Por
Que Somos Simplesmente Humanos!
Jacira Jacinto da Silva
“Por que
são mais numerosas, na sociedade, as classes sofredoras do que as felizes?
– Nenhuma
é perfeitamente feliz e o que julgais ser a felicidade muitas vezes oculta
pungentes aflições. O sofrimento está por toda parte. Entretanto, para
responder ao teu pensamento, direi que as classes a que chamas sofredoras são
mais numerosas, por ser a Terra lugar de expiação. Quando a houver transformado
em morada do bem e de Espíritos bons, o homem deixará de ser infeliz aí e ela
lhe será o paraíso terrestre” (O Livro dos Espíritos,
q. 931).
Uma rápida pesquisa
sobre a biografia das maiores celebridades da história, de qualquer área:
ciência, arte, esporte, religião, política, ou outra, revelará que o(a) investigado(a)
não pode ser considerado unanimidade, não estava “acima do bem e do mal”, tinha,
ou tem, seus defeitos, e não raro apresentava, ou apresenta, alguma
característica um tanto estranha aos padrões usuais.
As pessoas
trabalham, lutam, buscam o aperfeiçoamento pelo estudo, pela reflexão e a
conscientização, mas o estágio da humanidade terrena não induz perfeição, donde
se inferem naturais as atitudes muitas vezes mal sucedidas, que denominamos
erros. Somos humanos, sendo natural que não acertemos sempre e não podemos
esperar perfeição dos outros. Mauro Spinola diz que cada
um dá o que tem.
Todos os dias e em
todos os momentos fazemos escolhas; viver é decidir se já é hora de comprar um
carro, ou trocar o que temos; se devemos investir em algum negócio, se
deveríamos mudar de emprego, se caberia diminuir a carga de trabalho, fazer ou
não uma viagem, e até se deveríamos visitar uma pessoa, ou comer algo
diferente. Evidentemente, dessas escolhas decorrem consequências, às vezes
boas, às vezes razoáveis e pode ocorrer de serem péssimas; muito desastrosas.
Também é certo que
todas as nossas ações têm reflexos, não só influenciando os outros, como os
atingindo diretamente. E como temos reagido ao sermos atingidos pelas consequências
ruins das escolhas das outras pessoas? Certamente, muito mal. Lógico,
inadmissível que alguém seja tão irresponsável a ponto de não se preocupar com
as consequências dos seus atos; todos deveriam cursar “MBA (Mestre em Administração de Negócios) para aprender a gerenciar riscos” e
ninguém, absolutamente, ninguém, portanto nós também, tem o direito de causar
mal a outrem.
Nós achamos que
estamos sempre corretos, mas deveríamos meditar sobre a seguinte frase
atribuída a René Descartes: “Não
há nada no mundo que esteja melhor repartido do que a razão: toda a gente está
convencida de que a tem de sobra” e não esquecer um só dia desta outra proposição do mesmo
pensador: Humanamente não existe um ser
feliz sem que o outro também seja.
Muito provavelmente
esteja nessa última frase a melhor de todas as explicações para o texto
epigrafado, extraído de O Livro dos Espíritos. Realmente, nenhuma pessoa, de
nenhuma classe social, é perfeitamente feliz, estando o sofrimento por toda
parte. A desigualdade social impõe aos que vivem à margem dos bens materiais
toda sorte de privação, implicando naturalmente em dores morais como o
preconceito e a discriminação. As classes privilegiadas também amargam suas
dores; debatem-se no antro da inveja, do ciúme, do egoísmo, da doença física e
mental, do crime, dos vícios etc.
Os espíritos
encarnados na terra revelam uma variação muito grande de evolução, talvez em
infinitos graus, disso resultando o convívio entre pessoas que se doam a causas
altruístas, como Irmã Dulce, e que destroem a paz social, como Marcola, no
mesmo país, sob as mesmas leis, formados em culturas muito similares. Mas são
extremos, por que a maioria dos humanos não está na posição de Irmã Dulce,
tampouco na de Marcola, navegando no mesmo barco daqueles que venceram
determinados vícios, mas não se desapegam de outros; que lutam contra a própria
natureza diariamente, buscando vencer a ignorância, a maldade, a inveja, a
gula, a hostilidade, a avareza, a vaidade exagerada, a tentação de enganar, de
se prevalecer, a arrogância etc. etc. etc.
Então, por que será
que mesmo estando nós nessa condição de relativa igualdade, é tão notória a
nossa intolerância com a dificuldade do outro, como se superar limitações fosse
tarefa exclusiva dos outros?
A pergunta tem
muito a ver com a resposta à questão de Kardec, que termina assim: Quando a houver transformado em morada do
bem e de Espíritos bons, o homem deixará de ser infeliz aí e ela lhe será o
paraíso terrestre. Talvez no mencionado tempo a sugestão de Descartes faça
sentido; por enquanto, essas dificuldades ocorrem por que somos simplesmente
humanos!
Jacira Jacinto da Silva, juíza de Direito reside em São Paulo e Presidente da CEPA
NR: Texto publicado no Jornal Abertura de Setembro de 2015
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