
uma certa similitude entre todas as concepções sobre Deus nas civilizações que
se sucederam.
Afirmamos isso porque partindo do aqui e do agora, o comportamento
das pessoas teria que ser comparado a parâmetros definidos como sendo a lei de
Deus e, por isso, sujeitos a julgamento, condenação, punição e absolvição.
A visão científico-materialista sobre o homem decorre da análise
sensorial e das experiências genético-cerebrais, todavia inconclusivas.
Falta-lhe o sentido espiritual como o Espiritismo propõe, isto é,
sem conteúdo moral.
O conteúdo moral, como vimos foi estabelecido diante dos fatos
concretos do nascimento, da morte. Ele, portanto, é uma criação social, uma
forma de conter ou explicar o mal.
Mas o mal, segundo o Espiritismo, não é fundamento do ser, mas
conseqüência do conflito existencial, ao longo do processo.
Então, todo o quadro moral, punitivo e todo o julgamento divino que
as organizações sociais controladoras do comportamento e agenciadoras do consolo
perante e a morte criaram não pertence à lei natural.
Não é crível que a lei naturall ou divina estabeleça qualquer forma
de punição que é um estágio temporário e localizado na vida da pessoa, nas suas
relações e no convívio social.
Jaci Régis - 2006
NR: Texto publicado no Jornal ABERTURA de agosto de 2015
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