Perguntas
Sem Respostas
Após a
palestra em que o tema era a família no século XXI, fui entrevistado para um
progrma de rádio. O entrevistador, depois de outras perguntas, desferiu a
seguinte: “ Você tem levantado muitos problemas e tem uma visão diferente da
vida. Você julga que isso é uma missão?” A pergunta surpreendeu-me. E a
resposta foi intempestiva: “ Nada de missão, apenas estou numa luta, num modo
de pensar e num momento de atuação”.
Depois,
meditando verifiquei que certos grupos gostam de ver as coisas sob um prisma
meio fantástico, sobrenatural. Uma delas é essa sobre os missionários. E aí
temos três posições interessantes: os que se transformam em missionários por
injunções do grupo, da coletividade; os que se deixam tornar missionários e,
finalmente, os que querem ser missionários.
Parece-me
que o verdadeiro missionário não se aprecebe que o é. Se julga tal, já não é.
Mas o tema é fascinante. Ser “missionário” tem algumas vantagens. Adquire o
caráter trancedental de quem sabe das coisas e precisa ser ouvido com devoção.
O modelo
mais comum de “missionário” é o que assume a posição de guru.
Então, ele
é o consultor, o confessor, o psicólogo, o cientista, o filósofo, o sacerdote.
E quantos gostam desta posição!
Há também
um aspecto não desprezível. É que o missionário pode esconder-se atrás dessa
posição para fugir à sua condição humana.
Porque tal missão parece dar o direito ou o dever de viver com os deuses
e então, quando se pode camuflar os próprios desejos!
Quanto à
minha frente pergunta: “ Você se considera realizado?”. Eu a encaro surpreso. E
digo: “ O que é ser realizado? E lembro que alguém disse, talvez Tagore, não
sei bem, que o homem para se realizar precisava plantar uma árvore, escrever um
livro e ter um filho.
Bem, já
escrevi alguns livros, tive muitos filhos e plantei algumas árvores. Seria isso
realização? Aprecio a vida no seu dinamismo.
Gostei
muito quando um pessoa ouvindo a música de Ivan Lins que, entre outras coisas,
diz: “ Quero tua risada mais gostosa .../ esse seu jeito de achar que a vida
pode ser maravilhosa .../ não ter vergonha de aprender como se goza/ quero tua
louca liberdade .../ e o desejo de passar de seus limites/ e ir além “, disse “
você é isso aí ... Porque tem todo um sentido de romper, de ruptura, de não
considerar limites para a busca, para o encontro com realidades nem sempre
sonhadas.”
Às vezes
penso que as tentativas de encontrar respostas para a razão de viver, perdem-se
no emaranhado de palavras. Alguns dizem que é preciso ter um objetivo para a
vida. Outros supõem equacionar todos os problemas com enunciados como: de onde
venho, por que estou aqui e para onde vou”.
Creio que
ter um objetivo é fechar, limitar, circunscrever o trajeto vivencial. Suponho
que mais correto é ter um sentido, uma orientação vivencial que não se esgota.
Nem se alcança ou termina.
É preciso
compreender que viver é ser angustiado. Não atormentado. A liberação da
angústia só é possível pelo intercâmbio
emocional, pela troca de sentimentos. E sentimento engloba também inteligência,
saber e investigação. Todos os mecanismos do Espírito estão inevitavelmente
impregnados de emoções, até mesmo quando se diz do raciocínio frio.
Por isso,
não há porque me dizer realizado, acabado, terminado, completo, satisfeito,
feliz. Como poderia sê-lo? Estou na inquietude do saber, na incerteza da
emoção, nos altos e baixos dos desejos, na refrega da luta, na alternância do
amor e do ódio, da tolerância e da intolerância, do acerto e do erro.
Diante
dessa realidade, eu disse à pessoa que me olhava, em silêncio: “ Prefiro que ao
término desta jornada, eu diga apenas, como Pablo Neruda: confesso que vivi...
NR: Este
artigo está publicado no Livro Caminhos da Liberdade e saiu no Jornal Abertura de Julho de 2016
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