segunda-feira, 15 de julho de 2019

Entrevista com Deus - Reinaldo di Lucia


Entrevista com Deus

O título acima é de um filme que, ao que me concerne, passou sem grandes burburinhos pelos cinemas. Filmado em 2018, conta a história do jornalista Paul Asher, que volta para os Estados Unidos após cobrir a guerra do Afeganistão. Apesar de cristão, as visões da guerra abalaram seriamente sua fé; isto, aliado a problemas de ordem pessoal, deixaram Paul completamente desesperançado.

Em meio a todo este drama, ele tem uma oportunidade ímpar: entrevistar um homem que diz ser Deus. E pasmem: apesar de profundamente cristão, ele absolutamente não acredita que o homem seja mesmo Deus. Mas porque não tentar, não é mesmo?

E aí começa o problema: antes de mais nada, o que perguntar a Deus? Que tipo de indagações fazer ao criador de todas as coisas, que não pareçam pueris demais, e ao mesmo tempo não sejam genéricas a ponto de parecerem arrogantes? E mais, como ter certeza que não é uma mistificação, que não estamos na frente de um lunático ou um humorista?

E aí é que o filme entra numa espiral muito interessante. Entre perguntas de verificação de identidade “qual o resultado de uma multiplicação com números muito grandes” e outras bastante lógicas, apesar de óbvias “Porque coisas ruins acontecem a pessoas boas”, o filme trata com leveza e seriedade algumas questões de fundo para a religião e, porque não, para a filosofia: o que é a fé? O que fazer quando a perdemos? O que é a salvação? O que digo às pessoas que acham que você não existe?

Algumas vezes as respostas surpreendem, para um filme que possui um óbvio viés religioso – mais especificamente, cristão. Quando, por exemplo, é dito que o mundo é exatamente o que parece, ou quando exalta o livre arbítrio acima de tudo, inclusive de um eventual “plano de Deus”.

Ao mesmo tempo, bate de frente com as concepções mais comuns das religiões (inclusive a espírita), de que a vida de verdade não é esta, mas a vida no além, seja no paraíso ou em Nosso Lar: “Sua vida não é um teste para a vida pós morte”, diz Deus. Ao fim, o filme enfatiza que a única forma de continuarmos a viver é exercer o perdão – não só para com os outros, mas, principalmente, para conosco.

Enfim, ao quebrar com alguns paradigmas caros às mais diversas religiões do mundo, Entrevista com Deus faz-nos pensar não necessariamente nele, mas na vida, em seu significado e nas necessidades práticas que temos para seguir em frente. Afinal, de que adianta a crença se não conseguimos colocá-la em prática no nosso dia a dia?

A propósito, apenas mantermos a conversa viva: se você tivesse a oportunidade de entrevistar Deus, que perguntas você faria?

Nota: Artigo originalmente publicado no Jornal Abertura de Santos junho de 2019.

Quer ler o jornal completo:

https://cepainternacional.org/site/pt/cepa-downloads/category/28-jornal-abertura-2019?download=218:jornal-abertura-junho-de-2019


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quarta-feira, 10 de julho de 2019

Kardec o Filme - por Alexandre Cardia Machado


Kardec o filme

Foi assim no Brasil inteiro, o filme Kardec – história por trás do nome - arrastou muita gente para o cinema e todos queriam tirar uma foto junto ao cartaz. Não poderíamos ficar fora desta onda.


Na foto: Carolina e Reinaldo di Lucia; Heloisa e Evaristo da Lopestur amigos e nossos Apoiadores Culturais do ABERTURA, Palmyra Régis e Cláudia e Alexandre Machado um pequeno grupo entre tantos grupos santistas que foram prestigiar o filme.


Kardec: A história por trás do nome - tem a duração de 1hora e 38 minutos, aborda os momentos que antecedem o aparecimento e fundação do Espiritismo. Em sua resenha apresenta “ história do educador francês Hypolite Leon Denizard Rivail, reconhecido mais tarde como Allan Kardec. Além de tradutor e escritor, Kardec é conhecido por ter codificado o espiritismo”
O filme tem a direção de Wagner de Assis e foi lançado em 16 de maio de 2019. O roteiro é uma adpatação do livro Kardec – A Biografia de Marcel Souto Maior que escreveu também a biografia de Chico Xavier.

O filme balanceia bem as dificuldades, dúvidas e o intenso trabalho do professor Rivail e de sua esposa Amelié Boudet. A história é conhecida, mas talvez em função do trabalho biográfico ter sido feito por um jornalista não espírita tenha contribuído para uma edição mais realistas e menos corporativa do filme, comparado aos produzidos anteriormente.

Do site de FEB extraímos para os nossos leitores trechos da entrevista que foi publicada na Revista Reformador, trazemos Marcel Souto Maior o biógrafo, com Wagner de Assis o diretor  e  Leornardo Medeiros que protagonizou Kardec no filme:


Reformador: O que chamou a sua atenção para contar a história de Allan Kardec?
Marcel Souto Maior: Fui movido por uma pergunta-chave:  o que faz um professor cético mudar de vida e de nome, aos 53 anos, para dar voz aos Espíritos? Quis contar a história desta transformação radical – a do pesquisador cético, que se torna um missionário. O que o moveu? Que obstáculos – e preconceitos – ele enfrentou nesta caminhada?
O processo de escrita de uma biografia requer uma grande pesquisa. Nessa pesquisa você se identificou, de alguma forma, com Allan Kardec, no processo de Codificação da Doutrina Espírita?
Marcel Souto Maior: Sim. Eu me identifiquei com Kardec (ou com o professor Rivail) em dois pontos fundamentais: o cuidado com a pesquisa (precisamos estar sempre checando e “rechecando” informações para evitar erros) e o ceticismo (um dos traços marcantes de sua personalidade, como professor e pesquisador, na primeira etapa de sua vida). Moveu-nos um misto de curiosidade e de desconfiança.
Como é adaptar para o cinema a história do responsável por codificar a Doutrina Espírita?
Wagner de Assis: Por um lado, um novo desafio cinematográfico, com grande complexidade de realização, pois é um filme de época, cuja história se passa num outro país. Por outro lado, um respeito absurdo, uma humildade extrema e uma alegria imensurável. Não temos a pretensão de ser definitivos a respeito de Kardec. Há diversos trabalhos e estudos sobre ele e acho que devem ser feitos cada vez mais. Também não temos a pretensão de contar toda a sua vida, embora seja uma cinebiografia como gênero. Nós nos concentramos no que de mais importante aconteceu na vida dele. É um recorte, uma escolha e assim seguimos adiante. Vale lembrar também que não é um documentário, mas sim uma ficção, dramaturgia, que precisa respeitar algumas leis quando se conta uma história. O filme tem como base a forma como o Marcel Souto Maior escreveu a biografia.
Queremos contar um pouco da vida do professor Rivail para os que o conhecem, mas também para os que não o conhecem. Porque os primeiros sempre podem se surpreender com detalhes, aspectos humanos pouco comentados em geral. Os demais, com certeza, vão se surpreender muito ao encontrar um homem de seu tempo, um homem de ciências, um educador e professor à frente de seu tempo, e, acima de tudo, um homem de muita coragem e bom senso.
Está gostando? Quer ler no original? está disponível em pdf.

O que representa para você interpretar Allan Kardec?
Leonardo Medeiros: Sinto-me ao mesmo tempo imensamente agradecido e temeroso. Estou representando um ícone que faz parte da minha vida dentro de uma família espírita.
Como foi a escolha do elenco para este filme?
Wagner de Assis: Costumo dizer que é maravilhoso ver quando o filme tem vida própria e vai “escolhendo” os profissionais que nele tomarão parte. Claro que procuramos artistas que possam estar sintonizados com os personagens, na verdade sintonizados com pessoas que fazem parte de toda a história de Kardec. Mas a escolha em si tem sempre algo “mágico”, que foge aos aspectos puramente “acidentais”.
Um desses casos, por exemplo, foi Leonardo Medeiros. Nós nos conhecemos, falamos do projeto, lemos um pouco o roteiro e vimos claramente que ali havia um profissional absolutamente capaz de defender a história do professor Rivail na tela. Só depois é que, para nossa surpresa, soubemos de sua ligação com o tema, com a família do Eurípedes Barsanulfo. Isso é muito legal, mas de forma alguma representa um peso para a sua escolha. Assim o fizemos com todos do elenco. Os personagens vão se afeiçoando aos seus intérpretes e pronto. Ganham vida.
Rivail mudou de vida e de nome. Tornou-se Allan Kardec para dar voz aos Espíritos… A história de Kardec é a história de uma conversão, citou Marcel Souto Maior. O que podemos esperar desta adaptação nos cinemas?
Wagner de Assis: Uma jornada de transformação, movida por uma busca  incessante pela verdade, com um pano de fundo de uma sociedade muito sofrida, com índices altos de suicídio, qualidade de vida baixíssima e uma guerra de ideologias. Não poderemos jamais entender o passado com os olhos do presente. Mas podemos delinear como era a Paris de 1850, por exemplo. E buscar entender o papel das instituições como a Ciência, a Igreja, o Estado francês, para que os personagens possam vivenciar os dramas, os receios, os sonhos daquela época. Esta é a história de um homem que aceitou recomeçar de certa forma uma nova vida depois dos 50 anos. Costumo pensar metaforicamente que ele descobriu um tesouro e quis compartilhar com o mundo. Mas, claro, tinha um preço muito alto. E ele pagou para ver.
Sem dar muito spoiler, resumimos que o filme é muito bom e vale a pena conferir.


segunda-feira, 24 de junho de 2019

42 Anos da Lei do Divórcio e o que mudou na sociedade brasileira - por Roberto Rufo


42 Anos da Lei do Divórcio e o que mudou na sociedade brasileira

"Há pessoas que se casam em comunhão de male ". Luís Fernando Veríssimo.

      Situação atual

Um em cada três casamentos no Brasil termina em separação, revela o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados são um reflexo das facilidades de dissolução desse tipo de sociedade trazidas pela Lei do Divórcio (nº 6.515/77), que completará 42 anos no país em dezembro de 2019.
As últimas Estatísticas do Registro Civil do IBGE mostram que o Brasil registrou 1.095.535 casamentos civis em 2016. No mesmo período, foram registrados 344.526 divórcios em 1ª instância ou por escrituras extrajudiciais, um aumento de 4,7% em relação a 2015. 
Na comparação com os dados de 1984, quando houve 93.384 pedidos de divórcio, o crescimento do número de separações nesta modalidade é de mais de 30%.
Os dados apontam uma grande mudança em quatro décadas. "Antes da Lei do Divórcio, o casamento era pautado pelo vínculo indissolúvel. As pessoas casavam e ficavam atadas até o fim da vida a essa relação", relata o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família em São Paulo (IBDFAM-SP), João Aguirre, professor e especialista em Direito Processual Civil.
 Aguirre lembra que antes a lei fechava os olhos para a realidade social. "Tem casamento que não chega até o fim da vida, mas a lei só permitia o desquite. A pessoa não podia se casar de novo. O divórcio foi uma luta de muitos anos no Brasil", conta o professor.
Uma análise espírita em 1958
Evolução em Dois Mundos é um livro espírita, psicografado pelos médiuns Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira, com autoria atribuída ao espírito André Luiz. Publicado pela Federação Espírita Brasileira no ano de 1958.   
Abaixo um texto do citado livro tratando da questão do matrimônio e o divórcio.
  "Quanto ao divórcio, segundo os nossos conhecimentos no Plano Espiritual, somos de parecer não deva ser facilitado ou estimulado entre os homens, porque não  existem na Terra uniões conjugais, legalizadas ou  não, sem vínculos graves no  principio da responsabilidade assumida em comum. Mal saídos do regime poligâmico, os homens e as mulheres sofrem­ ainda as sugestões animalizantes e, por isso mesmo, nas primeiras dificuldades da tarefa a que foram chamados, costumam desertar dos postos de serviço em que a vida os situa, alegando imaginárias incompatibilidades e supostos embaraços, quase sempre simplesmente atribuíveis ao desregrado narcisismo de que são portadores. E com isso  exercem viciosa tirania sobre o sistema psíquico do  companheiro ou da companheira mutilados ou doentes, necessitados ou ignorantes, após explorar-­lhes o  mundo emotivo, quando não se internam pelas aventuras do homicídio ou  do  suicídio espetaculares, com a fuga voluntária de obrigações preciosas. É imperioso, assim, que a sociedade humana estabeleça regulamentos severos a benefício dos nossos irmãos contumazes na infidelidade aos compromissos assumidos consigo próprios, a benefício deles, para que se não agreguem a maior  desgoverno, e a benefício de si mesma, a fim de que não regresse à promiscuidade aviltante das tabas obscuras, em que o princípio e a dignidade da família ainda são  plenamente desconhecidos. Entretanto, é imprescindível que o sentimento de humanidade interfira nos casos especiais, em que o divórcio é o mal menor que possa surgir entre os grandes males pendentes sobre a fronte do casal, sabendo­-se, porém, que os devedores de hoje voltarão amanhã ao acerto das próprias contas" .
O norte teórico da doutrina espírita
No capítulo XXII do livro O Evangelho Segundo o Espiritismo de nome "Não separeis o que Deus juntou"  há um subtítulo dedicado ao divórcio, Allan Kardec é categórico ao afirmar que o divórcio é uma lei humana que tem por objeto separar legalmente o que já, de fato, está separado.
O escritor israelense Amós Oz, recentemente falecido, dizia que o problema maior não são especificamente os livros sagrados, mas os imterpretadores dos livros sagrados. No caso do Espiritismo isso ocorreu, ainda mais com a forte influência católica dos seus "profetas" maiores, dentre eles Chico Xavier.
Kardec tinha muito apreço pelo progresso da legislação humana, e afirma que a lei civil tem por fim regular as relações sociais e os interesses das famílias de acordo com as exigências das civilizações.
Portanto companheiros espíritas, fiquem tranquilos, se necessário podem se divorciar pois não serão devedores que voltarão amanhã ao acerto das próprias contas. Esse pensamento de "devedor/culpa", no caso do divórcio é mais um ato da perseguição religiosa às mulheres. A infeliz teria que prestar contas futuras unindo-se novamente com o chatíssimo marido da encarnação anterior. Ninguém merece.
Roberto Rufo.

Nota: Artigo originalmente publicado no Jornal Abertura de Santos maio de 2019. Ficou interessado nesta edição? baixe aqui!

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quinta-feira, 20 de junho de 2019

Abrindo a Mente - Cuidado com o Novo Golpe Mediúnico - por Alexandre Cardia Machado


Abrindo a mente - Novo golpe mediúnico

Allan Kardec no Livro dos Médiuns já nos advertia em relação aos perigos da mediunidade e dos médiuns, a história está repleta de charlatães e não perderemos tempo aqui relembrando, mas sim tentando alertar os amigos leitores.

No Livro dos Médiuns encontramos referência ao Charlatanismo em 3 lugares: Primeira Parte, no Capítulo 4° - ... do Charlatanismo; na Segunda Parte, capítulos 27° e 28° , Das contradições e das mistificações e Do charlatanismo e do embuste. Além destes capítulos o mestre faz referência à palavra Charlatanismo 28 vezes nesta obra.

Por que Kardec faria tantas menções a isto? Porque os médiuns charlatães existem desde sempre e sendo a mediunidade algo sutil, muitos ardis podem ser usados para enganar as pessoas.
Fica o convite a todos que revisem os pontos assinalados. 

Destacaremos aqui:

“ Médiuns interesseiros 304. Como tudo pode tornar-se objeto de exploração, nada de surpreendente haveria em que também quisessem explorar os Espíritos. Resta saber como receberiam eles a coisa, dado que tal especulação viesse a ser tentada. Diremos desde logo que nada se prestaria melhor ao charlatanismo e à trapaça do que semelhante ofício. Muito mais numerosos do que os falsos sonâmbulos, que já se conhecem, seriam os falsos médiuns e este simples fato constituiria fundado motivo de desconfiança.”

“306. Médiuns interesseiros não são apenas os que porventura exijam uma retribuição fixa; o interesse nem sempre se traduz pela esperança de um ganho material, mas também pelas ambições de toda sorte, sobre as quais se fundem esperanças pessoais”

“308. A faculdade mediúnica, mesmo restrita às manifestações físicas, não foi dada ao homem para ostentá-la nos teatros de feira e quem quer que pretenda ter às suas ordens os Espíritos, para exibir em público, está no caso de ser, com justiça, suspeito de charlatanismo, ou de mais ou menos hábil prestidigitação. Assim se entenda todas as vezes que apareçam anúncios de pretendidas sessões de Espiritismo, ou de Espiritualismo, a tanto por cabeça. Lembrem-se todos do direito que compram ao entrar”

Não precisamos ir muito longe para sabermos de médiuns que correm o Brasil, fazendo palestras, recebendo cartas de Espíritos e vendendo livros com grande divulgação. O que há de ruím nisso? Tudo ou nada. Nada se forem honestos e tudo se forem charlatães.

Nos dias de hoje é muito fácil obter informações de uma pessoa que ficou viúva, que perdeu um filho ou de um marido que perdeu sua esposa, as informações estão nas redes sociais. Em eventos públicos como os que disse acima, nestas visitas em cidades, muitas vezes os grupos que as organizam de forma sincera, para receber algum médium famoso, criam grupos de WhatsApp, fazem propagandas pelo Fecebook. Logo, algumas pessoas comentam que gostariam de ir e receber uma carta de seu ente querido, dizem algo como: Vou sim, perdi meu filho e não me conformo, dizem o nome do filho, e está aberta a porta para o “medium charlatão” .

Pelo Facebook, alguém com algum conhecimento de informática, começa a pesquisar e vai montando um mosaico, com nome, apelido da pessoa que desencarnou, onde ela estudou, quem eram seus amigos que se manifestaram ou comentaram no face. Tudo isso e principalmente se a morte foi trágica, darão o pano de fundo para a montagem da farsa da carta espiritual em geral vaga, mas com alguns elementos de identificação. Isto está acontecendo é só dar um “google” para ver.

Concluindo: “Melhor é repelir dez verdades do que admitir uma única falsidade, uma só teoria errônea. Efetivamente, sobre essa teoria poderíeis edificar um sistema completo, que desmoronaria ao primeiro sopro da verdade, como um monumento edificado sobre areia movediça, ao passo que, se rejeitardes hoje algumas verdades, porque não vos são demonstradas clara e logicamente, mais tarde um fato brutal ou uma demonstração irrefutável virá afirmar-vos a sua autenticidade”. (Erasto, livro dos Médiuns capítulo XX)

Para abrir mais a sua mente: Leia e estude o Livro dos Médiuns.

Nota: Artigo originalmente publicado no Jornal Abertura de Santos.

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segunda-feira, 17 de junho de 2019

Admirável Mundo Novo! por Alexandre Cardia Machado


Admirável Mundo Novo!

As vezes precisamos olhar para trás e ver o quanto a humanidade mudou, no livro Homo Deus – Uma Breve História do Amanhã  -Yuval Noah Harari - inicia o livro fazendo uma reflexão quanto os problemas que nosso planeta enfrentou nos últimos 20 mil anos, poderíamos reduzí-los a três aspectos: fome, pestes e guerras.

Como morte por fome é bem mais difícil de documentar, vou me concentrar nestes dois aspectos: guerra e pestes, não precisaremos recorrer à idade média e a peste bubônica, fiquemos apenas com o que ocorreu no século  20 e 21.

Século 20 - Guerras:
1ª Guerra Mundial – 9 milhões de mortes;
Revolução Russa  – estima-se em 40 milhões de mortes;
2ª Guerra Mundial – 26 milhões de mortes;
Genocídio Nazista -  20 milhões de mortes;
Revolução Chinesa – estima-se em 65 milhões de mortes;
Guerra da Coreia – cerca de 2 milhões de pessoas mortas;
Guerra do Vietnan – cerca de 1,2 milhões de mortos;
Guerra Irã – Iraque – cerca de 1 milhão de pessoas mortas;
Guerra dos Balcãs – cerca de 600 mil mortos entre combatentes e extermínios racias.

Século 21 – Guerras
Principalmente a chamada Primavera Árabe – estima-se algo entre 100 e  200 mil mortos nos diversos países onde ocorreram.
No século 20 – 50 milhões de pessoas morreram de Gripe Espanhol, ao redor do mundo logo após a 1ª Guerra Mundial. Os mesmos navios que levavam comida e munição a Europa voltavam trazendo, para todos os portos a gripe.

O século 21 está no começo e a humanidade tem a capacidade de se auto-destruir graças as centenas de armas nucleares que criamos, mas nada indica que isto venha a ocorrer. Apesar de seguirmos atirando uns nos outros, morrem mais pessoas de “acidentes” de trânsito ou de sobrepeso, do que por bala ou por fome, ainda que em pontos isolados do planeta possamos ter situações fora da curva média. Os surtos de gripe asiática, Ébola e outros foram rapidamente controlados. A diferença entre hoje e 100 anos atrás é a existência de tecnologia e investimentos em investigação e uma rede de sustentação mundial, capaz de deter qualquer ameaça.

O que mudou tudo isso? No meu entender o avanço do conhecimento, da telecomunicação, dos organizações internacionais, a ONU, a globalização. Com isto, apesar dos problemas que causamos no meio ambiente, formamos uma rede de interdependência que nos une e torna mais difícil o aparecimento de conflitos entre nações, temos uma grande rede de amortecimento.

Vejam o caso da Venezuela, há 30 anos atrás já estaríamos todos em guerra. Hoje cada cidadão no mundo tem uma câmera fotográfica na mão, que pode enviar imagens imediatamente para o mundo todo. Isso existe há pouco mais de 10 anos e está mudando a nossa maneira de viver. Tecnologia que sempre terá um lado bom, tem também um lado mal, que veremos a seguir é a capacidade de proporcionar um excesso de controle.

Hoje se há um crime, no mundo todo as polícias vão atrás de imagens e programas de identificação de face  ajudam a resolver casos, claro não estamos no mundo ideal, pois o ideal seria não haver crimes. Ou que todos os crimes fossem resolvidos. Mas hoje está muito difícil esconder uma mentira. Tem gente que não se deu conta ainda, ok, vai parar atrás das grades, mais cedo ou mais tarde.
Pela primeira vez, existe uma matriz de informação nas nuvens, nos algorítmos e isto causará mudanças a velocidades impressionantes. Allan Kardec nos falava da aristocracia Intelecto-moral, e que eleas levariam o mundo a um estágio melhor, não me parece que isto ocorrerá por imposição dela, mas em consequência da maneira que nos portamos. Hoje não somos apenas uma pessoa com RG e CPF, somos pessoas com RG, CPF e perfil. Sim, perfil, os bancos, as lojas os algorítmos sabem do que gostamos, onde vamos e com quem nos relacionamos. E damos todas estas informações de graça.

Gostamos da facilidade da tecnologia, mas como já dizia Ulisses Guimarães, não existe jantar de graça, quando uso o waze, que é muito bom, pois não me deixa ficar perdido, no mesmo momento que me diz onde estou, alimenta o algorítmo, eu forneço uma séria de informações para o aplicativo, que serão transformadas em dinheiro. Poderemos explicar em mais detalhes como eles ganham dinheiro em outro artigo.
Voltando à questão da aristocracia intelecto-moral, ouso dizer que teremos a aristocracia tecnologica-moral, andaremos fazendo o certo porque senão o “big brother” vai nos pegar! É mais ou menos como a velha propaganda de biscoitos Tostines– por que eles são sempre crocantes? Porque são sempre novinhos. Por que são sempre novinhos? Porque alguém está sempre comprando e assim por diante.

Acredito portanto que em mais alguns anos estaremos todos vivendo numa grande Singapura, onde hoje ninguém deixa cair um papel no chão, pois há câmaras em todos os lados, reconhecimento facial e multa via internet, assim, logo todos ficam bons cidadãos.
Pode demorar uns 10 ou 15 anos mais esta onda vem. Aristocracia tecnologica-moral, seremos todos mais parecidos, auto controlados e controlados pelo sistema.

Pense nisso.

Editorial Jornal Abertura - Maio 2019

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sexta-feira, 7 de junho de 2019

Afinal o que somos nós? por Alexandre Cardia Machado


Nos dias de hoje onde diversas pressões sociais nos afetam, tem ficado muito difícil agarrar apenas uma bandeira. Quando tratamos de coisas mundanas é fácil dizer, torço pela seleção brasileira de futebol, ou no meu caso particular, torço para S.C.Internacional de Porto Alegre. Mas se tratando de coisas mais complexas como direitos, embates sociais, encontrar um perfil que bata com um grupo específico, fica muito mais difícil.

Assistindo a um programa de TV outro dia aqui em Santos, havia um palestrante falando de Espiritismo. Com espírita vi que eu não era do grupo dele, ficou muito claro para mim, ele falava da ação que se passa neste momento, coordenada do plano espiritual, liderados por Jesus, que estariam movendo nosso planeta para uma transição planetária, algo que dizem vir em ciclos de 28.000 anos. Ele buscava argumentos e apoio em Kardec, em Emmanuel e por aí ia. Eu pensei, eu sou espírita, ele é espírita, mas pensamos de forma muito diferente quanto ao papel do Mundo dos Espíritos. Portanto se ele se diz espírita e eu me digo espírita, algo está muito errado.

Ah! Mas o meu grupo, aquele com a qual me afinizo muito,  se diz espírita laico e livre-pensador, logo não somos exatamente iguais, ele era de outro tipo, do chamado espírita religioso. Bem,com isto consegui dormir à noite.

Mas fiquei com a pulga atrás da orelha e começei a me questionar, não vou dar todas as minhas respostas, mas ao contrário, tenho a intenção de passar a pulga para vocês.
Sobre o que eu pensava? Sobre as questões que nos afetam no dia a dia, então vejamos:

  • ·         Se queremos mais liberdade e flexibilidade social, somos progressistas e liberais;
  • ·         Se queremos manter direitos trabalhista criados num mundo dos anos 40 do século passado, sem atualizá-los para o mundo de 2019, somos conservadores;
  • ·         Se somos a favor da liberdade sexual, da emancipação da mulher em todos os seus aspectos, somos progressistas;
  • ·         Se queremos as mulheres submissas, só trabalhando em casa, somos conservadores;
  • ·         Se somos contra o controle do estado na economia, a favor das liberdades individuais e empresariais, somos liberais e deveríamos ser considerados neste aspecto progressistas;
  • ·         Se somos a favor da economia de estado, com estatais, tudo passando por funcionalismo público, por mais eficiente que se possa imaginar um cenário destes, somos conservadores;
  • ·         Se somos favoráveis às novas formas de trabalho, com horário flutuante, home-office, sem cartão de ponto, somos progressistas;
  • ·         Se quisermos que todos os empregados fiquem dentro da empresa, com cartão de ponto, horário fixo e supervisão, somos conservadores;
  • ·         Se somos contra o uso de tecnologia, para aumentar a produtuvidade da agricultura, reduzir o prejuízo, no campo, o que somos? Conservadores não?
  • ·         Se somos a favor da liberdade de escolha de profissões, das diversas formas de trabalho não convencionais, via internet somos progressistas, não?
  • ·         Se formos nacionalistas, que defendem suas fronteiras, com medo dos estrangeiros e sua cultura, seríamos conservadores, né?
  • ·         Agora, se formos a favor de um mundo sem fronteiras, sem barreiras religiosas, onde o céu seja apenas o espaço sideral, seríamos progressistas, imagine, apenas imagine ...;
  • ·         Se acharmos que o Espiritismo verdadeiro é apenas o nosso, bem, infelizmente seremos conservadores e apegados ao passado.

Chego a conclusão portanto, que não dá para cravar 100% no progressista. Nem, muito menos 100% no conservador. Somos seres complicados e vivemos num ambiente complexo, cheio de viéses e de interesses de grupos de pressão em todos os aspectos, no social, no político, no marketing, na família, no campo espiritual.

Resta entender e aproveitar este que é, o processo maravilhoso da vida, de experimentar, de avaliar, de repensar e reposicionar-se. Enfim viver.

Alexandre Cardia Machado

Nota: Artigo originalmente publicado no Jornal Abertura de Santos maio de 2019 agora disponível no link abaixo:

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terça-feira, 7 de maio de 2019

O PACOTE ANTICRIME - por Jacira Jacinto da Silva


O PACOTE ANTICRIME

Jacira Jacinto da Silva*

Fazer aos outros o que quereríamos que os outros nos fizessem, isto é, fazer o bem e não o mal. Neste princípio encontra o homem uma regra universal de proceder, mesmo para as suas menores ações.[1] 


Com o intuito de contribuir para os debates acerca do Anteprojeto de Lei, n. /2019, apresentado ao Congresso Nacional pelo Ministro da Justiça Sergio Moro, faço algumas considerações sobre o seu pacote anticrime. Apresento uma análise crítica de alguns pontos com base na ciência jurídica e no espiritismo. Por questão de espaço e para não cansar em demasia o leitor, tratarei de apenas alguns pontos explicitamente.

Será que o “novo” sistema que se pretende implantar para o tratamento de pessoas em conflito com a lei é favorável à sociedade? Estamos na iminência de um giro importante no panorama atual, ou de mera proposta salvacionista?

Os textos propõem alteração em mais de uma dezena de leis, especialmente para endurecer penas de diversos crimes, dificultar o cumprimento da pena e suprimir direitos previstos no decorrer da execução da pena.

Considerando que os fatos podem, sempre, ser analisados por mais de um prisma, tentarei fazer um estudo de algumas propostas (todas não caberiam neste espaço) contando com a contribuição da Filosofia Espírita. Por evidente, ainda por esse enfoque muitas interpretações são possíveis, dado que o próprio texto de Kardec é visto por variadas posições.

Começar refletindo com Kardec sobre algumas questões relevantes, tanto espíritas, como jurídicas, pode ser útil:

Q. 796 de OLE: No estado atual da sociedade, a severidade das leis penais não constitui uma necessidade?
“Uma sociedade depravada certamente precisa de leis severas. Infelizmente, essas leis mais se destinam a punir o mal depois de feito, do que a lhe secar a fonte. Só a educação poderá reformar os homens, que, então, não precisarão mais de leis tão rigorosas.”

A lição espírita é clara e nos coloca no dever de melhorar a sociedade para que não sejam necessárias penas mais graves; não há como não entender que a opção pelo revide vai deixando a sociedade cada vez pior. A trajetória para a modificação da lei penal, com incidência sobre uma nação inteira, não pode ser desconsiderada, sendo certo que a maneira utilizada para desenvolver o projeto faz parte da construção social. Não à toa, Leon Denis escreveu que as instituições, as leis de um povo, são a reprodução, a imagem fiel de seu estado de espírito e de consciência, e demonstram o grau de civilização ao qual ele chegou.

Quase poderíamos parar por aqui, resumindo o desfecho nessas lições soberanas, mas convém prosseguir.

A partir da finalidade precípua da pena (prevenção ao crime e à reincidência, contramotivo - repressão e prevenção), quais seriam as justificativas filosóficas para a prática estatal que foca no viés retributivo?
Calha recordar que nem a delação premiada, nem a transação penal, envolvendo acusação e defesa, pode ser considerada novidade no sistema penal pátrio; a está primeira regulamentada em 2013, a segunda pela já envelhecida lei dos juizados especiais criminais. Este parágrafo renderia debate robusto, consideradas as supostas novidades, porém não é o objetivo deste trabalho.

Recorde-se, antes de qualquer análise do projeto, de que a garantia dos direitos fundamentais foi objeto de amplo debate, não apenas durante a constituinte, mas representou décadas de luta contínua e aperfeiçoamento de outros dispositivos esparsos. Contrariamente, esta mudança a ser debatida no Congresso Nacional é atribuída ao trabalho de um brasileiro, não representando, portanto, um debate amadurecido, a síntese de discussões múltiplas, ou sequer uma tempestade de ideias; nem de longe espelha contribuições de diversos juristas. Uma única pessoa, por mais versada que seja em direito criminal, estaria legitimada a propor uma mudança dessa proporção?

No conteúdo, a proposta de lei afronta garantias constitucionais, forjando-se no desrespeito ao princípio democrático, com o qual têm se alinhado significativos debates na sociedade. Esta, na condição de destinatária final da lei, bem poderia ter sido representada pelos juristas renomados, especialistas nas áreas do Direito Penal e Processual Penal.

Estudiosos do tema não veem na mencionada proposta qualquer potencial para atingir o seu objetivo. Para além de repetir medidas experimentadas há três décadas sem nenhum sucesso, alguns dispositivos sugeridos agridem de forma espantosa direitos fundamentais garantidos constitucionalmente e construídos ao longo de séculos a custa de muita luta e sofrimento. Há total descrença de que as poucas inovações tenham capacidade de provocar qualquer alteração no status quo. 

Sinalizando ao novato representante do governo que ninguém se sustenta no sistema político brasileiro por si só, logo na largada os experientes congressistas sagraram-se vitoriosos, impondo a retirada da proposta inicial que tipificava o “caixa dois em eleições”. Salta aos olhos a repetição do velho mecanismo de impressionar por palavras, pelo medo e pela aposta na incapacidade intelectual do povo. Basta analisar a sugerida transformação de determinados crimes em hediondos e insuscetíveis de benefícios na execução da pena.

Mas algo precisaria ser feito, diriam alguns. “A criminalidade é alarmante, as pessoas de bem não têm sossego; que sacrifiquem os criminosos pela paz das pessoas trabalhadoras”. Em certa medida, esse pensamento está coerente com as necessidades dos brasileiros; no entanto, essa gente também está cansada de promessas vãs, de medidas midiáticas que só favorecem políticos espertalhões, ávidos por sucesso conquistado com a enganação alheia, pública e inescrupulosa. Não se transforma um estado de criminalidade em vida pacífica senão depois de décadas de trabalho sério e investimento nas políticas públicas de segurança e de justiça social.

Pelo compromisso ético de justificar algumas afirmações, trago à análise a Lei 8.072/90, denominada Lei dos Crimes Hediondos, que completaria 30 anos em 2020. Foi dado ao tráfico de drogas e outros crimes o mesmo tratamento dispensado aos crimes hediondos. Deixo ao leitor a reflexão sobre o resultado obtido pela população nessas quase três décadas passadas. Houve redução, ou aumentou o tráfico de drogas? Outros exemplos poderiam ser mencionados, porém, esse é bastante emblemático e transmite a ideia necessária.

Os políticos e o povo precisam de respostas imediatas. Imaginem se um político esperto pensaria em implementar medidas, sabidamente eficazes, com potencial de promover transformações importantes, mas em longo prazo! Gostaríamos de pagar o preço, trabalhar junto, fazer acontecer uma mudança lenta, porém eficaz? Necessário recordar que o órgão acusador da União recebeu, por muito tempo, a alcunha de “engavetador geral da república”, situação que experimentou significativa mudança a partir do empoderamento da Polícia Federal. Quase uma década depois de se iniciarem as medidas de fortalecimento dessa Instituição começaram a aparecer os resultados, que saltam aos olhos de quem deseja enxergar.

As medidas, no âmbito do Poder Judiciário, que apresentam soluções “rápidas e eficazes”, em regra, solapam garantias individuais constitucionais e violam acintosamente o Estado Democrático de Direito.
Algumas modificações vieram apenas para ampliar o raio de incidência da norma, ou para agravar a situação do criminoso; outras propõem novidades inexpressivas; servem para aperfeiçoar ou legalizar práticas já adotadas no Brasil, permitindo inferir que não terão capacidade de imprimir grandes modificações.

Reporto-me a algumas propostas que se apresentam por demais inconsistentes e inconvenientes ao meu ver. Novidade é condicionar a inclusão do preso, condenado ou provisório, em estabelecimentos penais federais de segurança máxima ao interesse da segurança pública ou do próprio preso. Esse ilimitado poder conferido à segurança pública, que passa a dispor do preso para os fins que considerar do seu interesse, sem precedentes no direito penal do último século (excetuado o regime da ditadura militar), além de reduzir o Poder Judiciário, submetendo-o ao Executivo, prejudica sobremaneira os meios de defesa.

Não se vislumbra razão plausível para o legislador alterar a disposição penal sobre a legítima defesa. Embora diplomas europeus mencionem expressamente que o excesso será escusável na legítima defesa se decorrer de perturbação, medo, surpresa ou violenta emoção, no Brasil tal circunstância sempre foi observada, considerado o natural abalo emocional de quem precise, eventualmente, exercitar a legítima defesa. O excesso é sempre punível, exceto em situação excepcional, demonstrada a condição de inegável abalo emocional, que não se confunde com autorização para matar.

Essa excludente da ilicitude sempre foi contemplada, possivelmente, confundindo-se com a história do direito penal. Não obstante, o direito a “repelir injusta agressão humana atual ou iminente” ganhou contornos inimagináveis no projeto do Sr. Moro, quando envolve policial ou agente de segurança. Nesse caso, contraria a finalidade, já que ninguém pode se exceder na legítima defesa, muito menos o policial que recebe treinamento para o enfrentamento do crime. Como esses profissionais jamais estiverem excluídos da proteção legal, a inovação se revela deveras inútil e impertinente, servindo, isto sim, para banalizar a violência, naturalizando-a e disseminando a cultura do excesso neste país demasiado violento.
Outra novidade incluída por Moro na sua proposta, refere-se à qualificadora do crime de resistência, configurando verdadeira lambança. Caso passe no Congresso, o dispositivo criará uma anomalia gravíssima do nosso sistema penal, com impacto muito danoso à sociedade. Consta do § 2º do art. 329: “Se da resistência resulta morte ou risco de morte ao funcionário ou a terceiro: pena – reclusão, de seis a trinta anos, e multa”.

Quando se utiliza da condição “se resulta morte”, a lei está se referindo a um crime doloso na sua origem (resistência, lesão corporal, por ex.), mas que termina por apresentar resultado não desejado (a morte), culposo, portanto – crime preterdoloso. Ocorre que para o crime doloso de homicídio (matar alguém é o objetivo inicial), a lei prescreve pena máxima de 20 anos. Com efeito, se alguém desejar matar um policial e concretizar seu intento, sua pena máxima será de 20 anos, mas se estiver sendo autuado por um agente público, resistir e na tentativa de escapar, sem desejar, terminar provocando a sua morte, a pena máxima será de 30 anos. Não pode ser crível que o legislador queira para o crime não desejado - culposo, pena mais grave do que a prevista para o mesmo crime desejado - doloso. Nem se diga que criou um tipo penal pela imposição de uma qualificadora!

Estranha-se, igualmente, a figura do “informante do bem" ou "whistleblower", extraída do pacote "Dez Medidas Contra a Corrupção". A proposta confere ao denunciante de crimes contra a Administração Pública, ilícitos administrativos ou quaisquer ações ou omissões lesivas ao interesse público, o direito à recompensa de até 5% do valor arrecadado, se a denúncia resultar na recuperação de dinheiro desviado, além de lhe conceder proteção. Qual seria o impacto dessa medida na questão da segurança, tão necessária para a população?
Não foi possível entender a razão de Moro ter concedido status jurídico a organizações criminosas, como PCC, CV, Milícias e outras. Esse reconhecimento reduz o Estado.

Em resumo, apresentou um pacote muito abrangente, dotado de restrições aos direitos e garantias individuais, como a progressão de regime, que favorece a sociedade e não o condenado; o excesso de encarceramento, agravando a situação irregular já existente de presídios superlotados; a restrição a recurso, que garante a ampla defesa; a ampliação da execução provisória da pena e a alteração dos prazos prescricionais, além de outras no mesmo sentido, que contrariam garantias fundamentais constitucionais e ampliam a força estatal em prejuízo da parte que já é muito mais fraca.
De fato, há um clamor de grande de parte da população, pela pena de morte, pelo agravamento das penas, preferencialmente com requintes de crueldade, mas a pena prevista na lei brasileira mais grave é a de privação da liberdade. Sabendo-se que o Brasil conta, há muito tempo, com um sistema prisional falido, sendo recorrentes as notícias de chacinas, fugas em massa, rebeliões, massacres e situações catastróficas, seria razoável supor que maior encarceramento, ou permanência no sistema por mais tempo, beneficiaria a sociedade?

Considero aconselhável pensar, antes de outras medidas, em um sistema carcerário com condições mínimas para cumprir a sua finalidade. Não poderiam juntar pequenos infratores com criminosos de alta periculosidade, tampouco permitir a ociosidade no presídio. O simples cumprimento da velha e boa Lei de Execução Penal traria muitos benefícios, a começar pela disponibilidade de trabalho e o estudo; ocupação útil: educação, trabalho produtivo, estudo, arte, esporte, informação, reeducação efetiva. Castigar, oprimir, matar, são ações violentas e odiosas que gerarão, certamente, violência e ódio.
Em outras palavras, os políticos podem fazer malabarismos, dar nomes soberbos às ferramentas já conhecidas, implantar medidas mais severas, mas se as autoridades competentes não praticarem os regramentos, não terão serventia alguma.

Como já sinalizado, a pena se destina a punir o criminoso, mas também a prepará-lo para voltar ao convívio social, de modo que os presídios deveriam funcionar como escolas, devolvendo os apenados à sociedade em melhores condições.

A reencarnação nos é concedida pela lei natural como oportunidade de viver e aprender. É o recurso disponibilizado pela vida para irmos nos ajustando com nossa consciência, crescendo, evoluindo, aprendendo, libertando-nos do fardo da ignorância e da culpa; em síntese, permite que sejamos livres e felizes. Cabe ao Estado, às leis e ao Sistema Prisional oferecer também à pessoa que cometeu crimes, as ferramentas e oportunidades para, aos poucos, sentir-se útil, menos culpada, produtiva, capaz, livre e feliz. A sociedade está totalmente envolvida com isso na condição de agente e paciente dessas ações.
Espíritas não podem olvidar que a vingança não reeduca e não reorganiza a sociedade, interessando para a harmonia comunitária, isto sim, a educação dos seus membros. Lembremos que a maioria dos criminosos provem da marginalidade; não recebeu formação adequada, tendo sido moldada na experiência do crime.

Espera-se que o Congresso Nacional e a sociedade discutam as propostas que Moro não apresentou, deixando um pouco de lado as postas no tal projeto.

Lamentavelmente, nesse projeto de cunho eminentemente retributivo, a ideia de segurança pública está limitada ao propósito do encarceramento, ou da repressão pura e simples. Seguindo o clamor popular e as políticas emergenciais ineficazes e ineficientes, reproduzidas ao longo do tempo neste país, a proposta de Moro circunscreve-se à discussão periférica, renunciando à oportunidade de enfrentar a raiz dos problemas.

Toda a política está respaldada na crença de que o encarceramento resolve; então, que se prenda mais e se construa mais cadeias. Olvidou completamente eventuais medidas educativas, preventivas, ou o investimento (de qualquer recurso e não apenas financeiro), em políticas sabidamente capazes de reduzir a criminalidade. Nem a recente proposta de Raul Jungmann, de criar o sistema único de segurança pública – SUSP, serviu-lhe de inspiração.

No documento de 34 páginas, propondo 19 alterações em trechos de 14 leis diferentes, editadas entre 1940 e 2018, esperava-se de um ex-juiz federal com formação internacional, propostas para uma justiça de transição; iniciativas estruturantes de medidas jurídico políticas duradouras, permitindo a adaptação das instituições para garantir que os resultados futuros sejam democráticos e não autoritários. A proposta apresentada não esclarece que rumo o Direito Penal tomará; para onde quer levar o povo brasileiro.
Por estudar Kardec, defendemos a imposição da pena legal, sim, mas apenas a pena razoável prevista em lei. Para o seu cumprimento, deve-se observar a Lei de Execução Penal, oportunizando trabalho, estudo e acompanhamento de equipe técnica para franquear a ressocialização; oportunidade para as pessoas repensarem suas vidas e suas atitudes; encontrarem outros caminhos e não desejarem mais retornar ao presídio.

Para finalizar, não vislumbrei probabilidade de melhoria a partir da reforma proposta. Não encontrei medidas educativas para os presos, tampouco mecanismos de inteligência ou aparatos para a melhoria real do sistema de investigação. Respeitadas as opiniões contrárias, classifico-a como uma proposta populista, midiática e ineficaz, tal como a lei dos crimes hediondos de 1990.
Deixo com os leitores mais uma questão de OLE para meditarem:


Q. 761. A lei de conservação dá ao homem o direito de preservar sua vida. Não usará ele desse direito, quando elimina da sociedade um membro perigoso?
“Há outros meios de ele se preservar do perigo, que não matando. Demais, é preciso abrir e não fechar ao criminoso a porta do arrependimento(grifei).



* Juíza de Direito aposentada, Advogada, Presidente da CEPA – Associação Espírita Internacional
[1] Introdução ao Livro dos Espíritos, item VI.

Este artigo foi publicado no Jornal Abertura de abril de 2019 - se quiser ler a edição completa vá ao link abaixo: