O Preconceito, uma doença da alma.
"
Sonho com o dia em que todos levantarão e compreenderão que fomos feitos para
vivermos como irmãos " ( Nelson Mandela ).
Pesquisa
realizada pelo Instituto Datafolha para o Fórum Nacional de Segurança Pública
mostrou uma deplorável visão que os brasileiros têm sobre o estupro. Um
percentual de 30% dos entrevistados concordaram com a frase: " A mulher
que usa roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada ". Este
percentual sobe para 41% entre pessoas que só possuem o Ensino Fundamental. Da
mesma forma, 37% concordaram que mulheres que se dão ao respeito não são
estupradas. Este percentual sobe para 46% entre os que têm 60 anos ou mais.
É
lamentável, que após de anos de luta dos movimentos feministas, de campanhas
educativas,tantas pessoas ainda invertam a relação de causalidade. As mulheres
deveriam ser vistas como vítimas por essa gente, e não como responsáveis por
atos de violência sexual contra elas mesmas.
No Brasil,
uma mulher é estuprada a cada 11 minutos, segundo dados oficiais, totalizando
quase 50 mil crimes desse tipo por ano. Onde está o papel da educação? Onde
está a reação das autoridades?
Mas eu
aposto que se essa pesquisa fosse feita entre nossos parlamentares, os índices
não seriam muito diferentes dos apontados pelo Instituto Datafolha . Torna-se
urgente romper essa cultura machista e atrasada. Paralelo ao ensinamento dos
meninos para que não se tornem adultos estupradores, o rigor da lei tem que se
fazer sentir sobre esses selvagens. A dificuldade é que leis mais rigorosas
contra esse descalabro, terão que ser votadas por parlamentares em sua maioria
machistas.
Mudemos de
assunto, para um não menos desagradável, a questão do preconceito racial. Novos
casos de negros mortos em abordagens policias nos EUA incendiaram
novamente os ânimos da população negra no estado de Oklahoma. Os números sobre
a ação policial confirmam, segundo relatos da mídia americana, o
tratamento desigual e injusto. Em 2016, até o momento 706 cidadãos foram mortos
pela polícia americana, sendo 40% brancos e 24% negros. Sucede-se que os
brancos são 77% da população e os negros 13 % . Onde os negros habitam,
geralmente bairros muito pobres, são os locais mais visados pela polícia. Pode
não ser ódio racial, mas é certamente preconceito. A questão da inserção
dos negros no mundo branco e rico ainda não foi resolvida nos EUA.
Aprecio
muito o pensamento do filósofo e sociólogo francês, Raymond Aron, quando afirma
que " a sociedade americana não passou pelo equivalente da luta contra o
Antigo Regime na Europa e não conta com nenhum partido operário ou socialista,
uma vez que os dois partidos tradicionais sufocaram as tentativas de um
terceiro partido progressista ou socialista. Os princípios da Constituição
americana, continua Aron, e do sistema econômico nunca foram seriamente
questionados. As controvérsias políticas nos EUA, finaliza Aron, em geral, se
apresentam de forma mais técnica do que ideológica ".
Bom, e o
que o Espiritismo tem a ver com tudo isso? Muita coisa, pois em sua teoria do
comportamento, a doutrina espírita aborda com clareza a questão da civilização,
e o que caracteriza esse termo. No comentário à pergunta 793 do Livro dos
Espíritos, Allan Kardec assinala que " a civilização tem seus graus, como
todas as coisas... À medida que a civilização se aperfeiçoa faz cessar alguns
dos males que engendrou e esses males desaparecerão com o progresso moral
".
Entre os
males citados, sem dúvida está o preconceito criado pelo homem e muitas vezes
ao fazê-lo carregava uma Bíblia debaixo do braço. As religiões foram céleres em
criar preconceitos, notadamente contra as mulheres, baseados em
interpretações equivocadas dos textos ditos sagrados. Se bem que " textos
sagrados " sempre ofereceram um grande perigo para a humanidade. Como
dizia uma professora de filosofia, Conceição Gmeiner, a Grécia Antiga teve seu
apogeu porque na época não existiam nem teólogos nem livros sagrados.
E continua
Kardec, " a civilização, na verdadeira acepção do termo, será quando as
leis não consagrem nenhum privilégio, onde a justiça se exerça com
imparcialidade, onde o fraco encontre apoio contra o forte e onde todos os
homens e mulheres de boa vontade estejam sempre seguros de não lhes faltar o
necessário ". Falta muito. O trabalho de conscientização plena ainda
levará muitas gerações para se concretizar.
Até lá os
negros e as mulheres sofrerão bastante.
Um adendo
providencial , neste ano será julgado no Supremo Tribunal Federal o direito das
mulheres fazerem aborto em caso de microcefalia causado pelo virus Zika. Esperemos
que prevaleça o bem senso e esse direito seja dado às mulheres . Mesmo porque
nenhum homem tomará conta dessas crianças . Será sempre tarefa das mulheres . Deixem-nas terem o direito de optar .
.
Publicado no Jornal Abertura de outubro de 2016.
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