Espiritismo em sociedade
A crise que enfrentamos no
Brasil – ética, econômica e política – tem minado a esperança do brasileiro em
dias melhores. Ao conversarmos com as pessoas, notamos que, de maneira geral,
já não se acredita mais no futuro. A frase “o Brasil não tem mais jeito” é
muito comum, e tem sido mais e mais dita por gente de todas as idades e classes
sociais.
O efeito mais evidente deste sentimento
é a observação de que, a cada dia que passa, temos mais jovens mostrando um
grande desejo de deixar o país. Quando perguntados o porquê disso, esse grupo
aponta a falta de perspectiva de trabalho, a descrença absoluta na classe
política e em sua capacidade (e vontade) de mudar a situação e, principalmente,
a certeza de que o brasileiro é assim mesmo e a situação não vai mudar jamais.
Como nós, como povo, deixamos
a coisa chegar neste ponto? Há inúmeras explicações históricas que demonstram o
impacto que a colonização portuguesa, a cultura autoritária e, mais
recentemente, a ditadura militar tiveram para este resultado – todas, a meu
ver, absolutamente corretas, mas de pouca ação prática. O problema é que, com a
situação posta do jeito que está, o que teremos em breve é um país no qual o
aprofundamento das desigualdades sociais tornará o Brasil mais parecido com o
Haiti que com a Noruega.
Precisamos pensar em soluções
diretas e urgentes. Mas o que vemos, institucionalmente, é uma paralisação
global: a classe política não tem interesse em modificar este estado de coisas,
a justiça se perde em tecnicalidades, a escola foca o currículo sem se
preocupar com sua aplicação e as instituições religiosas, possivelmente as mais
conservadoras, prometem, no máximo, a abundância material e a salvação eterna,
desde que o fiel seja submisso aos seus desígnios.
E nós, espíritas, o que
estamos fazendo? Como doutrina humanista e
livre-pensadora, temos a obrigação de contribuir para que as pessoas
tenham mais acesso a discussões que levem a uma ação efetiva na construção de
um futuro melhor. Se ficarmos na dependência do poder público, nada acontecerá,
ao menos no médio prazo. Penso que é necessário que nossa visão de mundo,
profundamente libertadora, seja cada vez mais difundida, porém com um viés
prático. Precisamos deixar de lado as discussões inócuas e superficiais, bem
como as acusações “alimentares” (coxinhas x mortadelas) e mostrar causas e
consequências do que aí existe, debatendo o modelo de sociedade e de país que
queremos e como podemos chegar a ele.
Não, não podemos mais esperar
que seja feita uma reforma política, uma reforma do ensino ou o que quer que
seja. Precisamos agir diretamente, com os recursos – ainda que parcos – que
temos. Não faz sentido, numa situação cada vez mais crítica, dissociarmos a
teoria espirita da discussão social, prática; especular sobre o mundo dos
espíritos e deixar para depois nossa realidade física. É vital travarmos este
debate nas casas espíritas, de forma respeitosa quanto às diferenças e tendo em
mente que o objetivo é o mesmo: uma sociedade mais igualitária, mais justa e
mais nobre.
NR: Originalmente publicado no Jornal Abertura em outubro de 2016
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